O risco de uma recessão nos Estados Unidos deverá deixar precocemente velha a ata do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que será divulgada nesta terça-feira (6).
Um eventual pouso forçado da maior economia do mundo faz parte do balanço de riscos do Copom, mas as notícias negativas dos últimos dias tenderiam a exigir maior cautela na administração dos juros do que imaginavam os membros do comitê em reunião na semana passada.
O comunicado do Copom, divulgado na última quarta-feira, destaca o risco de “uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada” como um dos fatores potencialmente baixistas para a inflação.
Mas, ao dar um novo impulso na alta do dólar, o perigo de recessão americana teoricamente também representa um risco altista para a inflação, pelo menos em um primeiro momento.
O Copom cita, entre os riscos negativos, “uma conjunção de políticas econômicas externa e interna que tenham impacto inflacionário, por exemplo, por meio de uma taxa de câmbio persistentemente mais depreciada”.
O cenário mais provável é que, num primeiro momento, o Copom diga que uma eventual recessão americana aumenta a incerteza sobre o balanço de riscos para a inflação. Ou seja, ficaram maiores tantos as chances de uma alta mais forte do que a esperado na inflação quanto de uma baixa mais acentuada.
Foi exatamente assim que o comitê agiu no segundo semestre de 2023, quando o aperto monetário pelo Federal Reserve (Fed) também provocou um ambiente muito incerto.
Se a conclusão for mesmo que está em curso uma recessão nos Estados Unidos, a tendência é que os impactos sobre o Brasil ocorram em duas etapas. Na primeira, que já está ocorrendo, aumenta a aversão de risco, e os investidores tiram dinheiro de países emergentes para colocar nos mercados americanos.
Um segundo passo seria quando uma eventual recessão americana, de fato, ocorresse. O Fed provavelmente cortaria os juros de forma mais acelerada do que o esperado. O Brasil seria beneficiado pelo aumento de liquidez e porque o patamar de juros por aqui ficaria mais atrativo em relação aos níveis americanos.
Os juros mais baixos ajudariam o Tesouro americano a financiar o seu déficit público. As grandes necessidades de recursos por parte dos americanos têm sido citadas pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, como um dos fatores que podem afetar negativamente as economias emergentes.
A recessão também aumentaria o grau de ociosidade na economia global, favorecendo a desaceleração da inflação mundial. Isso ajudaria a baixar a inflação no Brasil. Mas, se os preços das commodities caírem muito, poderá ser negativo para as exportações brasileiras.
Todos esses impactos estão sujeitos a uma grande dose de incerteza, e é difícil dizer agora se significariam necessariamente uma queda na taxa básica de juros. Alguns economistas com passagem pelo BC ouvidos pelo Valor dizem que, por ora, o mais provável é que enfraqueça a tese de alta adicional de juro.
A desancoragem das expectativas no Brasil e as incertezas fiscais limitam as opções de política monetária no país.
Nada disso estava no radar do Copom na quarta-feira passada, quando foi feita a sua ultima reunião. Naquele dia, o presidente do Fed, Jerome Powell, chegou a dizer que não via nenhuma evidência de uma eventual recessão nos Estados Unidos.
As notícias ruins passaram a aparecer a partir da quinta-feira e, em especial, na sexta, com a divulgação de dados que mostravam um mercado de trabalho mais fraco do que o esperado.
A ata do Copom deve levar em conta o cenário visto na reunião de quarta-feira. No comunicado, o Copom listou três fatores altistas para a inflação, e apenas dois baixistas, o que fez alguns analistas econômicos acreditarem que o comitê se inclina para adotar no futuro um balanço de riscos para a inflação que pende mais para o lado negativo, apesar de o comitê não ter dito explicitamente que os riscos são assimétricos.
Como a ata do Copom envelheceu muito cedo, o mercado provavelmente ficará de olho em eventuais pronunciamentos de membros do colegiado que atualizam como vê a situação.
Desde as discordâncias ocorridas no colegiado entre maio e junho, os membros do Copom decidiram combinar antes de passar opiniões ao público externo que não fazem parte da comunicação oficial, depois de consultas mútuas.
Fonte: Valor Econômico

