Por Alex Ribeiro, Valor — São Paulo
03/02/2023 09h04 Atualizado há 3 dias
As projeções de inflação do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que balizam a sinalização de manutenção de juros por um período mais prolongado de tempo, estão intrigando os analistas econômicos do mercado.
Em reunião nesta semana, o Copom puxou de 3% para 3,4% a sua projeção de inflação para 2024. Como o índice de preços esperado passou a superar a meta definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), a dose de juros para baixá-lo deverá ser mais forte do que o atualmente esperado pelo mercado financeiro.
A nova projeção de inflação, em si, não parece fora de lugar. O próprio mercado financeiro espera que a inflação de 2024 fique ainda mais alta, em 3,9%, segundo o boletim Focus, uma pesquisa de expectativas dos analistas do setor privado feita pelo Banco Central.
O que está intrigando os analistas é o que levou o Banco Central a majorar a sua expectativa. Especialistas ouvidos pelo Valor dizem que, provavelmente, a estimativa do Copom para a alta de preços administrados teve um peso importante.
Entre as suas reuniões de dezembro e de fevereiro, o comitê aumentou a sua estimativa para a inflação de preços administrados em 2024 de 4,2% para 5%. É bem acima do consenso do mercado, no boletim Focus, de 4,2%.
Os preços administrados, grosso modo, respondem por cerca de um quarto do índice de inflação. Assim, da inflação de 3,4% estimada pelo Banco Central para 2024, algo como 1,25 ponto percentual se deve aos preços administrados. Se o BC tivesse mantido sua estimativa anterior para esse grupo, que estava alinhada com o mercado, a inflação projetada pera 2024 seria 0,2 ponto percentual menor.
Ou seja, em vez de projetar uma inflação de 3,4% para 2024, a projeção ficaria em 3,2%. Essa nova estimativa segue acima da meta definida para o ano, de 3%. Mas, ultimamente, o Banco Central vem afirmando que o cenário econômico é tão incerto que, com uma diferença tão pequena, pode-se considerar que a inflação está basicamente na meta.
Quando a projeção de inflação coincide com a meta, em tese o Banco Central não tem motivos para aumentar a dose de juros, a não ser que o balanço de riscos para a inflação aponte que são maiores as chances de o índice de preços superar o esperado. O BC, porém, manteve o balanço de riscos simétrico, apesar de toda a piora na incerteza fiscal.
Isso quer dizer que, se o Copom não tivesse puxado a sua projeção de preços administrados, não haveria base para sustentar a mensagem mais conservadora? Não dá para afirmar com certeza.
O BC está mirando a inflação acumulada em 12 meses até setembro, que considera o horizonte relevante da política monetária. Para esse período, a inflação está estimada em 3,6%, no caso de os juros evoluírem da forma então prevista pelo mercado, com corte na Selic em setembro.
Não é possível, porém, saber ao certo qual foi o peso da majoração das projeções de preços administrados nessa projeção de 3,6%. O BC só divulga estimativas para preços administrados para os anos-calendário.
O Valor conversou com analistas econômicos para procurar entender por que a projeção para preços administrados subiu tanto. De forma geral, eles estão confusos, porque pouco se sabe sobre como o Banco Central calcula a inflação desse grupo de preços.
Desde fins de 2020, o BC deu transparência completa ao seu modelo de projeção para preços livres, abrindo inclusive os parâmetros usados em suas equações. Mas os modelos de projeção de preços administrados, em grande medida, ainda são considerados uma caixa-preta.
O que se sabe foi divulgado em 2017, num Relatório de Inflação. O Banco Central faz uma projeção, no curto prazo, de “especialista”, ou seja, olhando o cenário mais provável para a evolução de preços como energia elétrica, planos de saúde e água e esgoto. Para prazos mais longos, são usados modelos de projeção para cada um dos itens. Os parâmetros exatos dessas equações, porém, são pouco conhecidos.
Um analista econômico do mercado diz que, ao manter uma certa opacidade das projeções de preços administrados, o Banco Central pode exercer com um pouco mais de liberdade seu julgamento sobre a inflação.
Assim, o BC fica com mais espaço para emitir a sua opinião, menos matemática e mais subjetiva, sobre como vai encaminhar a inflação e, com isso, sinalizar a trajetória esperada para a taxa Selic.
Fonte: Valor Econômico

