Por Alex Ribeiro, Valor — São Paulo
22/09/2022 08h48 Atualizado há 21 horas
Os votos dissidentes no Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, como os que aconteceram nesta quarta-feira (21), devem se tornar mais frequentes daqui por diante com a independência do colegiado, deixando de ser um evento tão raro.
Desde 2016, na gestão Alexandre Tombini, o Banco Central não registrava dissidência nos votos. Ontem, os diretores Fernanda Guardado (Internacional) e Renato Gomes (Organização do Sistema Financeiro) queriam subir os juros em 0,25 ponto percentual, enquanto que a maioria venceu com manutenção em 13,75% ao ano.
Mas isso não significa que, anteriormente, não houvesse divergências entre seus membros. Elas ocorreram sobretudo nos períodos mais críticos, como começo e fim do ciclo de aperto monetário. Mas não tinham sido manifestadas em votos.
Um ponto importante: o Banco Central vem lembrando que a divergência de visões e de votos não significa uma sinalização de política monetária do comitê como um todo. Refletem, simplesmente, que os membros do Copom têm opiniões diferentes. É importante conhecer essas visões para saber se uma tese ou outra ganha força no colegiado.
Em janeiro de 2021, por exemplo, pelo menos três membros do Copom defenderam, nas discussões feitas naquela reunião, que o colegiado iniciasse, imediatamente, um ciclo de alta de juro, que então estava em 2% ao ano. A maioria venceu, mas já na reunião seguinte os juros subiram, inclusive com mais força do que o mercado financeiro esperava.
Houve divergência também em meados de 2020, quando o Copom discutia até onde poderia levar a queda dos juros básicos da economia, em resposta à pandemia do coronavírus. A maioria do colegiado defendeu que o espaço para corte de juros era mais limitado, porque uma economia emergente não poderia conviver com juros tão baixos quanto as economias avançadas sem aumentar os riscos para a estabilidade financeira. Pelo menos três membros do Copom achavam que os juros poderiam cair mais.
É possível que tenha havido outros momentos críticos de divergência nas reuniões que não foram explicitados na comunicação oficial do Copom. Houve fortes rumores no mercado, por exemplo, que os membros do Copom divergiram em fins de 2021, quando o colegiado mantinha um ritmo de 1,5 ponto percentual de aperto monetário.
Há várias explicações possíveis para a falta de divergências nos votos do colegiado. Pode ser apenas porque a composição do colegiado tem sido mais homogênea. Também pode ser pelo estilo dos dois últimos presidentes, Ilan Goldfajn e o atual, Roberto Campos Neto, na busca por consenso na decisão, apesar das divergências nos debates.
Mas também pode ser um defeito da governança do nosso Banco Central, em que o presidente tinha mais poderes que os demais membros. Até a independência do BC, quem indicava os demais membros da diretoria colegiada ao presidente da República era o presidente da autoridade monetária. Com isso, havia uma certa hierarquia, com um presidente do BC que, a qualquer momento, poderia demitir os diretores do Banco Central.
A independência do BC muda esse quadro, porque os membros do colegiado têm mandato independente, tanto do presidente da República quanto do presidente da autoridade monetária.
Hoje, a diretoria do Banco Central tem maior coesão porque todos os membros foram escolhidos pelo atual presidente, Campos Neto. Mas em fevereiro do ano que vem vão acabar os mandatos de dois membros do Copom, incluindo o de política monetária, Bruno Serra. Em dezembro de 2023, vencem mais dois mandatos.
Os novos membros vão ser indicados pelo presidente da República a ser eleito neste ano, e em tese podem ter visão menos homogênea, quando comparado à atual equipe. Com isso, crescem as chances não só de votos dissidentes, mas também de pronunciamentos públicos de seus membros com visões diferentes.
Esse é um argumento adicional para não se ver votos dissidentes como uma sinalização de política monetária. Serão, na verdade, uma indicação da inclinação dos membros do colegiado para um lado ou para o outro na execução da política monetária, como ocorre em outros bancos centrais, como o Federal Reserve (Fed).
Fonte: Valor Econômico