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Manuel Orozco, da S&P: Parece difícil sinalizar uma melhora de rating sem ver uma estabilidade na dívida pública — Foto: Gabriel Reis/Valor
Ainda que a iniciativa da Moody’s de elevar a nota de crédito do Brasil no início da semana tenha gerado expectativa, a sinalização emitida pela agência de classificação de risco S&P Global Ratings, em entrevista ao Valor, esfria, ao menos por ora, a possibilidade de que o Brasil possa reconquistar o grau de investimento no curto prazo.
Na semana passada, a Fitch Ratings já havia comunicado que uma melhora na nota de crédito brasileira não estava nos planos da agência, diante da dificuldade de identificar uma melhora na trajetória da dívida pública. Como a recuperação do selo de “bom pagador” dependeria da classificação de pelo menos duas das três agências de risco, a perspectiva do Brasil se aproximar ainda mais do grau de investimento segue distante neste momento.
“O crescimento mais forte para o Brasil também deveria significar uma maior capacidade para estabilizar a dívida. Isso não está acontecendo agora. Portanto, parece difícil a possibilidade de começar a sinalizar a melhora do rating com uma perspectiva positiva para a nota do país. Não estamos vendo isso agora”, diz o diretor e analista líder para Brasil da S&P, Manuel Orozco.
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Enquanto a Moody’s elevou a nota brasileira para “Ba1”, com perspectiva positiva – apenas um nível abaixo do grau de investimento -, a S&P e a Fitch mantêm a nota brasileira dois degraus abaixo, em “BB”, com perspectiva estável na avaliação de ambas.
Orozco concorda que a atividade econômica brasileira tem surpreendido as estimativas de consenso há alguns anos. No entanto, o analista aponta que, em grande medida, a recuperação do crescimento econômico local tem sido impulsionado por uma política fiscal que é expansionista.
“Neste ano, identificamos que as surpresas de crescimento estão sendo puxadas pelo consumo, que vem bastante forte e que contribuiu para elevar a expectativa de crescimento do Brasil para 2,8% em 2024, frente à nossa projeção anterior, de 2%. É um ganho importante. Agora, muito deste consumo está sendo impulsionado por uma política fiscal expansiva e um crescimento do gasto real, que está apoiando o crescimento. Também há o aumento do salário mínimo e ajuste em benefícios sociais. É toda uma política fiscal que está contribuindo para esse crescimento”, afirma.
A grande dúvida, segundo Orozco, é se o Brasil tem espaço para sustentar uma política de gastos que cresce ao longo do tempo. “Há um espaço limitado para manter essa política pró-cíclica. Já sinalizamos anteriormente que há efeito das reformas no PIB, mas que essa política de gastos dificulta os cortes de juros no futuro. O Brasil agora tem juros reais de curto e longo prazo bastante elevados, que devem dificultar um crescimento elevado no longo prazo”, aponta.
A agência também vê necessidade de aprimoramento nas regras fiscais vigentes no país. “A gente vê uma dinâmica de despesa que é muito acelerada e um limite na capacidade do governo de implementar medidas para conseguir novas receitas. O que estamos esperando ver é como o governo fará com que o arcabouço fiscal funcione”, afirma o profissional.
A S&P, de acordo com Orozco, também não enxerga, em seu cenário base, quando a dívida brasileira entrará em trajetória de queda. “ O crescimento está desacelerando, mas ainda não vemos estabilidade da dívida”, afirma o analista. Nas projeções da casa, a dívida bruta deve sair de 74% do PIB em 2023 para 76% do PIB neste ano e chegar a 83% do PIB em 2027.
Na semana passada, a Fitch já havia alertado que o bom desempenho econômico do Brasil não dá alívio à incerteza fiscal, ao dizer, ainda, que o crescimento foi acompanhado por um desempenho fiscal “mais fraco que o esperado”.
Em evento ontem em que justificou a ação recente no rating do Brasil, Samar Maziad, vice-presidente e analista sênior de riscos soberanos na Moody’s, ressaltou o bom desempenho do crescimento econômico e o andamento de reformas estruturais nos últimos anos, mas reconheceu que os riscos fiscais se mantêm e permanecem como um desafio para o país.
“O fiscal é muito importante e sublinhamos, no comunicado que divulgamos após a decisão, que ele permanece como um desafio. No entanto, há outros fatores que são levados em conta para traçar o perfil do crédito do país. Além do crescimento e das reformas promovidas nos últimos anos, a dívida brasileira é muito mais sólida em termos de vulnerabilidades externas. Há riscos fiscais, mas o cenário é consistente com um ‘upgrade’ [elevação] e uma melhora do perfil de crédito”, afirmou Maziad.
Segundo ela, a decisão também foi tomada observando um contexto mais amplo e em comparação com pares. “A dívida do Brasil é 95% detida localmente e não antecipamos riscos ao seu financiamento”, apontou. Para Maziad, é esperada uma consolidação fiscal gradual no Brasil. A Moody’s, segundo ela, passou a ver uma chance maior de cumprimento da meta fiscal neste ano, à medida que a projeção de déficit primário para 2024 melhorou de 0,7% para 0,4% do PIB.
A analista da Moody’s chamou atenção ainda para a necessidade de conferir maior credibilidade ao arcabouço fiscal, já que a necessidade frequente de conseguir medidas adicionais de arrecadação aumentam os prêmios de risco e o custo de financiamento da dívida local. “Ainda há riscos relacionados a 2025 por medidas que precisam ser aprovadas. O serviço da dívida deve continuar subindo, porque o déficit nominal deve continuar aumentando, dado os elevados custos de financiamento. A credibilidade fiscal ainda precisa de melhora”, apontou.
Ela vê como o principal risco à dinâmica da dívida brasileira o aumento das despesas obrigatórias. “A credibilidade do arcabouço fiscal precisa ser reforçada para dar uma perspectiva de sustentabilidade da dívida e essa armadilha de credibilidade, de todo ano precisar conseguir medidas adicionais de receita, pesa nos prêmios de risco. Isso aumenta os custos de financiamento”, afirmou Maziad.
E, embora tenha ressaltado que a elevação do rating soberano do Brasil pela Moody’s tenha sido rápida, Maziad enfatizou que isso não significa que uma nova revisão “deve ser tão rápida quanto foi a última”. Em relação ao timing de uma possível nova ação, a analista disse esperar “algo mais como o horizonte normal que levam as revisões das notas de crédito”.
Fonte: Valor Econômico

