.27 Jun 2023 FELIPE FRAZÃO
O presidente argentino, Alberto Fernández, foi recebido no Planalto e saiu com a promessa de financiamento do BNDES a empresas ligadas ao plano de levar um gasoduto até o Brasil. O uso do banco em obras no exterior já gerou calote superior a R$ 1 bilhão.
O presidente argentino, Alberto Fernández, se reuniu ontem pela quinta vez no ano com o brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva – o quarto encontro no Brasil. Em Brasília, ele voltou a pedir ajuda para alavancar a economia local, a quatro meses da eleição presidencial.
A conversa entre os dois ocorreu três dias depois que a coalizão de esquerda definiu que o ministro da Economia, Sergio Massa, será o candidato governista à Casa Rosada. Fernández voltou para casa com a promessa de uma linha de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para ampliar o comércio e finalizar a construção de um gasoduto.
A Argentina vive uma grave crise econômica, com a inflação acima de 100% ao ano e o governo passando o pires em várias capitais do mundo. Massa acabou de voltar de uma viagem à China e Fernández marcou uma visita a Pequim para o fim de setembro, a poucas semanas das eleições.
O presidente argentino também esteve em Brasília, em maio, em busca de financiamento para expansão comercial e obras de infraestrutura. Fernández esteve em março nos EUA e fez um giro por quatro países da Europa, no ano passado, também em busca de investimentos.
Além do descontrole inflacionário, a Argentina é vítima de uma seca que vem afetando o setor agrícola e pecuário, a maior fonte de divisas do país. Somada à constante desvalorização do peso, as reservas internacionais argentinas vêm se consumindo rapidamente.
DISPUTA. A proximidade das eleições – as primárias ocorrem em 13 de agosto e a eleição presidencial, em 22 de outubro – colocou o governo peronista nas cordas e numa corrida contra o tempo para apresentar alguma conquista que possa ser vendida para os eleitores antes da votação.
Com a popularidade na lona, Fernández decidiu não se candidatar. Envolvida em escândalos de corrupção e lavagem de dinheiro, a vice-presidente, Cristina Kirchner, também desistiu da disputa. Na sexta-feira, no limite do prazo de inscrição de candidatos para as primárias, a coalizão governista fechou um acordo para indicar Massa como o nome do peronismo.
Ex-presidente da Câmara dos Deputados, Massa se tornou ministro da Economia, em 2022, na expectativa de domar a inflação e se tornar o candidato de consenso do governo – e eventualmente chegar à Casa Rosada nos braços do povo argentino.
REFORÇO. No entanto, domesticar os preços virou uma dor de cabeça para Massa, que vinha perdendo força gradualmente. No vácuo do fracasso dos políticos tradicionais – impopular, o ex-presidente conservador Mauricio Macri também preferiu ficar de fora da disputa – abriu caminho para forças de fora do establishment político, como o ultraliberal Javier Milei.
Para evitar o colapso do peronismo nas urnas, a missão de Fernández é ressuscitar a economia em pouco tempo. Ontem, com Lula, ele obteve alguns sinais positivos a suas propostas. Desde janeiro, a Casa Rosada tenta convencer o Brasil a financiar suas exportações para o mercado argentino e recuperar espaço perdido para os chineses.
“Estamos trabalhando na criação de uma linha de financiamento das exportações brasileiras para a Argentina. Não faz sentido que o Brasil perca espaço no mercado argentino para outros países que oferecem crédito, e nós não”, disse Lula.
FINANCIAMENTO. A Argentina também está particularmente interessada no financiamento de um novo gasoduto – batizado de Néstor Kirchner – que levará gás natural dos campos de Vaca Muerta, na Província de Neuquén, até os grandes centros urbanos – uma alternativa mais barata ao gás boliviano. O Brasil, de acordo com o governo argentino, também se beneficiaria da obra.
Fernández voltou para Buenos Aires com a promessa de uma linha de crédito do BNDES para turbinar o comércio e finalizar o gasoduto. “Fico muito satisfeito com as perspectivas positivas de financiamento do BNDES à exportação de produtos e para a construção do gasoduto Nestor Kirchner”, disse Lula.
O BNDES já foi usado para financiar obras de infraestrutura em outros países no passado, e acabou levando calotes de Venezuela e Moçambique, um rombo de pouco mais de R$ 1 bilhão. •
Objetivo A missão de Fernández é ressuscitar a economia argentina antes da eleição presidencial de outubro
Fonte: O Estado de S. Paulo

