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O bom desempenho do mercado de trabalho está pressionando a inflação medida pelo IPCA mesmo quando se considera todos os produtos da cesta, não somente aqueles mais intensivos em mão de obra. É o que mostra um estudo produzido pelo Itaú Unibanco, que sinaliza ainda que os salários devem continuar pesando sobre os preços brasileiros nos próximos trimestres.
Via de regra, os analistas olham o comportamento do setor de serviços para ter uma sinalização sobre como o mercado de trabalho e o comportamento dos salários afetam a inflação. Mais especificamente, eles olham dois núcleos criados pelo Banco Central: os serviços intensivos em mão de obra (categoria que inclui atividades como serviços médicos e dentários, estética e empregado doméstico) e os serviços sensíveis à ociosidade.
No entanto, ambas as medidas respondem por apenas 7% e 10% da cesta do IPCA, respectivamente. Nem mesmo dentro da categoria serviços elas são representativas -respondem por apenas 17% e 28% da cesta do setor.
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“O problema dessas métricas é que, como elas são definidas por exclusão, você acaba com olhando para um grupo com peso pequeno dentro do IPCA ”, diz Julia Gottlieb, economista do banco. “O que a gente fez foi tentar entender, de forma mais ampla, todas as pressões vindas do mercado de trabalho.”
Para isso, o Itaú construiu, a partir da tabela de recursos e usos do IBGE, um indicador de intensidade de trabalho para cada um dos 377 itens do IPCA, levando em consideração os gastos das empresas com salários e contribuições sociais, o peso do produto dentro de seu respectivo setor e os custos de produção. Com base nele, foi feita uma reponderação do índice segundo a intensidade em trabalho de cada produto.
Como esperado, o exercício eleva a participação dos serviços dentro da novo indicador – seu peso passa de 35,5% para 53,4%. Entre categorias, os gastos pessoais (de 10,1% para 20,8%) e educação (de 5,9% para 14,9%) se destacam entre os que tiveram maior alta. Na contramão, alimentos e bebidas (de 21% para 11,6%), alojamento (de 15,4% para 10,1%) e gasolina (de 5% para 0,4%) têm quedas mais significativas.
O índice reponderado mostra que aqueles produtos mais intensivos em trabalho estão observando reajustes de preços mais intenso do que aponta o IPCA cheio. Enquanto este acumula alta de 3,7% nos 12 meses encerrados em abril, aquele sobe 5% no mesmo período.
Gottlieb ressalta que o índice alternativo tem rodado acima do IPCA desde a segunda metade de 2022 – coincidentemente, o momento em que a taxa de desemprego passou a rodar abaixo de 9%. Este é o patamar considerado pelo Itaú como a taxa de desemprego de equilíbrio, ou aquele a partir do qual o mercado de trabalho começa a exercer pressão altista sobre a inflação.
A taxa de desemprego medida pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio contínua (Pnad contínua) caiu a 7,5% no trimestre móvel encerrado em abril, de 7,9% no trimestre encerrado em março. O resultado veio abaixo da mediana das expectativas dos analistas consultados pelo Valor Data, que esperavam recuo menor, a 7,7%. A renda média real, por sua vez, cresceu 0,8% no trimestre móvel até abril e 4,7% em relação ao mesmo período de 2023.
A influência do mercado de trabalho sobre a dinâmica da inflação é um tema recorrente em discursos de representantes do Banco Central.
A ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) mostra que os dirigentes discutiram o assunto, mas não chegaram a um consenso sobre em que medida o avanço dos salários – que parece não vir apenas da produtividade, mas também da melhora do poder de barganha dos trabalhadores, beneficiados pelo mercado mais aquecido – está afetando os preços.
“A gente tentou dissecar cada componente de trabalho em cada categoria de serviço, para ver se existe correlação [entre salários e inflação]. E de fato parece que na ponta tem, sim, alguma pressão. Mas é muito incipiente, nada que a gente consiga demonstrar muito claramente”, comentou o presidente Roberto Campos Neto em sua apresentação no último dia 27, em evento organizado pelo Grupo Lide.
Olhando adiante, o Itaú espera que o mercado de trabalho continue pressionando os preços. Rodando um modelo com base no índice reponderado e as projeções de inércia da inflação e taxa de desemprego é possível ver que o indicador se mantém acima do IPCA de serviços nos próximos trimestres – ele chega ao fim do ano apontando alta de 6,03% em 12 meses.
“Como a gente não espera que a taxa de desemprego suba muito – ela deve permanecer rodando abaixo dos 9% neste ano -, o indicador também seguirá pressionado”, afirma Gottlieb. “Vale notar também que ele não tem piorado. Na margem, mostra até alguma moderação pequena, algo em que o próprio comportamento da inércia tem ajudado. Mas a nossa avaliação é que esse exercício é mais um indício na direção de o Banco Central se manter cauteloso com relação à política monetária.”
Fonte: Valor Econômico

