Por Rafael Vazquez e Matheus Schuch — De São Paulo e Brasília
30/03/2023 05h02 Atualizado há 4 horas
O mercado de trabalho brasileiro registrou abertura líquida de 241.785 vagas com carteira assinada em fevereiro, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) divulgados ontem pelo Ministério do Trabalho. O resultado superou a expectativa da grande maioria dos economistas – a mediana do Valor Data apontava geração de 162,8 mil postos.
Analistas ouvidos pelo Valor destacaram a surpresa positiva, embora a perspectiva de desaceleração no mercado de trabalho continue presente.
O setor que mais gerou vagas formais líquidas em fevereiro foi, novamente, serviços. Foram 164,2 mil, com destaque para a contratação de 58 mil professores substitutos, um movimento comum para o mês. Em seguida, a indústria de transformação criou 37,2 mil novos postos de trabalho com carteira assinada, enquanto construção teve um saldo positivo de 22,2 mil.
“Serviços ainda vão bem ao longo do primeiro semestre, mas existe um impulso da reabertura que ao longo do tempo está esfriando. A atividade vai esfriar e só depois o mercado de trabalho vai sentir”, disse o economista-chefe do banco Original, Marco Caruso. “O setor continuará como carro-chefe do mercado de trabalho.”
Para Caruso, no entanto, a grande surpresa do Caged de fevereiro está na indústria. “Não consigo nem justificar, pois não bate nem mesmo com as últimas notícias que mostram fábricas de automóveis decretando férias coletivas. Suspeito que esse número positivo vindo da indústria terá vida curta.”
Ao dessazonalizar o número total, Caruso chega a 110 mil vagas formais criadas pelo saldo entre demissões e contratações, o que, na sua visão, representa uma reaceleração comparado ao trimestre móvel encerrado em janeiro.
“Estamos revendo nossa previsão de geração de vagas agora. Temos a estimativa de 0,7% de crescimento do PIB para o ano e, nas nossas contas, isso seria coerente com criação de 600 mil vagas formais em 2023. Hoje, esse número precisa ser revisto e o viés é de alta.”
Por outro lado, em relação ao comércio, com saldo negativo de 1.325 vagas formais em fevereiro, Caruso vê dificuldades adiante. “Além do fechamento de vagas temporárias abertas no fim do ano, o que é normal, o desempenho do comércio está muito ligado a problemas que estamos vendo nessa discussão do varejo com Americanas e outras empresas sofrendo. O caminho para o comércio a partir daqui vai ser turbulento em termos de criação de vagas.”
Ele também observa que houve perda de ímpeto da construção civil. O setor é fortemente impactado pela alta taxa de juros, atualmente em 13,75% no país.
O patamar da Selic foi novamente criticado pelo ministro do Trabalho, Luiz Marinho, na coletiva de imprensa em que comentou o resultado. “O grande problema é a insanidade monetária do BC. Espero que ele esqueça as razões da manutenção da Selic e analise realmente a economia brasileira”, declarou. “Temos leitura de que o mercado de trabalho crescerá neste ano, será mais ou menos dependendo da Selic. Se o BC colaborar, a economia vai voar. Se não colaborar, vai continuar andando.”
Para o economista da Rio Bravo Investimentos Luca Mercadante, é justamente a política monetária, atualmente em patamares restritivos diante da inflação ainda longe da meta, que vai contribuir para a manutenção do cenário de desaceleração do mercado de trabalho, apesar do número surpreendentemente positivo de fevereiro. “Será uma desaceleração lenta diante dos efeitos da política monetária, mas não será nada brusco.”
Ao dessazonalizar o resultado, o economista chegou ao número de 66 mil vagas criadas em fevereiro, contra 73 mil em janeiro. “Portanto, mesmo com a surpresa no número do Caged, de certa forma a desaceleração se mantém presente”, acrescenta, explicando que no início do ano os efeitos sazonais são mais relevantes que em outros meses. Os números dessazonalizados variam entre os economistas porque cada um faz o seu próprio cálculo e não há um dado oficial.
Fonte: Valor Econômico

