Profissional deve olhar para tendências e descobrir oportunidades, sem perder de vista a perenidade do negócio
— Para o Valor, de São Paulo
Uma nova cadeira foi adicionada às reuniões da alta gestão. É a do diretor de visão de negócios ou chief visionary officer (CVO, na sigla em inglês), profissional contratado para “encaminhar” a organização em direção ao futuro. A ideia é que o executivo planeje as rotas necessárias para que a companhia se perpetue no mercado, explica o headhunter David Braga, CEO da Prime Talent Executive Search, consultoria de seleção de gestores, presente em 30 países. “Diante das constantes mudanças no cenário econômico global, da necessidade de inovação, novas regulamentações setoriais e forte concorrência, as companhias procuram candidatos com experiência para assumir o papel de CVO”, diz o executivo, que deve concluir uma contratação para a indústria automotiva nas próximas semanas.
Em média, o salário mensal na posição vai de R$ 25 mil a R$ 80 mil, dependendo do porte do empregador, segundo recrutadores. Em menos de oito meses, pelo menos quatro companhias, de diferentes setores, selecionaram ou promoveram quadros para a função, no Brasil. “O cargo é mais comum em empresas de tecnologia e startups, em que visões estratégicas e inovadoras são valorizadas”, pontua Ana Carla Guimarães, diretora de recrutamento na consultoria de recursos humanos Robert Half.
O perfil exige competências como saber liderar planos de inovação, identificar oportunidades de negócios e desenvolver parcerias duradouras. “O CVO não pode se apegar a ideias fixas, pois o que funciona hoje provavelmente será copiado pelos concorrentes ou ficará obsoleto amanhã”, ressalta Braga, da Prime Talent. “Cabe a ele pensar em novos contratos, introduzir recursos nos produtos à venda e encontrar maneiras de surpreender os clientes.”
Todas essas tarefas estão no planejamento da executiva Karen Miura, convidada no final de 2023 para estrear o cargo de CVO na Bravo, empresa com 150 funcionários especializada em soluções de transformação digital nas áreas fiscal e contábil. “Durante toda a minha jornada profissional, estive em projetos de inovação”, lembra. “O esforço era sempre para trazer algo novo que levasse os times e as companhias a outro patamar.”
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Miura veio do Group Indigo Brasil, de gestão de estacionamentos e mobilidade, onde trabalhou como gerente de tributário e regulatório, gerente executiva sênior e superintendente financeira. A advogada e contabilista também passou pelo Walmart, Alstom e Hewlett Packard Enterprise (HPE).
Na Bravo, um dos objetivos é conduzir a organização pelas mudanças que serão causadas pela reforma tributária. Queremos ser o principal parceiro do mercado para o período de transição relacionado à reforma, diz. Na ponta do lápis, ela planeja, até o fim de 2024, entregar um aumento de 20% na eficiência operacional do grupo por meio da automação de processos e entrada em novos mercados; expandir o portfólio de serviços até 2025, o que inclui assumir as operações fiscais dos clientes – hoje realizadas “dentro” das empresas – e promover um crescimento de 30% no faturamento anual, a partir de 2026. “Quero estruturar a companhia em prol da perenidade”, explica. “Fui convocada para impulsionar uma transformação integral e estamos com um projeto de expansão de produtos em andamento.”
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Para dar conta da missão, a Bravo realizou “mais de dez contratações” nos últimos três meses e estão previstas mais 50, até dezembro. “A intenção é admitir 15 profissionais até o final do semestre, principalmente para as áreas de desenvolvimento, vendas e suporte ao cliente”, diz a executiva, que se reporta ao CEO, Marcos Gimenez. “Uma CVO deve possuir habilidades de liderança e comunicação, capacidade de pensar estrategicamente e tomar decisões baseadas em dados”, ensina Miura, que recentemente colocou de pé dois projetos com o uso de inteligência artificial, recurso que ajudou a reduzir 95% dos custos operacionais estimados para a execução dos trabalhos. “Também precisamos ter uma forte compreensão das tendências tecnológicas”, diz.
Na Bycon, empresa brasileira de soluções de segurança eletrônica com mais de 20 anos de operação, o primeiro crachá de CVO foi feito em janeiro para o executivo Adalberto Bem Haja. Na verdade, o engenheiro eletrônico com MBA em gestão econômica “entrou” na organização em 2023, por meio de um processo de M&A (fusões e aquisições, do inglês) – junto com outros investidores, que adquiriram a marca. “Nos primeiros meses, me dediquei à melhoria da gestão interna e, este ano, atuo como CVO.”
Cargo é mais comum em empresas de tecnologia e startups”
— Ana Guimarães
Haja é mentor e investidor em mais de cem startups, foi fundador e CEO da BHC Sistemas – também da área de proteção eletrônica, com 16 anos de atividade – e participa de conselhos de companhias. “A soma disso tudo me deu as condições para ocupar a posição de CVO”, resume.
O executivo tem como meta quadruplicar o número de integradores e revendedores dos produtos da Bycon nos próximos anos. Para isso, o interesse é fazer parcerias com fornecedores que conectem os nossos produtos a outras soluções da cadeia de segurança, entregando projetos mais eficientes aos clientes, diz o gestor, que lidera uma equipe de sete funcionários. Pelo menos dois novos contratos com fabricantes foram fechados nesse início de gestão.
Para ter sucesso como CVO, lembra o diretor, é bom ter ocupado ao menos um cargo no C-Level. “É necessário saber como funcionam os departamentos, a dinâmica e a cultura das empresas”, justifica.
Foi o que aconteceu recentemente com duas companhias, que tiveram seus CEOs “transformados” em CVOs. Na Bossa Invest, João Kepler decidiu deixar o posto de dirigente em 2023 para assumir a tarefa. “A companhia precisava de um gestor mais focado no tático e operacional”, explica. No ano passado, a empresa de venture capital divulgou novidades na gestão do relacionamento com investidores e startups apoiadas, como um aplicativo que faz o acompanhamento dos aportes realizados.
Na Chiefs.Group, de contratação sob demanda de executivos seniores, a fundadora e ex-CEO Cristiane Mendes responde como CVO há sete meses. “É uma ‘cadeira’ necessária em mercados de grande disrupção”, afirma. “As estratégias de longo alcance se descolam da execução no curto prazo e acaba-se criando um ‘hiato’ na operação. Ter êxito nesse cargo é conseguir entregar no presente as peças necessárias para se chegar à visão [de futuro] da organização.”
Fonte: Valor Econômico