A indicação do Comitê de Política Monetária (Copom) de que irá elevar a Selic pelo menos mais duas vezes no ritmo de 1 ponto percentual foi o destaque do comunicado da decisão de ontem. A leitura dos economistas é que o Banco Central volta a assumir o protagonismo no direcionamento das taxas, não estando mais “atrás da curva” (atrasado em relação à precificação do mercado). Com essa sinalização, os economistas passaram a revisar as estimativas para a taxa básica no fim do ciclo, agora perto de 15%.
A postura bastante conservadora, que surpreendeu os economistas, mostrou que a nova composição do Copom não deve ser condescendente com a inflação mais alta. Essa perspectiva deve se refletir nos ativos brasileiros nas negociações de hoje, com redução nos prêmios de risco.
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Para Tatiana Pinheiro, economista-chefe da Galapagos Capital, o comunicado fez o BC sair de uma postura considerada mais “atrasada” para uma de mais “adiantado”. Na visão de Pinheiro, a volta do “forward guidance” (perspectiva) foi bem assertiva, especialmente depois de o colegiado citar que o cenário agora está menos incerto, e sim mais adverso. “Agora, o BC tem mais certeza de que estamos num cenário adverso. Antes, ele podia ter alguma dúvida. Isso justifica a volta do guidance”, diz.
Na mesma linha, o economista-chefe da MAG Investimentos, Felipe Rodrigo Oliveira, diz que o principal destaque do comunicado foi o guidance de duas altas de 1 ponto percentual. “De antemão, sem olhar a ata da reunião, já subimos nossa estimativa de Selic de fim de ciclo de 13,25% para 14,75%”, afirma, acrescentando que deve esperar para mudar esse cenário após ler a ata e o relatório de inflação na semana que vem, e que não descarta uma Selic ainda mais alta.
“Quero ver as divulgações da próxima semana para ver se vou ficar nos 14,75% mesmo ou se posso subir mais. Mas, creio que o limite deve ser 15% ou 15,25%.” Para Oliveira, o “guidance” do BC tira da mesa a chance de o mercado esperar uma alta de 1,25 ou até 1,5 ponto percentual.
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O sócio-fundador da Oriz Partners e ex-secretário do Tesouro Nacional, Carlos Kawall, projeta algo semelhante e diz que a taxa básica de juros poderá terminar 2025 mais perto de 15%, mas não descarta que o BC possa não manter esse patamar por um período longo. “Ele foi num ‘orçamento’ de mais de 3 pontos percentuais em três reuniões, o que é curto pelo histórico”, diz.
Kawall lembra que o Copom está direcionando agora a Selic ao nível de 14,25%, que foi o máximo da gestão de Alexandre Tombini, presidente do Banco Central entre 2011 e 2016, na gestão de Dilma Rousseff (PT). “Mas não está dito que esse é o nível terminal. A sugestão é apenas que esse movimento vai ser feito numa velocidade rápida”, diz.
Ainda segundo Kawall, a decisão foi “feliz” e o futuro presidente do BC, Gabriel Galípolo, ganha um “voto de confiança”. “Foi um momento de união em torno de uma ação de política monetária em uma transição que está gerando ruído. O comunicado coroa essa transição e tranquiliza sobre os passos futuros.”
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Para o economista-chefe da Reach Capital, Igor Barenboim, a maioria dos economistas estava tentando entender se o ajuste fiscal seria feito via inflação da dívida, e o BC indicou que não. “Gabriel [Galípolo] mostrou que vai liderar um processo importante e quem apostar contra isso vai perder. Sem dúvida, o prêmio embutido relacionado à política monetária começa a se desfazer.”
Na sua avaliação, o BC foi firme e fez o que era preciso ser feito, e os ativos financeiros devem reagir a essa postura. “É capaz de vermos um fechamento gigantesco da curva, principalmente nos prazos intermediários; um real se apreciando bastante”, diz. “Isso terá consequências importantes, porque todo mundo estava confortável em ficar vendido em Brasil [aposta na desvalorização de ativos locais] pois não havia notícia boa do governo, então o índice de acerto era muito bom. Agora, as coisas mudam.”
Ainda segundo Barenboim, há um problema fiscal estrutural no Brasil, que o governo não quer resolver. “Com a decisão rígida, a percepção é que vai ser uma deterioração gradual”, diz, acrescentando que o cenário em que o câmbio iria rapidamente para R$ 7 fica mais distante. “Não vale a pena agora ficar vendido contra o real. Com o juro chegando a 15%, fica caro ficar contra o real”, diz o economista, que subiu sua projeção para Selic em fim de ciclo de 15,50% para 16,50%.
Kawall, da Oriz, é mais cético no que diz respeito à valorização do câmbio, e diz que, apesar da postura dura do colegiado, o dólar deve se manter mais entre o patamar de R$ 6 e R$ 7 do que entre R$ 5 e R$ 6 no ano que vem. “O BC disse que ele procurou ancorar a parte dele, mas que a âncora dele não é a única”, afirma.
Fonte: Valor Econômico

