O vice-presidente executivo da UE, Valdis Dombrovskis, disse ontem que já existem “evidências, à primeira vista, suficientes” para justificar uma investigação sobre as importações de veículos movidos a bateria da China, que Bruxelas teme que possam suplantar o setor automobilístico do bloco.
“Falando estritamente, isso não se limita a veículos elétricos de marcas chinesas, também pode se aplicar a carros de outros fabricantes se eles recebem subsídios do lado da produção”, afirmou Dombrovskis, ao ser indagado se a Tesla ou a Geely, a proprietária da sueca Volvo, poderão se tornar alvos da investigação.
Dombrovskis conversou com o “Financial Times” ao fim de uma viagem de cinco dias a Pequim, e contou que durante a visita as autoridades chinesas o pressionaram sobre a investigação.
Para Pequim, o fato de a UE ter anunciado a investigação sobre subsídios neste mês, dias antes da visita de seu vice-presidente executivo, abriu uma nova frente nas tensões recentes entre as duas superpotências comerciais.
Dombrovskis disse que a UE está “aberta à concorrência” no setor dos veículos elétricos, mas “a concorrência precisa ser justa”. Ele acrescentou que outras grandes economias já tinham adotado tarifas sobre baterias para veículos elétricos provenientes da China.
“É provável que hoje a UE seja o maior mercado aberto aos produtores chineses”, afirmou.
Na viagem à China, Dombrovskis tinha uma agenda ambiciosa de convencer Pequim a desmantelar o que as empresas europeias chamam de centenas de barreiras comerciais que contribuíram para um déficit comercial recorde em 2022, de quase US$ 400 bilhões.
Os dois lados disseram ter conseguido alguns avanços durante a visita do vice-presidente executivo europeu. Na segunda-feira à noite, eles anunciaram a adoção de um “mecanismo” para discutir controles de exportação – um paralelo com uma iniciativa semelhante combinada entre Pequim e Washington -, assim como a concordância da China em comprar mais bens agrícolas da UE.
A China também se comprometeu a resolver problemas como o atraso na aprovação de licenças para fabricantes europeus de produtos que substituem o leite materno e o das barreiras às importações de artigos de luxo.
Mas Pequim também deixou claro seu descontentamento com a investigação sobre subsídios. Dombrovskis contou que essa questão foi levantada em todas as reuniões de que participou.
O ministro do Comércio chinês, Wang Wentao, disse a Dombrovskis no domingo que o rápido crescimento do setor de veículos elétricos da China era resultado da inovação em pesquisa e desenvolvimento, da livre concorrência e de um “sistema industrial completo”.
O Ministério do Comércio chinês informou ontem que “Wang Wentao manifestou grande preocupação e forte insatisfação com o fato de a UE iniciar uma investigação contra subsídios voltada aos veículos elétricos chineses”. O Ministério acusou Bruxelas de promover “protecionismo”, o que afetaria a cooperação em termos ambientais e a estabilidade das cadeias mundiais de fornecimento para o setor automobilístico.
A Tesla já exporta carros elétricos de sua enorme fábrica de Xangai para a Europa, mas esse número deve cair como consequência da abertura de uma fábrica em Berlim no ano passado. Cerca de um quinto de todos os veículos elétricos (VEs) vendidos na Europa são fabricados na China.
No primeiro semestre deste ano, os carros fabricados na China representaram 11,2% de todos os VEs vendidos na Alemanha, de acordo com um relatório do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais divulgado este mês.
Segundo o relatório, cerca de 91% desses carros eram de marcas europeias de propriedade chinesa, como a britânica MG, da chinesa SAIC, ou a Polestar da Volvo, ou ainda de joint-ventures entre empresas europeias e chinesas, como Dacia Spring, Smart ou BMW iX3.
Dombrovskis também enfatizou que as novas leis de dados chinesas eram um “problema sistêmico” para as empresas estrangeiras que operam no país. Empresas europeias reclamam de que essas leis, que exigem que os dados sejam armazenados localmente, são vagas e complicadas de cumprir.
“Se as empresas… precisam ter autorização para transferências de dados importantes, mas ninguém define o que é importante, então fica difícil”, disse Dombrovskis. “Oferecer mais clareza já seria um bom ponto de partida.”
Fonte: Valor Econômico

