Executivo do laboratório japonês Takeda se diz confiante que novo imunizante será incluído no SUS no ano que vem; ministério diz que análises estão em andamento e levam em conta segurança e custo
Por Marcos de Moura e Souza — De São Paulo
04/10/2023 05h01 Atualizado há 29 minutos
O Brasil pode mudar a forma de lidar com a dengue a partir de 2024. A doença que atinge quase 90% das cidades brasileiras começou a ser prevenida com vacina em junho no país, mas somente em clínicas privadas.
A vacina que vem sendo ministrada é desenvolvida pelo laboratório japonês Takeda e foi aprovada em março pela Anvisa. É, por enquanto, a única vacina contra dengue com uso amplo, disponível globalmente.
A dúvida, no entanto, é se (e quando) o Ministério da Saúde incluirá o novo imunizante no Sistema Único de Saúde (SUS). Médicos têm falado sobre a importância da adoção da vacina. No entanto, com um único fabricante no mercado, o governo poderá ter menos margem para negociar preços e condições.
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Uma opção seria aguardar o Instituto Butantan, de São Paulo, que também trabalha em uma vacina contra a doença. O Butantan, no entanto, ainda está a alguns passos do estágio atual da Takeda. E prevê que seus testes terminem em 2024.
Butantan também desenvolve um imunizante, mas testes só devem ser finalizados em 2024
Cerca de 1,5 milhão de novos casos de dengue têm sido registrados por ano no Brasil.
Na semana passada, especialistas que integram um grupo que aconselha as decisões da Organização Mundial de Saúde (OMS) defenderam que a vacina da Takeda – batizada de Qdenga – seja aplicada em crianças e jovens de 6 a 16 anos que vivem em áreas onde a dengue é um problema de saúde público significativo.
No Brasil, a avaliação sobre a inclusão ou não da vacina na rede pública está na pauta da reunião entre especialistas da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) que ocorre na quinta-feira (5).
O Ministério da Saúde diz que trabalha para tornar a nova vacina contra a dengue acessível a todos os brasileiros por meio do SUS. E que um dos aspectos em avaliação são os custos. “A comissão avalia aspectos como eficácia, segurança, efetividade e impacto econômico da nova tecnologia no SUS”, afirmou o ministério por nota.
A vacina da Takeda chega aos distribuidores que abastecem as clínicas privadas em São Paulo (os impostos variam de Estado para Estado) ao preço de é R$ 281,42. A vacina é dada em duas doses. As negociações de preço com o ministério ainda não começaram.
O processo da Takeda está desde o fim de julho na comissão, que tem prazo até janeiro – prorrogável até abril – para decidir pela recomendação ou não da incorporação ao SUS.
Em entrevista ao Valor, o presidente da Takeda no Brasil, o venezuelano José Manuel Caamaño, afirmou estar confiante na recomendação da inclusão e disse que, uma vez que isso se confirme, os primeiros embarques com as vacinas chegariam no segundo semestre.
“Hoje temos para o Brasil quantidades reservadas para os anos de 2024 e 2025, isso levando em conta que teremos uma aprovação no Conitec no segundo trimestre do ano que vem”, disse, sem mencionar números. Caamaño afirmou que mais da metade da produção da companhia (em uma unidade na Alemanha) estará destinada a atender à futura demanda do governo brasileiro. “Infelizmente, o país é o número 1 em casos e em mortes por dengue”, disse. “O Brasil é prioridade para o a Takeda.”
Vivian Lee, diretora médica da companhia, afirma, no entanto, que uma eventual demora na decisão do governo poderá abrir espaço para que outros países decidam antes por compras de grande quantidades de doses. “Nós estamos esperando a decisão do Programa Nacional de Imunizações mais para o início do segundo semestre. O risco é se o Brasil atrasar demais.” Segundo a médica, 34 países já aprovaram o imunizante, entre eles os de União Europeia, Colômbia, Argentina, Indonésia e Tailândia.
A dengue vem se proliferando nas últimas décadas no Brasil e em vários países. A doença é causada por um vírus transmitido pelo mosquito Aedes aegypti. Os sintomas mais frequentes são febre alta, dores no corpo e nas articulações, dor atrás dos olhos, mal estar, falta de apetite, dor de cabeça e manchas vermelhas pelo corpo.
“A dengue é um enorme problema de saúde pública no Brasil, com mas de 1,5 milhão de casos se repetindo nos últimos anos, com mais de mil mortes [por ano], com ocupação de leitos e toda a carga da doença e não estamos conseguindo controlá-la ou diminuí-la com o controle do vetor [do mosquito], disse o médico Renato Kfouri, da Sociedade Brasileira de Imunizações. “Outras estratégias, como a vacinação, são muito bem-vindas.”
Mas, lembra ele, a discussão sobre a introdução no programa público vai depender do número de doses disponíveis, da avaliação de quais grupos devem ser priorizados e também de quais regiões. “É uma discussão complexa que vai precisar de uma boa modelagem de fármaco-economia, de matemática, para se desenhar melhor a estratégia para a implantação. Mas que a vacina é necessária eu não tenho dúvida.”
Estudos mostraram que a Qdenga reduz casos sintomáticos em mais de 80% e hospitalizações em 90%. O Butantan divulgou em dezembro resultados preliminares de seu estudo, que mostram 79,6% de eficácia geral para prevenir dengue sintomática. A outra vacina disponível é do laboratório Sanofi. Porém é restrita a quem já teve a doença.
Fonte: Valor Econômico