Por Lucinda Pinto, Valor — São Paulo
28/09/2022 10h36 Atualizado há 12 horas
Seja qual for o novo governo, haverá taxação de lucros e dividendos. Essa é a leitura do vice-presidente e sócio da Arko Adviser, Cristiano Noronha. “Não importa o governo, essa medida virá. Mas talvez Lula faça algo mais escalonado”, afirmou a uma plateia de investidores em evento realizado nesta quarta-feira pela Fitch Ratings, em São Paulo.
Para Noronha, caso o candidato do PT à Presidência vença a eleição, o mais provável é que não haja nenhuma “maluquice” no campo fiscal. Mas, na sua visão, alguns mecanismos adotados em governos anteriores do PT, como o uso dos bancos públicos, podem ser novamente acionados em um cenário de vitória de Lula. Ele lembra que em 2008, durante a crise financeira global, foi esse o caminho adotado para evitar o que o então ministro da Fazenda, Guido Mantega, chamou de “marolinha”. Agora, com o mundo enfrentando o risco de uma recessão global, esse poderia ser um instrumento. Para Noronha, um movimento de ampliação da oferta de crédito público pode ser dar de forma gradual, a depender, portanto, do cenário global.
Segundo Rafael Nascimento, diretor da Fitch, 50% do mercado de crédito está nas mãos de bancos públicos, e a eleição hoje representa uma dúvida para esse setor. Isso ajuda a explicar a perspectiva negativa na análise do ambiente operacional do setor. Ele diz que, para definir o rating dos bancos, a Fitch analisa seis aspectos, e também atribui uma nota para ambiente operacional, variável âncora para os demais.
A nota do ambiente operacional, muito vinculado ao soberano, permaneceu em BB-, com perspectiva negativa, enquanto o soberano, que também é BB-, foi de negativa para estável. “Isso reflete alguma cautela com o setor”, diz. “Um pouco pelas incertezas em relação à recuperação do PIB, inflação e juros, variáveis que impactam mais o negócio de bancos”, afirma. De todo modo, a Fitch vê menor risco de “downgrades” (rebaixamentos) neste momento: hoje, apenas 5% da carteira de instituições analisadas pela agência tem perspectiva negativa.
Segundo a Fitch, a expectativa era que o ano de 2021 tivesse sido mais “apertado” para os bancos, com piora da qualidade de ativos e também menor rentabilidade. Entretanto, ao longo do ano, houve mais “upgrades” (melhora da nota de crédito) do que downgrades . No ano passado, houve seis upgrades e um downgrade e, em 2022, a proporção é de 14 para apenas um.
Olhando especificamente, o encarecimento e maior seletividade na oferta de capital deve impor um desafio para as fintechs: parar de crescer ou fazer uma mudança de rota, que leve a uma redução de “valuation”. Essa é a leitura de Nascimento. “Qualquer uma das decisões é difícil, mas terá que ser endereçada no curto e médio prazos”, afirmou.
Diante desse cenário mais desafiador, o que se desenha é um movimento de consolidação do segmento de fintechs, um fenômeno semelhante ao que se viu no setor bancário nos anos 90 e anos 2000. O aumento do custo de funding, que impacta o setor financeiro de forma geral, tem um efeito ainda mais relevante para as fintechs, que são mais dependentes de capital de fora. “Tendo em vista a questão regulatória, muitas não têm o mesmo escopo de produtos de bancos”, explica Pedro Carvalho, diretor da área de rating de bancos da Fitch.
Muitas fintechs, afirma, têm o desafio de não contar com volume, diversificação, e, por não terem uma franquia consolidada, precisam pagar um prêmio adicional por isso. Nascimento observa que muitas delas estão reavaliando suas estratégias, devido ao aumento da inadimplência e ao desafio do aumento do custo do funding. Ele lembra que, em 2020 e 2021, durante a pandemia, essas instituições foram beneficiadas, tanto do ponto de vista de inadimplência quanto de rentabilidade, por causa das medidas de suporte à renda. Já em 2022, o cenário é diferente. A inadimplência nas classes C, D e E está piorando e o custo do funding está pressionando o resultado dessas instituições.
Fonte: Valor Econômico

