A taxa básica de juros efetiva dos Estados Unidos subiu pela terceira vez em um mês, ressaltando a crescente pressão nos mercados de financiamento de curto prazo, que pode repercutir na renda fixa e até acelerar o fim da redução do balanço de ativos do Federal Reserve (Fed, banco central americano).
A taxa básica de juros do Fed subiu de 4,10% na sessão anterior para 4,11%, mostram dados do Fed de Nova York divulgados na sexta-feira. Ela permanece dentro da meta de 4% a 4,25% do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc), definida no mês passado, quando as autoridades cortaram os juros em 0,25 ponto percentual. Até setembro, a taxa permaneceu próxima ao limite inferior da faixa durante grande parte dos últimos dois anos.
A alta ocorre em um momento em que as autoridades do Fed estão reduzindo o balanço de ativos do banco central – um processo conhecido como aperto quantitativo [“quantitative tightening”, em inglês, ou QT], iniciado em 2022 – revertendo trilhões de dólares em compras de ativos realizadas durante a pandemia. Isso vem drenando as reservas bancárias dos EUA no Fed, ao mesmo tempo em que o Tesouro está reconstruindo seu caixa na Treasury General Account [TGA], também atraindo mais recursos do mercado.
Com a liquidez diminuindo e os custos dos empréstimos “overnight” aumentando, os investidores estão lidando com um mercado onde o dinheiro não é mais abundante – o que eleva os rendimentos das operações compromissadas e dos títulos de curto prazo [T-bills] e aperta as condições financeiras. Estrategistas de Wall Street agora esperam cada vez mais que o Fed possa ter que desacelerar ou interromper sua redução de balanço patrimonial mais cedo do que o esperado – com alguns prevendo que o Fed anuncie o fim já neste mês.
“Será difícil para o Fed ignorar essas pressões emergentes nos mercados de curto prazo, tornando ainda mais provável o encerramento do QT na reunião do Fomc de outubro”, disse Gennadiy Goldberg, chefe de estratégia de taxas de juros dos EUA na TD Securities.
O presidente do Fed, Jerome Powell, afirmou na terça-feira que a redução no balanço de ativos terminará quando as reservas estiverem “um pouco acima” do nível que as autoridades consideram consistente com condições “amplas” – o mínimo necessário para evitar perturbações no mercado. Em seu sinal mais forte até o momento de que o Fed pode estar perto desse ponto, Powell disse que o banco central pode alcançá-lo “nos próximos meses”.
Será difícil para o Fed ignorar essas pressões emergentes nos mercados de curto prazo”
A pesquisa trimestral do Tesouro dos EUA com os corretores primários [“dealers”], que antecede o anúncio do governo sobre seus planos de refinanciamento em 5 de novembro, solicita suas opiniões sobre quando e como o Fed alterará o tamanho e a composição de sua carteira de títulos.
No início deste ano, o Fed desacelerou o ritmo do QT, reduzindo a quantidade de títulos que deixa vencer a cada mês.
O diretor Christopher Waller afirmou na quinta-feira que o balanço patrimonial do Fed voltou ao nível considerado adequado para uma condição “ampla” de liquidez – que ele havia estimado anteriormente em cerca de US$ 2,7 trilhões. As reservas bancárias caíram abaixo de US$ 3 trilhões, chegando a US$ 2,99 trilhões na semana encerrada em 15 de outubro, segundo dados do Fed divulgados na quinta-feira.
As taxas no mercado de acordos de recompra (“Repo”) – onde bancos e gestoras de ativos tomam e emprestam dinheiro de um dia para o outro – vêm subindo de forma constante desde o início de setembro e permanecem elevadas. Com a linha de “reverse Repo overnight” do Fed, um indicador-chave de liquidez excedente, agora quase esgotada, os mercados de financiamento tornaram-se mais propensos à volatilidade durante períodos de operações com grande volume de Treasuries.
Esses movimentos levaram a um aumento no uso da Standing Repo Facility (SRF) do Fed, ferramenta criada para conter tensões no mercado monetário. Na quinta-feira, o uso do instrumento atingiu o nível mais alto desde o fim do segundo trimestre, em junho. A operação seguinte, na sexta-feira, não teve demanda, depois que os custos de financiamento recuaram um pouco.
Estrategistas do RBC Capital Markets observaram que um uso “grande e persistente” da SRF indicaria uma “escassez real de liquidez”. Outro sinal seriam as taxas do tri-party repo [acordo de recompra com um intermediário custodiante, que diminui o risco da operação] operando acima da taxa oferecida pela SRF, o que mostraria que o estigma associado ao uso da linha está levando os dealers a pagar mais caro por financiamento nos mercados privados, escreveram os estrategistas Blake Gwinn e Izaac Brook.
No entanto, eles esperam que o ritmo mais lento do QT e os mecanismos de liquidez do Fed ajudem a aliviar as tensões nos mercados de funding, vendo os movimentos recentes “como uma reprecificação da liquidez, e não uma escassez problemática”. “Não achamos que seja o início de um aperto contínuo nas condições do mercado de Repo”, afirmaram.
Fonte: Valor Econômico

