Por Sérgio Tauhata — De São Paulo
18/10/2022 05h02 · Atualizado
O sócio da SPX aponta o período entre o primeiro e o segundo trimestres de 2023 como o mais crítico antes de o mercado retomar novamente a tendência de alta. “O pior momento será o primeiro semestre do ano que vem, mais especificamente entre o fim do primeiro trimestre e o início do segundo”, diz Daltro. “Mas todo esse cenário vai ser curto, porque logo entramos no ciclo de queda de juros.”
Na sua visão, o país já entrou há algum tempo em um ciclo imobiliário de alta, que costuma ter duração longa. “Estamos em um ciclo [imobiliário] de alta que pode ter começado em 2018, e esses ciclos demoram cerca de dez anos”, afirma. “E o ciclo brasileiro não tem nada a ver com o resto do mundo”, acrescenta. “Quando o mundo desenvolvido entrou em crise em 2008, a gente se recuperou rápido. O inverso também aconteceu, entre 2015 e 2016, enquanto lá fora [o mercado] estava indo bem, a gente amargou uma forte recessão.”
O ciclo imobiliário não tem comportamento de alta constante, lembra Daltro. “Mesmo numa alta, tem melhores e piores momentos, e este é um momento em que falta capital, porque o juro está muito alto”, avalia. “O juro subiu quase sete vezes desde a mínima [de 2%] e não conheço nenhum indústria em que o custo sobe sete vezes e fica todo mundo tranquilo.”
De acordo com o sócio da SPX, “os projetos imobiliários demoram quatro ou cinco anos para serem desenvolvidos e, alguns anos atrás, tinha muita gente animada para lançar e, agora, muitos estão no meio do ciclo de desenvolvimento”. Daltro enxerga dificuldades para as incorporadoras e fundos imobiliários mais alavancados, ou seja, que tomaram mais financiamentos para levar as obras adiante. “Nesses próximos três trimestres, quem está muito alavancado vai sofrer. A gente já vê sinais desse cenário acontecendo. Vemos, por exemplo, alguns FIIs tentando vender ativos para fazer caixa ou realizando ofertas de cotas para diminuir essa alavancagem. Isso tudo é efeitos dos juros.”
No médio prazo, há oportunidades de investimento, considera. “O momento é um dos melhores [potenciais de ganho de capital] que vi na vida, mas tem de ter muito cuidado para não pegar uma faca caindo”, afirma.
A SPX Syn, união entre a SPX e a Syn (ex-Cyrella Comercial Properties), já acumula R$ 2 bilhões em ativos sob gestão (AUM), em pouco mais de um ano e meio de existência. O braço de negócios imobiliários da célebre gestora macro foi criado em fevereiro de 2021, com a proposta de usar a capacidade de análise da casa nas estratégias ligadas às propriedades.
“Quando a área foi criada, queríamos justamente fazer algo que não temos visto muito nessa indústria, de unir a cabeça macro com a imobiliária”, conta. O gestor cita, como exemplo, o fato de “o setor imobiliário ter correlação muito grande e negativa com os juros”.
Daltro acredita que “uma parte relevante do retorno dessa indústria vem do macro, por exemplo, quando o juro real sobe, o setor imobiliário sofre, e quando as taxas caem o mercado se dá bem”. O início da SPX Syn, apesar da vocação para a gestão de fundos imobiliários puros, veio na forma de dois fundos de participações (FIPs). “Começamos com dois fundos de desenvolvimentos”, explica o executivo.
Portfólios de desenvolvimento são aqueles voltados para a aplicação de recursos em projetos de construção, que, em geral, começam do zero, o chamado “greenfield”. “Nos dois FIPs, temos um projeto em Portugal, de residências de alta renda no Algarve, e outro portfólio de desenvolvimento logístico e comercial.”
O braço de real estate da SPX lançou no mês passado o primeiro fundo imobiliário listado na B3. “Criamos um FII multiestratégia, que investe tanto em certificados de recebíveis imobiliários [CRI] e outras dívidas quanto em ações imobiliárias”, afirma Daltro. “Sempre junto com nossa estratégia macro.”
Outro sócio da SPX Syn, Marcelo Carletti, avalia que, “quando os juros estão altos, parece o melhor momento para investir, porque os piores retornos vieram quando os juros estavam baixos”. Conforme o gestor, “tem muito espaço para cair, porque o próprio Banco Central acha que o juro real de equilíbrio está em torno de 4%”. Com inflação projetada para o próximo ano em 5% e uma Selic atualmente em 13,75%, o juro real, quando se desconta a inflação, poderia alcançar 8%. “O país não aguenta juro real tão alto por tanto tempo.”
De acordo com Carletti, os planos para os próximos meses incluem ampliar a grade de produtos, com veículos focados em “tijolo”, ou seja, em edificações prontas, e ampliar o FII multiestratégia. Segundo o gestor, a casa estuda também ter um produto voltado para a renda imobiliária. “Estamos animados com a renda porque tem correlação mais negativa com a NTN-B longa. Teremos um 2023 bem ativo”, diz.
A casa não está trabalhando nenhuma oferta dos fundos já existentes. Mas, segundo Carletti, “é natural que a gente tente fazer uma oferta [em algum momento no futuro]”. Conforme o sócio, “o que está acontecendo nesse momento é que, a cada mês que passa com cenário de falta de liquidez, aparecem ‘deals’ melhores”. Então, pondera o gestor, “estamos tendo paciência e discernimento para escolher aqueles que fazem mais sentido”.
“Já temos um pipeline de R$ 7 bilhões hoje em termos de [oportunidades em] ativos imobiliários”, conta o executivo. O especialista avalia que o fluxo de negociação de ativos, em várias áreas, tende a se fortalecer, conforme o custo de capital fique mais apertado nos próximos trimestres, em meio às pressões de juros e de inflação ainda alta.
Fonte: Valor Econômico

