Por Patrick Temple-West e Stefania Palma — Financial Times, de Nova York e Washington
25/05/2022 05h03 Atualizado há 6 horas
O órgão supervisor dos mercados financeiros dos Estados Unidos se prepara para reprimir exageros reivindicados por produtos de investimento em suas credenciais ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em inglês), redigindo padrões para balizar o setor de fundos “sustentáveis”, após o crescimento explosivo que os aproximou dos US$ 3 trilhões em ativos.
As regras que estão sendo elaboradas pela Securities and Exchange Commission (SEC, equivalente à Comissão de Valores Mobiliários nos EUA) especificarão as informações que devem ser divulgadas por fundos de investimento cujos nomes incluem termos como “ESG”, “sustentável” ou “baixo carbono”. Acredita-se que essas regras exigirão explicações sobre como os fundos ESG são comercializados, como os critérios ESG estão incorporados aos investimentos e como esses fundos votam nas assembleias gerais das companhias, de acordo com fontes a par dos planos do regulador.
Os ativos em fundos sustentáveis globais somavam US$ 2,77 trilhões no fim do primeiro trimestre de 2022, em comparação ao US$ 1 trilhão de 2019, segundo a firma provedora de dados Morningstar. A categoria de investimentos ESG como um todo cobre considerações climáticas e ambientais, o “impacto” no bem social e fundos que, por exemplo, excluem setores como os de tabaco e armas de fogo.
“Há, atualmente, uma ampla gama do que os gestores de ativos podem querer dizer ao usar determinados termos e de que critérios eles podem usar”, disse o presidente da SEC, Gary Gensler, em março. “É fácil saber se um leite é desnatado. Talvez seja hora de tornar mais fácil saber se um fundo é realmente o que eles dizem que é.”
A SEC, hoje com quatro membros em sua diretoria, incluindo Gensler e outros dois indicados democratas, deverá votar nesta quarta-feira pela liberação das regras planejadas para uma fase de comentários públicos.
A agência já deu sinais de que terá uma posição mais rigorosa sobre o assunto. Na segunda-feira, anunciou um acordo legal de US$ 1,5 milhão – o primeiro relacionado às descrições ESG dos fundos – contra a divisão de assessoria de investimentos do BNY Mellon por acusações de que teria distorcido e omitido informações sobre critérios ESG em fundos mútuos que administra. O BNY Mellon comunicou que nenhum dos fundos sustentáveis que oferece chegou a ser alvo da SEC e que atualizou os materiais descritivos dos fundos.
“A maquiagem verde é um grande problema, e a SEC está certa em lidar com isso”, disse Jonathan Macey, professor da Yale Law School, acrescentando que tanto a ação fiscalizadora contra o BNY Mellon quanto as propostas da SEC para definir o que é ecológico iriam “ter um impacto significativo sobre as divulgações dos fundos mútuos sobre ESG”.
Nos EUA, 65 fundos foram reembalados com o rótulo ESG desde o início de 2019, de acordo com a Morningstar. Fundos que encontravam dificuldade para atrair novos investimentos mudaram seus nomes e prospectos de apresentação para aproveitar a onda de investimentos sustentáveis, de acordo com Jon Hale, diretor de análises de sustentabilidade para as Américas na Sustainalytics, uma firma da Morningstar.
“Muitos assessores financeiros estão à vontade em recomendar investimentos ESG quando os clientes os solicitam, mas não tenho certeza sobre até que ponto estão fazendo discernimentos”, disse Hale. “Os consumidores se perguntam: ‘O que é isso? Será que é autêntico?’.”
As normas planejadas pela SEC são resultado de uma análise do mercado ESG realizada em abril de 2021. Elas tomam por base uma “regra de intitulação”, adotada em 2001, sob a qual os fundos precisam investir pelo menos 80% de seus ativos da maneira sugerida pelo nome. Por exemplo, um fundo de ações não pode ter mais de 20% de seus recursos em dinheiro ou em títulos do Tesouro.
Jill Fisch, professora de direito de valores mobiliários da Penn Law, alertou para o risco de que a “criação de regras pesadas” em um campo “em evolução” como o de ESG “possa ter um efeito arrefecedor na inovação do mercado nesse espaço”. A divulgação de informação pelos fundos já se tornou mais “expansiva” em uma área onde não há “consenso de mercado sobre o que constitui um fundo ESG”, acrescentou.
“Não são produtos padronizados […]. Uma regra que tente padronizar o que constitui um fundo ESG será um grande passo atrás para as pessoas que desejam investir nesse espaço”, disse Fisch. “Padronização não é a mesma coisa que clareza.”
A SEC também propôs diretrizes mais rigorosas para o que deve ser divulgado pelas empresas sobre questões relacionadas ao clima, tendo anunciado em março regras há muito aguardadas para forçar as empresas de capital aberto a revelar suas emissões diretas de gases causadores do efeito estufa, incluindo a verificação dos dados por terceiros. A agência não respondeu aos pedidos para comentar as informações.
A SEC também está se equiparando em relação aos reguladores na Europa. A “taxonomia para atividades sustentáveis”, da União Europeia, que estabelecerá uma lista de atividades econômicas ecologicamente corretas, deverá ser aprovada pelo Parlamento Europeu em julho.
A Associação dos Assessores Financeiros (IAA), um grupo setorial, pediu à SEC para que inclua em sua proposta ESG uma certa margem de manobra nos deveres fiduciários dos profissionais para com os clientes. “Ficaríamos preocupados se a SEC limitasse ou obrigasse os fiduciários a considerar quaisquer fatores, incluindo os ESG”, disse Gail Bernstein, diretora jurídica da IAA.
Jennifer Han, chefe de assuntos regulatórios globais da Associação dos Fundos Gerenciados (MFA), um grupo setorial integrado por fundos de hedge, disse que “qualquer regra deveria ajudar a esclarecer os gestores de ativos alternativos engajados em estratégias ESG e ser calibrado para as diferentes necessidades de investidores institucionais e de varejo.”
O Instituto Companhia Investimento (ICI), cujos membros incluem fundos mútuos e fundos negociados em bolsa, não quis comentar o assunto. (Colaborou Andy Bounds, de Bruxelas)
Fonte: Valor Econômico

