A bolsa brasileira mostra um desempenho historicamente insatisfatório em relação a outros ativos e tem desafiado a máxima de que ações são para o longo prazo, segundo um estudo elaborado pela Tag Investimentos. O Ibovespa até traz implícito um retorno maior do que o das Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B), mas, numa linha de tempo, o prêmio de risco de ações não se materializa.
Apesar de haver empresas de excelência listadas na B3, as companhias têm competido na corrida contra um “queniano estrutural”, o CDI, e com um conjuntural, os juros americanos, diz André Leite, executivo-chefe de investimentos (CIO) da Tag. No front doméstico, ainda há ruídos fiscais e incertezas sobre quem estará no comando do Banco Central a partir do ano que vem.
A Tag calculou a taxa interna de retorno (TIR) real média do índice, que desde 2006 foi de 12,74%. O lucro das empresas, de fato, aumentou acima da inflação. Já a NTN-B de dez anos foi de 5,79% ao ano. Mas, nos preços de mercado, o conjunto de ações que compõem o índice não entregou tal resultado. “Tem um potencial que nunca é realizado completamente”, diz Leite.
Há desconto em múltiplos como o preço/lucro, perto de oito vezes pelos seus cálculos, um dos níveis mais baixos da média histórica – e em comparação a 21 vezes do americano S&P 500. Mas, pelo exercício da Tag, para o nível atual de lucros, o Ibovespa só proporcionaria um retorno que justificaria o risco se voltasse para a média de 12 vezes ou, na melhor das hipóteses, revisitasse a máxima de 16 vezes, o que significaria rumar para algo entre 190 mil e 250 mil pontos, muito longe do nível atual, na casa dos 120 mil pontos.
O Ibovespa em 190 mil pontos, na média de janelas de 48,60,120,180 e de 240 meses, traria um retorno de CDI mais 2,6%. Mas, quando se compara com outras classes, como os títulos de dívida isentos, seria possível ter a mesma rentabilidade, com menor volatilidade, diz o CIO da Tag – ainda que correndo risco de crédito corporativo. Com o índice em 250 mil pontos, a média acima do CDI seria de 6,8% na média desses intervalos.
Uma NTN-B com vencimento em agosto de 2026 pagava quase 6,5%, além da correção pelo IPCA, no dia 20, data em que o Copom encerrou o ciclo de cortes e manteve a Selic em 10,5% ao ano. No meio do caminho, os títulos do Tesouro podem ter volatilidade comparável à da bolsa, mas para quem carrega os papéis até o vencimento, eles asseguram aquilo que foi contratado, defende Leite.
Sem ver gatilhos de curto prazo para ações, na sua matemática de construção de portfólios, a XP, que tradicionalmente pautou sua atuação para estratégias de maior risco, como a bolsa, está hoje “mais posicionada do que gostaria em renda fixa”, segundo Rodrigo Sgavioli, chefe de alocação.
Nas suas recomendações, a instituição tem privilegiado mais estratégias de carrego do que de ganhos de capital, o que inclui fundos imobiliários com ativos de crédito, isentos de imposto de renda na distribuição de dividendos, dada a “gradualidade da política monetária”.
Uma carteira moderada tem hoje só 5% em bolsa e cerca de 65% em renda fixa local, sendo que os títulos pós-fixados representam um terço da exposição. Sgavioli diz que não se trata de se ancorar à Selic de 10,5%, sob o custo de “deixar dinheiro na mesa”. O segundo maior pedaço, 20%, está em títulos atrelados à inflação, com outros 10% em prefixados de duração mais curta, de até dois anos. Fundos imobiliários representam 7%, na primeira vez em três anos que a XP tem mais posição estrutural em carteiras listadas do que em ações. “A gente ainda vai ter esse DNA de renda variável. Mas o retorno esperado do fundo imobiliário no longo prazo é muito parecido com o da bolsa, mas com um terço da volatilidade”, diz o executivo da XP.
No longo prazo, Sgavioli diz que uma boa seleção de empresas mais resilientes, de qualidade e que saibam atravessar os períodos mais adversos do ciclo econômico acaba entregando lucros e margens crescentes quando se compra os ativos a preços baratos, superando o retorno da NTN-B. “Numa economia funcional, em ciclos mais longos, de dez a 15 anos, a bolsa rende mais que a renda fixa, seja qual for. Não o Ibovespa, mas bons ativos rendem mais do que o caixa.”
Fonte: Valor Econômico

