Intenção do presidente da Câmara, Arthur Lira, é votar projeto nesta quarta-feira, como parte do ajuste fiscal. Votação ainda dependerá de reunião com líderes dos partidos, para saber se há acordo sobre o texto
Por Raphael Di Cunto, Guilherme Pimenta e Marcelo Ribeiro, Valor — Brasília
O deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) desistiu de incorporar mudanças no mecanismo dos Juros sobre Capital Próprio (JCP) ao projeto de lei (PL) da tributação das offshore. A equipe econômica do governo foi pega de surpresa pela sugestão do parlamentar e não conseguiu elaborar uma proposta “calibrada”, que não causasse ruídos para aprovar o restante das medidas de ajuste fiscal.
O parecer ao projeto foi protocolado na noite dessa terça-feira, mas sem a JCP. O texto contém a tributação dos investimentos de pessoas físicas no exterior (offshore) e dos fundos de investimentos exclusivos (com poucos cotistas). Veja os principais pontos do relatório:
- Reduziu a alíquota proposta pelo Executivo para tributar o estoque desses investimentos, de 10% para 6%;
- Estoque dos fundos exclusivos ainda poderá ser pago em até 24 meses, a partir de maio de 2024, com as parcelas corrigidas pela Selic mais 1% ao mês;
- Atualização dos investimentos no exterior a valores de 31 de dezembro de 2023 será opcional e terá que ser paga até maio de 2024 (neste caso, o contribuinte pode preferir não fazê-la, como no caso de um imóvel, já que o lucro só existirá no momento da venda). A alíquota posterior variará entre 15% e 22,5%, a depender do prazo e do valor do investimento.
A mudança nas alíquotas reduzirá a arrecadação esperada. A taxação dos fundos exclusivos renderia R$ 7 bilhões em 2024. A das offshore, R$ 3,21 bilhões em 2023 e R$ 13,28 bilhões no ano que vem. O relator não apresentou em seu parecer as reestimativas orçamentárias pela diminuição. Conforme antecipado pelo Valor, a alteração era defendida pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para seguir o mesmo valor acordado com o mercado financeiro na reforma do imposto de renda em 2021.
A intenção de Lira é votar o projeto nesta quarta-feira, como parte do ajuste fiscal. Isso ainda dependerá de reunião com os líderes dos partidos, para saber se há acordo sobre o texto ou se serão necessárias mudanças. Não está descartado o adiamento para a próxima semana, mas o objetivo é aprovar a proposta antes de Lira viajar para o exterior (ele ficará fora de 10 a 20 de outubro). Os novos tributos precisam estar sancionados até dezembro.
A ideia de Pedro Paulo de incorporar as mudanças na JCP ao projeto agradava a ala política do governo, que viu na medida uma forma de acelerar a tramitação, mas o assunto era considerado “muito complexo” no Ministério da Fazenda diante das críticas à proposta inicial de extinguir o mecanismo, utilizado pelas grandes empresas (do regime do lucro real) para se capitalizarem e pagarem menos impostos ao remunerarem seus acionistas.
“Queremos um mecanismo para que o JCP cumpra sua função de capitalização das empresas, mas que isso não gere um mecanismo de se beneficiar tributariamente”, disse o relator.
As mudanças na JCP foram debatidas por ele com os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, à tarde. O governo ficou de elaborar uma sugestão e enviar ao parlamentar, mas não conseguiu fechá-la a tempo.
Segundo fonte da equipe econômica, a intenção é incentivar o uso do capital próprio da empresa, mas limitar o abatimento de juros sobre o aporte de terceiros como forma de diminuir o pagamento de impostos. O impasse seria qual a “calibragem” adequada para garantir um mecanismo justo.
A discussão “açodada” foi criticada pelas grandes empresas e poderia atrasar toda a discussão do projeto. “O tema é complexo, tem consequências reais sobre a economia em um momento delicado para o crédito das empresas e deveria ser discutido dentro de uma perspectiva de reforma tributária da renda. A discussão precisa ser aprofundada e uma aprovação sem discussão terá efeitos negativos sobre a saúde das companhias abertas brasileiras”, disse em nota a Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca).
Fonte: Valor Econômico