Por Olívia Bulla e Eduardo Magossi — De São Paulo
10/06/2022 05h01 Atualizado há 4 horas
O Banco Central Europeu (BCE) manteve ontem as taxas referenciais de juros da zona do euro, como esperado. Porém, em seu comunicado, a autoridade monetária disse que pretende aumentar a taxa básica em 0,25 ponto percentual na próxima reunião, em julho, e elevá-la novamente em setembro. A partir daí, o BCE sinalizou como “apropriado” um aumento gradual e sustentado dos juros, com o tamanho do movimento dependendo das expectativas de inflação para o médio prazo.
“A calibragem desse aumento da taxa de juros dependerá da atualização das expectativas de inflação de médio prazo. Se a perspectiva para a inflação persistir ou se deteriorar, um incremento maior será apropriado na reunião de setembro”, afirmou a autoridade monetária. Na reunião de ontem, as três principais taxas da zona do euro – de depósito, refinanciamento e empréstimo – permaneceram inalteradas, em -0,50%, zero e 0,25%, respectivamente.
A presidente do BCE, Christine Lagarde, reconheceu que a alta da inflação é um grande desafio, uma vez que as pressões inflacionárias se ampliaram e se intensificaram, principalmente nos preços de alimentos e energia. Segundo ela, os riscos à inflação são principalmente ascendentes e a aceleração das expectativas inflacionárias exige “muita atenção”.
Em entrevista coletiva após a reunião do BCE, Lagarde reiterou que a autoridade monetária deve elevar a taxa de juros em julho em 0,25 ponto percentual e disse ser apropriado aumentar novamente o custo dos empréstimos em setembro. “As três taxas referenciais de juros devem subir em setembro, mas a calibragem do aumento será dependente dos dados e do cenário para a inflação.”
O BCE confirmou ontem o fim do Programa de Compra de Ativos (APP, na sigla em inglês) a partir de 1º de julho, após ajustes nas compras mensais ao longo dos meses de abril, maio e junho. No entanto, o BCE pretende continuar a reinvestir nos rendimentos (“yields”) de títulos a vencer adquiridos no âmbito do APP.
Segundo o BCE, as pressões inflacionárias estão mais intensas, com os preços de muitos bens e serviços aumentando fortemente. A projeção para a inflação anual é de 6,8% em 2022; 3,5% em 2023; e 2,1% em 2024 – todas mais elevadas que as estimativas feitas em março. “A inflação alta é um grande desafio para nós”, afirmou no comunicado, acrescentando que irá assegurar que a inflação retorne à meta de 2% no médio prazo.
Mais do que a sinalização de que a Europa começa seu ciclo de aperto monetário em julho, o que chamou a atenção no discurso de Lagarde foi a projeção de uma inflação de 2,1% para 2024, ainda acima da meta de 2% daqui a dois anos. “É uma sinalização clara de que o aperto monetário irá durar mais tempo do que o previsto e as altas nos juros terão que ser maiores e mais intensas”, afirma Diogo Saraiva, sócio e economista da gestora Blueline, que também notou um tom mais “hawkish” (favorável ao aperto monetário) na fala de Lagarde. “A inflação está mais alta e disseminada e acendeu o sinal de alerta.”
Para Bruno Hampshire, economista de internacional da ACE Capital, houve uma clara mudança no discurso de Lagarde, que agora admite que a inflação está mais persistente e é um desafio a ser enfrentado.
“A projeção de inflação de 2,1% para 2024, ainda acima da meta daqui a dois anos, é um sinal de que o BCE terá que agir com mais força e rapidamente para conter as pressões inflacionárias”, explica Hampshire. Ele acredita que depois da alta já confirmada de 0,25 ponto percentual em julho, a alta será de 0,50 ponto em setembro. “O BCE terá que subir o juro mais vezes e deverá chegar no segundo semestre de 2023 entre 2% e 2,5%.”
Lagarde destacou ainda que a decisão de política monetária do BCE foi aprovada por unanimidade e após “discussões muito produtivas”. Segundo ela, a autoridade monetária está considerando, de um lado, os riscos ascendentes à inflação. De outro, observam-se fatores de apoio à economia, como a reabertura da atividade.
“Os riscos relacionados à pandemia diminuíram, mas as cadeias globais seguem pressionadas”, avaliou a presidente do BCE. Para ela, a atividade econômica deve ganhar força, com o mercado de trabalho forte mantendo o consumo, em meio ao aumento do crescimento salarial, que deve se acelerar. Contudo, Lagarde avalia que a invasão russa da Ucrânia deve prejudicar o crescimento econômico na zona do euro e pesar na confiança dos agentes econômicos, diante dos choques na oferta de alimentos, petróleo e gás natural. Para ela, mais turbulência no fornecimento de energia pode travar a economia da zona do euro.
Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter, avalia que depois da alta de 0,25 ponto percentual em julho, a quantidade e a intensidade das altas será maior, devendo já ser de 0,50 ponto em setembro. “Não há dúvidas de que o discurso [da Lagarde] foi mais ‘hawkish’ e apontou uma maior determinação em combater a inflação”, disse a economista.
Fonte: Valor Econômico

