Por Ricardo Mendonça — De São Paulo
04/10/2022 05h01 Atualizado há 3 horas
Parte dos eleitores originalmente dispostos a votar em Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (MDB), candidatos nanicos, em branco ou nulo, mas que nutriam tendência pró-Jair Bolsonaro ou anti-PT na hipótese de segundo turno, teriam antecipado essa decisão e migrado para o presidente já no primeiro turno.
Essa é a principal hipótese de representantes de empresas de pesquisa para explicar a divergência de números entre as sondagens de véspera e os resultados apurados.Nenhum representante de empresa de pesquisa aventa a possibilidade de erro amostral ou de técnica de abordagem e entrevista.
Pesquisa do Datafolha no dia 1º de outubro atribuía ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) 50% das intenções de voto. Bolsonaro (PL) tinha 36%; Tebet, 6%; Ciro, 5%; Soraya Thronicke (União Brasil) e Felipe d’Avila (Novo), 1% cada um.
Nas urnas, todos, exceto Bolsonaro, tiveram menos do que isso. Lula marcou 48,4% (1,6 ponto a menos); Tebet, 4,2% (1,8 a menos); Ciro, 3% (2 abaixo); Thronicke e d’Avila, 0,5% cada um.
Tudo dentro da margem de erro, de dois pontos, não fosse a votação obtida por Bolsonaro. Nas urnas, o presidente marcou 43,2%, 7,2 pontos a mais do que no Datafolha.
Algo parecido ocorreu com o Ipec. Na véspera, a empresa marcou 51% para Lula (2,6 pontos a mais que o apurado) e 37% para Bolsonaro (6,2 a menos). Tebet e Ciro tinham 5% (diferença de 0,8 e 2 pontos); Thronicke e d’Ávila também marcavam 1%.
Em nota, o Datafolha afirmou que, em suas últimas três pesquisas, já vinha apontando perda de votos de Ciro e consolidação menor nas intenções de voto em Tebet (eleitores admitiam que ainda poderiam mudar o voto até o pleito).
“O voto útil, neste caso, beneficiou mais o atual presidente do que seu adversário”, diz num trecho. “Esses movimentos ocorreram entre a véspera da eleição e o dia da votação, e não puderam ser captados por pesquisas realizadas entre sexta (30) e sábado (1º).”
Em entrevista concedida após a eleição, a diretora do instituto, Luciana Chong, sustentou que não houve erro. “Em movimento de última hora”, disse ela, parte do eleitorado “antecipou” o comportamento do segundo turno.
Diretor da Quaest, Felipe Nunes tem explicação parecida. Ele destaca que, em sua série, Ciro aparecia com 7% poucos dias antes do pleito, caiu para 6% e terminou com 3%. “Esse eleitor do Ciro, na reta final, foi para o Bolsonaro”, disse. “A postura do Ciro foi determinante para apontar esse caminho.”
Maurício Moura, do Ideia, acha a hipótese plausível e acrescenta outros dados. Ele lembra que, em sua última pesquisa, 12% diziam que poderiam mudar de voto até o pleito. “Minha leitura é que essas pessoas mudaram de voto”.
Outro fator seria o fenômeno da mobilização anti-PT diante da possibilidade concreta de Lula vencer no primeiro turno. “Isso já ocorreu antes. Quando o PT ameaça ganhar no primeiro turno, o anti-petismo é rapidamente mobilizado. Nunca existiu voto útil pelo PT. Mas sempre teve voto útil contra o PT.”
Segundo Moura, trata-se da repetição da eleição de 2006. Naquele ano, quando Lula estava próximo de ser reeleito no primeiro turno, houve forte crescimento de última hora de seu rival da ocasião, o então tucano Geraldo Alckmin.
Em alguns Estados, discrepâncias pesquisas-urnas foram ainda maiores. Em São Paulo, por exemplo, ninguém apontou Tarcísio de Freiras (Republicanos) na frente de Fernando Haddad (PT).
Para esses casos, apontam os representantes das empresas, a explicação passaria pela alta taxa de indecisão até a última hora. À GloboNews, a diretora do Ipec, Márcia Cavallari, lembrou que 45% não sabiam em quem votar para governador até a véspera; e mais de 60% não tinham voto para senador.
“Nos Estados a discussão é mais complexa. O massacre de informações sobre a eleição presidencial joga a disputa de governador para segundo plano”, diz Moura. “Além disso, antes havia 12 semanas de campanha. A partir de 2018 foi reduzido para seis. Então as pessoas se engajam para governador muito tarde. Se a campanha continuar curta assim, mudanças de última hora continuarão frequentes.”
Fonte: Valor Econômico

