Por Andrew Edgecliffe-Johnson, Ian Johnston, Eleanor Olcott e Leila Abboud — Financial Times, de Nova York, Londres, Taipé e Paris
02/05/2022 05h03 Atualizado 02/05/2022
Os “lockdowns” para conter a covid-19 na China estão prejudicando as linhas de produção das multinacionais ocidentais, afetando as cadeias de suprimentos e ameaçando as perspectivas financeiras à medida que Pequim intensifica seus esforços para conter um aumento dos casos de covid-19.
Com a política covid-zero da China pressionando cada vez mais a atividade empresarial, alguns analistas alertam que o crescimento real da economia do país pode cair para a faixa de 3% neste ano, possivelmente colocando-a abaixo do ritmo de expansão dos EUA.
Apple, Coca-Cola, General Electric e Pernod Ricard estão entre as companhias que alertaram recentemente para a ameaça dos lockdowns na segunda maior economia do mundo, com muitas outras empresas mais atribuindo às duras medidas o aumento nos custos, quedas nos resultados mais recentes e posições mais cautelosas em relação às perspectivas.
A aplicação da rígida política de “covid-zero” pelo país se acelerou nas últimas semanas, deixando cerca de 345 milhões de pessoas sob lockdowns totais ou parciais em 46 cidades, segundo estimativas do banco japonês Nomura. O lockdown de Xangai, centro empresarial da China e que abriga o maior porto do mundo, agravou as perturbações ao paralisar setores como o automobilístico, bens de consumo e tecnologia.
Depois de mais de um mês em lockdown, os novos casos de covid em Xangai estão diminuindo, mas mais de 40% dos moradores ainda estão proibidos de sair de casa, atrapalhando a logística. Os balanços dos últimos dias das multinacionais americanas e europeias revelam que as consequências da política chinesa são globais.
“Há uma fila enorme de navios esperando para descarregar, a cadeia de suprimentos está muito emaranhada e congestionada”, diz Shiv Shivaraman, diretor adjunto para a região da Ásia da consultoria internacional AlixPartners. “E a coisa vai piorar, e não melhorar.”
O conglomerado GE está entre os que sinalizaram perigo, afirmando que sua produção e a demanda por seus produtos de aviação e saúde na China foram atingidos. “As consequências dos lockdowns fogem do nosso controle. Ninguém realmente sabe quais serão elas”, disse seu CEO, Larry Culp.
Da varejista on-line Amazon à trader agrícola Archer Daniels Midland, as companhias perceberam que obter mercadorias da China por navio ou frete aéreo agora custa mais e demora mais por causa das restrições em alguns dos principais portos e ruptura na logística interna de trens a caminhões. A espera para os navios que chegam para atracar no porto de Xangai passou de 12 horas para dois dias desde o início do lockdown, diz a empresa de dados de fretes Freightos. Isso está levando muitas transportadoras a desviar exportações para o porto de Ningbo, também mais congestionado.
Os danos causados pelos lockdowns na China ocorrem no momento em que a economia mundial enfrenta as consequências da invasão da Ucrânia pela Rússia, que fez os preços da energia dispararem e levou o Fundo Monetário Internacional (FMI) a reduzir neste mês suas previsões de crescimento para a economia mundial.
As múltis enfrentam não só tensões nas cadeias de suprimentos, como também queda na demanda interna chinesa. James Quincey, CEO da Coca-Cola, disse que seus negócios no país começaram o ano bem, mas os lockdowns, em especial em Xangai, “esfriaram as coisas e terminamos o trimestre no vermelho”.
O grupo de destilados Pernod Ricard, que realiza 10% de suas vendas na China, alertou que foi “muito impactado” pelas restrições sanitárias contra a covid-19.
O grupo de artigos de luxo LVMH e a Kering disseram que o movimento caiu nas últimas semanas. Segundo a Jefferies, Xangai responde por cerca de 9% dos gastos globais com artigos de luxo.
Sem nenhum sinal de um fim próximo dos lockdowns, algumas empresas estão buscando meios de amenizar as perturbações. A Ford vem tentando limitar as consequências se concentrando na aceleração dos fretes na região de Xangai, onde ela tem cerca de 50 fornecedores de nível 1.
Tim Cook, CEO da Apple, disse que ao trabalhar com as autoridades locais, a fabricante do iPhone conseguiu reiniciar suas fábricas de montagem no corredor de Xangai. A queda do número de casos de covid “dá alguma razão para otimismo”, segundo ele.
As múltis também podem contar com dois anos de experiência quando se trata de enfrentar os desafios relacionados à pandemia. “Nos sentimos mais bem preparados e mais resilientes para a jornada da covid na China em 2022 do que em 2020”, diz Quincey. (Com Nikkei)
Fonte: Valor Econômico