O novo governo do premiê da Índia, Narendra Modi, anunciou gastos enormes para combater o desemprego e para financiar projetos defendidos por seus principais aliados políticos, no que é a indicação mais explícita até o momento de que o partido no poder reconhece a mudança no cenário político da Índia depois do duro revés eleitoral no mês passado.
Em um discurso de 83 minutos no Parlamento da Índia nesta terça-feira (23), a ministra das Finanças, Nirmala Sitharaman, disse que o governo destinará 2 trilhões de rúpias (US$ 23,9 bilhões) para criar mais empregos e melhorar as qualificações de sua vasta população jovem — as principais preocupações apontadas pelos eleitores nas últimas eleições da Índia, que o governo negligenciou em grande parte durante anos.
Ela também manteve os planos de um gasto de capital de cerca de US$ 133 bilhões, ou 3,4% do PIB, no ano até março de 2025. O valor é inalterado em relação ao plano de gastos provisório anunciado antes das eleições deste ano.
Apesar dos planos de gastos significativos, a Índia também reduziu sua estimativa de déficit fiscal. Sitharaman afirmou que o governo de Modi está comprometido em reduzir o déficit fiscal de 4,9% do PIB neste ano financeiro para abaixo de 4,5% no ano seguinte.
O governo de Modi também prepara apoio financeiro para dois partidos regionais que saíram das eleições como aliados-chave de sua coalizão. Este é o primeiro plano orçamentário apresentado pelo governo depois que os eleitores negaram ao partido de Modi, o Bharatiya Janata (BJP), a maioria no Parlamento pela primeira vez em 10 anos — e antes de eleições regionais importantes marcadas para o fim deste ano.
Apesar do ritmo de crescimento de mais de 8%, que a torna a grande economia de crescimento mais rápido do mundo, a Índia continua a sofrer com problemas econômicos profundos, como o desemprego persistente, o aumento da desigualdade e a inflação alta. A falta de vagas de trabalho, em especial para sua enorme e crescente população de jovens, tornou-se um dos principais desafios do país. A empresa privada de pesquisa Centre for Monitoring Indian Economy estima que a taxa de desemprego entre as pessoas de 20 a 24 anos é superior a 40%.
“[O discurso] mostrou um foco na geração de emprego, que claramente continua a ser o maior desafio para a grande economia de crescimento mais rápido”, disse o economista indiano do Société Générale Kunal Kundu. “Também é um nítido afastamento da narrativa anterior de que o desemprego não é um grande desafio.”
O orçamento serve como uma das indicações mais concretas até o momento sobre como Modi planeja acomodar as exigências dos eleitores e de seus tão necessários aliados na sequência do doloroso resultado eleitoral. Até agora, o governo de Modi tinha cedido muito pouco aos novos parceiros da coalizão. Seu partido manteve a maior parte dos cargos mais importantes no Gabinete e seus aliados mantinham as demandas de recursos para seus Estados com dificuldades financeiras.
Orçamentos anteriores buscavam estimular o crescimento ao redobrar as despesas com obras de infraestrutura, uma abordagem elogiada por empresas e investidores estrangeiros que olham para a Índia como um destino para diversificar suas cadeias de fornecimento e tirá-las da China. Mas os partidos da oposição criticavam essas mesmas medidas, com acusações de que negligenciavam os indianos pobres e não conseguiam criar empregos. Em sua pesquisa econômica divulgada na segunda-feira, o governo da Índia avaliou que o país precisará criar uma média de 8 milhões de empregos não agrícolas por ano até 2030.
Kundu, do Société Générale, observou que a forte ênfase do orçamento no desemprego contrasta com o programa do BJP, que continha pouquíssimas referências às limitações do emprego na Índia.
Entre as medidas anunciadas por Sitharaman nesta terça-feira estão incentivos para empresas criarem empregos e melhorarem as qualificações de seus funcionários. A ministra também listou uma série de isenções do imposto de renda com o objetivo de aumentar o consumo. Segundo ela, isso resultará em uma economia de até 17.500 rúpias por ano para indianos assalariados.
Para dois aliados-chave de Modi – os partidos Telugu Desam no Estado de Andhra Pradesh e Janata Dal (Unido) em Bihar –, Sitharaman disse que o governo direcionaria bilhões de dólares para projetos importantes, inclusive para o desenvolvimento da nova capital de Andhra Pradesh.
Sitharaman comprometeu-se a reduzir o déficit orçamentário para 4,9% do Produto Interno Bruto (PIB) no ano fiscal corrente, uma queda em comparação com sua projeção de fevereiro, de 5,1%. Segundo o governo, as novas despesas serão financiadas com o forte aumento das receitas tributárias, acelerado pela economia em expansão da Índia, assim como por um dividendo recorde de US$ 25 bilhões do banco central.
Rahul Gandhi, líder da oposição no Parlamento, disse nesta terça-feira que o orçamento de Modi está cheio de “promessas vazias”, destinadas a apaziguar os aliados com promessas que têm um custo para os indianos comuns. Ele também afirmou que o orçamento era um “copia e cola” do programa eleitoral da oposição.
“Modi apaziguando aliados mostra que ele não tem outra escolha que não seja se adaptar às necessidades da política de coalizões”, disse Yamini Aiyar, ex-presidente do think-tank de Nova Déli Centre for Policy Research. “Ele mostrou um certo grau de disposição ao compromisso, embora ainda esteja em posição de vantagem.”
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_63b422c2caee4269b8b34177e8876b93/internal_photos/bs/2024/5/U/W8aCFCRcG0rmA6tdZDFw/naveed-ahmed-9dt4wutvwds-unsplash-1-.jpg)
Fonte: Valor Econômico

