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O aumento da instabilidade nos mercados financeiros globais atingiu em cheio a dinâmica da taxa de câmbio doméstica nos últimos dias. Em apenas cinco pregões, o dólar oscilou mais de R$ 0,30, ao passar de R$ 5,86 no início da semana passada para R$ 5,49 na sexta-feira. Os ventos externos têm ditado o comportamento do câmbio, em um ambiente que ainda abarca os riscos locais, sobretudo em relação às contas públicas.
Nesse sentido, a incerteza em torno dos rumos da moeda brasileira segue em níveis elevados. A sensação mediana no mercado, porém, é de que o câmbio não deve voltar aos níveis bem mais apreciados vistos no ano passado e que o alívio no real tende a ser limitado. Na pesquisa extraordinária conduzida pelo Valor com 102 instituições financeiras e consultorias entre os dias 7 e 9 de agosto, a mediana das estimativas para o dólar no fim deste ano ficou em R$ 5,40.
Houve, portanto, uma forte deterioração nas expectativas para o câmbio. No levantamento realizado pelo Valor no fim do ano passado, o ponto médio das projeções para a cotação do dólar em dezembro de 2024 ficou em R$ 5,00.
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A piora no câmbio doméstico desde abril – e o descolamento do real na comparação com outras moedas de mercados emergentes – se acentuou em junho, em um ambiente dominado pela aversão a risco interna, diante da preocupação de investidores com a questão fiscal. Nas últimas semanas, embora os riscos internos tenham diminuído, mesmo momentaneamente, fatores externos falaram mais alto diante dos temores relacionados a uma recessão nos Estados Unidos e ao desmonte de operações de “carry-trade” envolvendo o iene, que ganham com a diferença de juros entre países, em meio a sinais de aperto monetário no Japão.
O aumento do riscos levou algumas casas a revisarem as projeções do câmbio para um nível mais depreciado do real. Foi o caso da Buysidebrazil, que passou a estimar o dólar a R$ 5,50 no fim deste ano. “Indicativos das contas externas e o cenário internacional (com destaque para a queda de preços das commodities) apontam para um câmbio mais depreciado que o anteriormente previsto por nós”, dizem os profissionais da consultoria, que, antes, projetavam o dólar a R$ 5,40 no fim deste ano.
Na pesquisa, as estimativas coletadas para a taxa de câmbio vão de R$ 5,00 a R$ 5,70 por dólar no fim do ano, de 102 projeções no total.
No campo mais otimista da coleta, o economista-chefe do Banco Pine, Cristiano Oliveira, projeta o dólar a R$ 5,00 em dezembro, ao esperar uma redução das incertezas à frente. “Estamos olhando para os fundamentos macro, para aquilo que achamos que seja importante para a dinâmica do mercado de câmbio no Brasil. E acredito, inclusive, na continuidade da valorização do real em 2025”, diz.
“Há três ou quatro meses, a expectativa do mercado era de um dólar em torno de R$ 5,00 no fim do ano, mas, desde então, vimos um aumento da quantidade de incertezas globais e domésticas com impacto no real. Acreditamos que, ao longo dos próximos meses, grande parte dessas incertezas irá diminuir”, afirma Oliveira.
Ele nota que esse processo já começou, ao observar o movimento do câmbio na semana passada, em que o dólar abandonou as máximas desde 2021 para fechar em torno de R$ 5,50 na sexta-feira. “E isso irá continuar. Uma das principais incertezas é em relação ao ciclo de afrouxamento monetário nos Estados Unidos, mas, mais importante que o ritmo de cortes será o ‘orçamento’ total do ciclo. Pela curva de juros, teremos pelo menos 1,5 ponto percentual de corte nos juros, o que me parece adequado, em um contexto de ‘pouso suave’ da economia”, aponta.
Oliveira cita, além disso, uma redução das incertezas esperada pelo Pine. Como exemplo, o economista observa que, em relação à condução da política monetária, há a percepção de que a transição no comando do Banco Central será suave. “Se será mesmo ou não o Gabriel Galípolo [o indicado para a presidência do BC], não sabemos, mas consideramos um nome adequado, que tem mostrado entender a importância da inflação no centro da meta”, diz. Além disso, Oliveira acredita em uma redução da incerteza fiscal nos próximos meses.
“Excluindo o ruído, o que fica é o fundamento, que continua apontando para uma valorização do real, sendo que o câmbio está muito distante daquele que seria o nível justo”, enfatiza Oliveira.
O comportamento do câmbio tem sido determinante, inclusive, para a condução da política monetária no curto prazo, na medida em que a possibilidade de elevação da taxa de juros começa a ser debatida com mais força entre os participantes do mercado. Na avaliação da economista-chefe da Gap Asset, Anna Reis, se o dólar ficar em R$ 5,70 ou R$ 5,80, “não vai ter jeito”. Ela, porém, adota uma visão um pouco mais construtiva para o câmbio, ao projetar a moeda americana a R$ 5,40 no fim deste ano, o que deve reduzir a pressão sobre a autoridade monetária à frente.
Para a economista, o estresse recente que levou a moeda americana a R$ 5,86 na semana passada se deu por fatores que não devem se sustentar, como as preocupações em torno de uma recessão econômica nos EUA e uma política monetária mais apertada no Japão. Além disso, ela avalia que o diferencial de juros entre o Brasil e outras economias desenvolvidas já não é tão pequeno e deve aumentar com o provável início dos cortes de juros nos EUA e a continuidade dos ciclos de flexibilização em outras economias avançadas, como zona do euro, Reino Unido e Canadá.
Reis admite, contudo, que o segundo semestre deve apresentar uma volatilidade maior no câmbio global e, dessa forma, prefere não “cantar vitória” antes da hora. “Achamos que, no fim das contas, o dólar aponta para baixo, mas a convicção é baixa. Vivemos um trimestre muito complicado e ‘sacodes’ maiores podem acontecer”, diz a economista, ao lembrar ainda que 2024 tem sido um ano de mudanças de cenário muito fortes.
Nesse sentido, as estrategistas Gisela Brant e Tania Escobedo Jacob, do J.P. Morgan, notam que os ruídos domésticos têm acentuado os efeitos de um sentimento global mais negativo nos mercados de câmbio, apesar do posicionamento técnico ser favorável a uma valorização do real no momento.
“O posicionamento técnico no real está mais limpo, mas a convicção por uma recuperação sustentável no curto prazo é baixa. O real já parece menos vulnerável do que estava no início do verão [no Hemisfério Norte]”, dizem as profissionais do J.P. Morgan.
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Fonte: Valor Econômico
