Mas eles alertam que esse impulso é transitório e não altera a visão de baixo crescimento no prazo mais longo. As projeções para 2024 continuam a apontar declínio, mostrando que a região segue num cenário de desaceleração.
O banco de investimentos Goldman Sachs (GS) estima que a região deve apresentar um crescimento marginal, de 0,3% em 2023, uma ligeira melhora em relação à previsão de 0% do início do ano. “O crescimento global foi melhor do que era previsto, o risco de uma desaceleração mais abrupta dos EUA diminuiu bastante e acho que houve uma subestimação do efeito residual da abertura pós-covid no setor de serviços. Apesar de um aperto monetário significativo, o setor mostrou resiliência”, explica o diretor do GS para a América Latina, Alberto Ramos.
Segundo ele, em 2024, as condições financeiras serão mais restritivas, sem muita margem de ociosidade da economia produtiva, por isso um crescimento compacto para 2024. “A região retoma a sua tendência estrutural de longo prazo, ou seja, de um crescimento modesto”.
A consultoria Oxford Economics também melhorou as previsões de crescimento da região como um todo em 2023, saindo da estagnação (0%) para 0,9%. “Desde o começo de 2022, a região estava num processo de desaceleração sincronizada, todos desaceleraram meio juntos. Mas, no primeiro trimestre deste ano (2023), todos surpreenderam para cima, então rompemos uma tendência, mas agora economistas projetam algum tipo de desaceleração para os países da região, seja por um eventual esfriamento da demanda externa ou um aperto nas condições de crédito a nível doméstico, seja por necessidade, para forçar a inflação para baixo, como na Colômbia e no Chile”, diz o economista da Oxford Marcos Casarin.
No caso do Brasil, o crescimento foi puxado pelo agronegócio. “O clima ajudou, a safra foi muito boa e o país conseguiu os fertilizantes que precisava. Mas isso não deve se repetir. Para o próximo ano, devemos ver uma desaceleração como ressaca do agronegócio e também do crédito”, afirma Casarin.
O país, ao lado do México, deve sentir o cenário de recessão global. A piora em EUA, Europa e China refletirá nas duas maiores economias latino-americanas.
No caso do México, segundo Ramos, outros fatores contribuíram para a melhora no cenário, além da revisão para cima nos EUA. O nearshoring (aproximação dos produtores ao seus clientes) tem alavancado a produção de manufaturados e investimentos e as remessas familiares enviadas ao México continuam elevadas.
O Chile começou a desacelerar em 2021 e vem em desaceleração lenta desde então. “O Chile foi o país emergente que teve a recuperação pós-pandemia mais rápida. Além disso, o governo tomou medidas que geraram liquidez. Por isso, agora, a contração é praticamente certa, não tem nada novo acontecendo lá”, avalia Casarin.
De acordo com ele, a Colômbia foi o país que mais demorou para responder com políticas ao superaquecimento da economia. “Agora, o país tem um ajuste a fazer e isso levará a uma contração do PIB.”
O cenário na Argentina continua sendo de preocupação. Com a eleição presidencial marcada para outubro, o governo deve atrasar ao máximo alguma medida mais forte, como uma maxidesvalorização, e o país enfrenta uma nova escalada inflacionária, com a taxa anual de 114,2% em maio.
Também os órgãos multilarerais elevaram recentemente as projeções para a região. O Banco Mundial aumentou sua previsão para o Produto Interno Bruto (PIB) latino-americano para 1,5% – de 1,3% no início do ano. Já a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) previu, no fim de abril um crescimento de 1,2% da região.
Outros analistas ressaltam que os preços agrícolas, que se mantêm altos mesmo após o fim da pandemia, contribuíram para o melhor desempenho até agora das projeções de crescimento para os exportadores de commodities. “A demanda por alimentos, por exemplo, continuou alta na China apesar desse crescimento abaixo do esperado [no pós-covid]”, diz a economista da Universidade de Boston Rebecca Ray, autora do relatório China-Latin America Economic Bulletin.
Analistas alertam que o cenário pode piorar em 2024 se o setor de indústria e construção da China não mostrar sinais de recuperação, e se os EUA entrarem em recessão.
“Sem dúvida o setor industrial é o principal motor das compras do exterior, onde a América Latina é um grande player – sobretudo no que diz respeito a matérias-primas, minerais, etc.”, diz o economista argentino Patricio Giusto, cientista político e mestre em Estudos Chineses da Universidade de Zhejiang. “Se o consumo interno não se recuperar na China, vamos ter grandes repercussões de demanda”, afirma.
Para que a América Latina possa crescer sem depender tanto do cenário nos EUA e na China, os países da região teriam de passar por uma mudança econômica. “Precisamos avançar na industrialização. Nossa história é de dependência da matéria-prima, com a recessão, nossos países entram em crise. É preciso criar formas de mudar isso, e assim economias mais estáveis”, diz Jorge Heine, professor da Universidade de Boston e ex-embaixador do Chile para a China, Índia e África do Sul.
Fonte: Valor Econômico

