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A utilização crescente das mídias proprietárias — comunicação criada e controlada diretamente pelas empresas e veiculadas em seus canais na internet — reflete as mudanças comportamentais dos consumidores na era digital, cada vez mais exigentes. A estratégia, segundo especialistas, funciona como alternativa eficaz para marcas que procuram relevância e relacionamento a longo prazo com clientes, fornecedores, colaboradores e demais públicos de interesse.
O modelo, que visa engajamento por meio de webséries, podcasts, videocasts, filmes, vídeos curtos e branded content, entre demais alternativas proprietárias, vem sendo adotado por empresas de diversos setores. Entre elas, destacam-se a montadora de caminhões Scania, a fornecedora de equipamentos hospitalares GE HealthCare, a produtora de alimentos para animais Elanco e a fabricante de açaí Frooty.
Marcio Furlan, diretor de marketing, comunicação e experiência do cliente da Scania Operações Comerciais Brasil, ressalta que as mídias próprias permitem uma condução mais cuidadosa da narrativa, além de dar poder de reação mais adequado ao que pede determinado momento. “Mas é muito importante ter autenticidade; afinal, as marcas são feitas de gente”, diz.
Segundo ele, a autenticidade surge quando as pessoas contam suas histórias e experiências, ligadas, de alguma forma, ao uso da marca. ‘‘Temos website, e-mail marketing, mas o que traz engajamento maior são vídeos curtos que conseguimos fazer de forma rápida”, conta Furlan.
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Eles são hospedados nos canais da empresa nas redes sociais, como o YouTube. As redes, por sinal, geram dados de engajamento e, a partir deles — obtidos com consentimento, faz questão de ressaltar Furlan —, é possível retroalimentar o consumidor com novas informações relevantes. E isso ajuda a gerar potencial de vendas.
A Scania tem o propósito de liderar a transição para um sistema de transporte mais sustentável. E, para chamar atenção para o tema, criou o projeto Rota para Belém: um caminhão 100% movido a biometano — combustível renovável feito a partir da purificação do biogás, gerado por resíduos agrícolas, urbanos e lodo de esgoto — saiu de São Bernardo do Campo, no ABC paulista, no começo de novembro, para estar presente na sede da COP30.
O abastecimento de biometano foi feito pela Ultragaz, uma das parceiras do projeto. O veículo puxou uma carreta — a Escola Móvel de Economia Circular do Senai-SP —, outro dos parceiros da empreitada. O conteúdo produzido durante a viagem será editado e divulgado nos canais da empresa até o fim do ano.
Filipe Xavier, diretor de branding, comunicação & ESG da GE HealthCare para América Latina, observa que o maior benefício em fortalecer os conteúdos proprietários é criar um mix que permite “tocar os públicos de interesse por mais vezes em toda a jornada de relacionamento”.
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Segundo ele, dependendo do canal, o investimento inicial em mídias próprias pode ser maior do que no marketing tradicional, mas o valor gerado “é exponencial e duradouro”. Os temas mais constantes da empresa são os que apontam para o futuro da saúde, como inteligência artificial, equidade no acesso, sustentabilidade, diagnóstico precoce e educação médica.
“Sempre que testamos alguma novidade, trazemos para nossos canais”, conta Xavier. Foi o caso do branded content do Dia do Médico: a explicação de um médico sobre o uso de software de inteligência artificial para exames mais precisos e rápidos de ressonância magnética se tornou conteúdo veiculado em jornal de circulação nacional, com replicação e forte repercussão no LinkedIn e Instagram da empresa.
Outro exemplo citado pelo executivo foram os filmes imersivos criados diretamente em dois eventos do setor neste ano, praticamente com edição e postagem em tempo real no Instagram e LinkedIn, as duas de melhor performance para a GE HealthCare. “Apenas essa estratégia nos permitiu interagir com mais de um milhão de pessoas no período dos eventos”, conta Xavier.
O retorno da comunicação com mídias próprias, observa ele, é medido em três dimensões. Uma delas é o tempo médio de consumo, profundidade da interação e relevância das audiências. Outra é o sentimento positivo e presença espontânea em outros canais e veículos. E a terceira é a influência sobre o negócio, que se materializa na abertura de parcerias, novas oportunidades, fortalecimento institucional em temas estratégicos e geração de receita.
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“A fórmula que aplicamos para engajar é simples, mas poderosa: colocar o ser humano no centro da narrativa, unindo emoção com inovação em conteúdos que respeitam a inteligência e o tempo do público”, ressalta Xavier.
Na Frooty, a websérie “Caminhos do Açaí” mostra os bastidores da produção do fruto a partir de uma narrativa coerente com a proposta de valor da empresa. “Ela se ancora em pilares muito importantes como sustentabilidade e responsabilidade social”, conta Julia Spina Bueno, gerente-executiva de marketing.
O açaí, lembra ela, é uma “febre mundial”, mas muita gente não sabe de onde ele vem e nem o processo para que chegue às mãos do consumidor. A intenção da Frooty é ir além dos atributos de produto, estabelecendo, a partir de histórias reais, um relacionamento mais profundo e de longo prazo com o público.
“Isso ajuda a posicionar a empresa como referência no assunto, aumentando a confiança do consumidor”, aponta Bueno. Para ela, mensagens verdadeiras afastam a percepção de que os conteúdos apenas enaltecem a marca. “Ao trazer o consumidor para dentro de casa, contando mais sobre o cultivo e manejo do açaí, engajamos ainda mais”, avalia.
Elídio Okano, coordenador de comunicação da Elanco, empresa que aposta no podcast Protagonistas do Campo, criado em parceria com a KPMO Editora e Comunicação, diz que foi possível perceber “uma aproximação genuína com os profissionais do agro e com o público interessado em conteúdos sobre esse segmento”.
O podcast trata de assuntos como sustentabilidade e produção de proteína animal unindo ciência e inovação na agropecuária de forma acessível. Foca em dados, evidências e depoimentos reais de quem vive o campo: produtores, técnicos e pesquisadores. “Essa abordagem faz com que o conteúdo tenha credibilidade e se torne uma referência, e não uma propaganda”, salienta Okano.
Para Aline Tomé, diretora de comunicação da KPMO Editora e Comunicação, as marcas estão redescobrindo o valor de construir seus próprios canais, espaços de fala que não sejam apenas promocionais, mas educativos e inspiradores. “O público quer acompanhar histórias que façam sentido e não campanhas que se esgotam em uma semana. Nesse contexto, as mídias próprias se tornaram fundamentais para construir posicionamento e reputação de longo prazo”, destaca.
Enquanto o marketing tradicional costuma gerar impacto de curto prazo, as mídias próprias constroem uma base que permanece. Um bom conteúdo continua sendo acessado, citado e compartilhado muito tempo depois da sua publicação, aponta Tomé. “É uma comunicação que amadurece com o tempo, o que raramente acontece com ações puramente publicitárias”, observa.
Maria Tereza Gomes, cofundadora da Jabuticaba Conteúdo, diz que produção e consumo de videocasts e podcasts no Brasil vêm crescendo de forma expressiva nos últimos anos, puxada pelo interesse por formatos práticos, flexíveis e sob demanda, que permitem uma conexão mais íntima com o público.
Ela lembra que os vídeos representam 84% de todo o tráfego da internet. Sua agência, em 16 anos, já produziu cerca de 3,8 mil dessas peças para diversos clientes. “Nenhum outro formato gera tanto engajamento, seja na comunicação interna como na externa”, salienta Gomes. E toda empresa, acrescenta, quer engajar, construir autoridade e conexão emocional com o público.
O retorno é medido por métricas como tempo de audiência, taxas de engajamento, compartilhamento, geração de leads. Mas ela salienta um detalhe importante: nem sempre o retorno é imediato, como nos comerciais de 30 segundos no intervalo do Jornal Nacional, o mais assistido do país.
Em formatos audiovisuais longos, a mensagem deve ser uma proposta de valor cultural. É o que recomenda Fernanda Menegotto, cofundadora da Vbrand, consultoria de negócios para branded entertainment a partir do audiovisual. “Isso significa partir de um conflito humano real, porque entretenimento sem conflito não emociona nem engaja”, destaca.
Também é importante garantir que o conteúdo esteja protegido de interferências promocionais diretas. “O papel da marca não é falar sobre si, mas viabilizar a conversa”, ensina Menegotto. Ou seja, o filme ou a série deve colocar o espectador dentro de uma transformação humana, com a marca aparecendo como o agente que apoia esse processo.
É esse conteúdo, explica a executiva, que viabiliza longevidade, debate e possibilidade de circulação por múltiplas janelas. “As marcas já entenderam que construir repertório cultural e valor simbólico exige continuidade e profundidade, não apenas campanhas de impacto pontual.”
Ela destaca que, ao contrário de uma campanha tradicional, que costuma ter pico e queda rápida, um conteúdo proprietário bem distribuído tem vida longa. “E amplia comunidade, relevância e associações positivas com a marca ao longo do tempo”, diz Menegotto.
Fonte: Valor Econômico