30/09/2022 05h00 Atualizado há 4 horas
Uma mensagem ruim que o candidato à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, deixou para os empresários com quem jantou na terça feira, foi a respeito do papel do BNDES e dos demais bancos públicos em um eventual governo seu. Para ele, o BNDES terá que ser o “indutor” do desenvolvimento da atividade econômica e os demais bancos federais voltarão a emprestar para a área social. Ele não disse se o crédito social teria taxa de juros subsidiadas nem detalhou como o BNDES cumpriria esse papel. “Acho que aqui ele reabriu uma janela para os pecados cometidos com os bancos públicos. Ficou uma impressão ruim de uso dos bancos públicos como no passado”, disse um dos presentes no jantar. “Acho que ele continua com um modelo analógico na cabeça”, observou um outro empresário que também esteve no encontro com o ex-presidente.
Lula estava acompanhado de Aloizio Mercadante, que causou surpresa nos presentes. “Mercadante estava muito equilibrado e ponderado. Elogiou FHC. Nem parecia ele mesmo”, disse uma das fontes ouvidas pela coluna. Ele sustentou que não haverá mudanças na macroeconomia: o câmbio continuará a ser flutuante, o Banco Central prosseguirá no controle da inflação no regime de metas e haverá responsabilidade fiscal. Ele não disse, mas esse é o tripé macroeconômico.
O ex-presidente fez reparos na conquista da independência do Banco Central.
“Tive o presidente mais longevo do BC, o Henrique Meirelles. Esse menino que está aí [Roberto Campos, presidente da autoridade monetária], duvido que ele tenha mais independência do que o Meirelles”, comentou, segundo relato de um dos presentes. “Acho que não faz sentido ter independência na lei porque o importante é o que acontece na prática, e eu já provei pra vocês que, sem mandato, o presidente que mais durou no BC foi o Meirelles”. Ele presidiu o Banco Central durante os dois mandatos de Lula.
Para o candidato, com independência ou não, o BC não pode ter um único foco, a inflação, e o aumento dos juros para controlá-la. “Acho que ele tem que se preocupar com tudo. Quero gerar emprego e fazer o país crescer. O BC tem que conversar conosco sobre geração de empregos. Não pode ser um Banco Central bitolado em inflação e juros”.
Aliás, Lula disse que um eventual governo seu terá duas obsessões: educação e emprego.
“Teto para o gasto público é um absurdo. No meu governo não vai ter”, sustentou o ex-presidente. Para ele, é importante ter responsabilidade fiscal para não gerar inflação, que penaliza mais os mais pobres. “Meu governo teve superávit primário em todos os anos. Mas, agora, precisamos encontrar recursos para as demandas sociais – reduzir a fome, investir muito mais em educação”. Ele não disse, mas deixou a impressão de que vai, na reforma tributária, aumentar a taxação sobre os muito ricos. Aliás, os principais candidatos à presidência da República estão de acordo em tributar os dividendos. Bolsonaro enviou proposta ao Congresso para taxar os lucros e dividendos, mas não foi aprovada.
Um dos empresários presentes ao jantar informou que tem notícia de interlocutores enviados por Lula para conversar com os ministros do Tribunal de Contas da União (TCU). Eles estariam tentando negociar uma “bandeira branca” para os primeiros anos de governo, uma licença para gastar um pouco mais sem que o tribunal venha a punir o governo por isto.
O Brasil, segundo Lula, vai voltar a ter protagonismo internacional no tema de combate ao aquecimento global, com foco no controle do desmatamento da Amazônia, pois quem desmata não é o agronegócio e sim os grileiros. Lula disse que vai visitar cada chefe de Estado importante para garantir que os investidores estrangeiros podem vir para o país, que é um lugar seguro. “Vamos cuidar do clima e do meio ambiente”, assegurou o candidato.
Lula fez críticas à privatização da BR Distribuidora [que passou a se chamar Vibra ], que considerou “um absurdo”, mas não pretende reestatizá-la, assim como não consta dos seus planos reverter a privatização da Eletrobras.
Daí em diante, segundo relato de empresários presentes ao encontro, Lula começou a “delirar”. Disse que a “quadrilha” de Curitiba tinha interesse em quebrar as construtoras brasileiras para beneficiar as companhias espanholas e americanas. Falou que o pré-sal, hoje, tem um custo menor do que o petróleo da Arábia Saudita. O dado correto seria que o custo do pré-sal no Brasil é da ordem de US$ 25 a US$ 30 o barril, enquanto na Arábia Saudita é de somente US$ 2 a US$ 3 dólares o barril.
Disse também que a Operação Lava-Jato interrompeu o a conclusão da construção das refinarias que daria ao país autossuficiência no refino.
Ele concluiu que o mensalão sempre existiu, desde que a República foi proclamada. Era uma coisa normal. “E vocês que foram contra o mensalão receberam de brinde o orçamento secreto, que é algo bem pior”, disse, segundo relato de um dos presentes.
Para outro empresário que também optou pelo anonimato, o resultado é que depois da onda do voto útil, aumentaram as chances de Lula ser eleito no primeiro turno. Não foi para angariar adesão ao voto útil que houve o jantar, avaliaram os empresários.
Há, porém, alguns senões. Por exemplo, o voto da mulher evangélica não está sendo capturado nas pesquisas e pode ser que ele impeça das eleições serem quitadas no primeiro turno.
Claudia Safatle é jornalista da equipe de criou o Valor Econômico e escreve às sextas-feiras
Fonte: Valor Econômico
