Novo Nordisk perderá a licença para uso exclusivo da semaglutida no Brasil em breve
PorJuliana Steil
Valor — São Paulo
Os impactos projetados para a economia brasileira em diversos setores (alimentar, vestuário, bares e restaurantes, por exemplo) após a queda da patente do princípio ativo do Ozempic (Semaglutida), hoje da Novo Nordisk, devem começar a ser sentidos no mercado a partir de 2027, aponta Tiago Cunha, gestor de renda variável da Ace Capital.
Em um relatório de tendências enviado a investidores, ao qual o Valor teve acesso, a Ace Capital analisou sob diversas perspectivas quais seriam os impactos sentidos na economia brasileira após a queda da patente do princípio ativo do Ozempic. “A gente sempre trabalha em relação aos investimentos não só olhando as empresas, mas olhando as tendências de crescimento a longo prazo”, explica Cunha, um dos autores da análise, que foi liderada por André Campanelli.
“Esse tipo de análise não é importante só para ver as oportunidades, mas também as ameaças”, diz Cunha.
A projeção indica que a movimentação nos setores marginais serão sentidos em cascata, a depender de uma série de fatores que, se cumpridos, resultam em benefícios ou malefícios para certas áreas. Sob esse aspecto, o varejo alimentar, a indústria de alimentos e cervejarias podem sentir impactos negativos; enquanto isso farmácias, varejo de vestuário e empresas que trabalham com bens aspiracionais (viagens, itens de luxo) podem se beneficiar.
Tudo isso, porém, parte do princípio da perda da patente. Só assim o medicamento seria barateado via produção de genéricos. “Se tudo o mais constante acontecer, o preço cair, o público-alvo expandir, estamos falando de algo a partir de 2027, com a queda da licença exclusiva, para começar a movimentar os outros setores”, diz Cunha.
O varejo de alimentos e a indústria alimentícia devem ser os primeiros a sentir esses efeitos, seguidos pelos bares e restaurantes e cervejarias, com a redução do consumo de álcool.
“A questão do varejo de vestuário vem depois. Para isso, é preciso que já tenha genérico no mercado, que a população já tenha começado a emagrecer e precise renovar o guarda-roupa. Estamos falando para lá de 2027”, diz Cunha.
A projeção de análise, defende Cunha, tem como objetivo antecipar tendências para que os interessados estejam atentos às mudanças que podem estar por vir nos próximos anos. Hoje, a Ace Capital não tem papéis nos setores com impacto projetado, diz Cunha. “Conforme o tema for ganhando tração e o impacto for começar a ser sentido, a gente consegue ter um pouco mais de momentum para fazer posições do tipo. Isso já está mapeado [com a análise].”
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_63b422c2caee4269b8b34177e8876b93/internal_photos/bs/2024/b/H/YpInOpSgOghPK5bjlN6Q/foto-tiago-cunha-1-.jpeg)
O estudo com o levantamento de dados para a produção do relatório levou aproximadamente um ano para apresentar a redação final.
Ozempic faz sucesso com off label
A caneta injetável é famosa. Ano passado, a receita da farmacêutica Novo Nordisk para o mercado privado fechou em R$ 3,7 bilhões e a substância chegou a ser incluída na lista de drogas em falta mantida pela Food & Drug Administration (FDA), agência reguladora equivalente à Anvisa nos Estados Unidos.
Muito de seu sucesso não vem da indicação principal de uso, no combate à diabetes tipo 2, mas do uso “off label”, para emagrecimento em pouco tempo. A Novo Nordisk diz que não endossa o uso off-label e alerta, em nota enviada ao Valor: “aprovado e comercializado no Brasil para o tratamento do diabetes tipo 2, [Ozempic] não possui indicação aprovada pelas agências regulatórias nacionais e internacionais para o tratamento de obesidade”.
No Brasil, hoje, uma caixa de Ozempic custa em torno de R$ 1.000 nas principais redes de varejo, mas o preço pode chegar a até R$ 1.280,87, conforme estabelecido pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), sendo que cada caixa dura aproximadamente um mês. O valor máximo do remédio é uma fatia de 90% do salário mínimo brasileiro, hoje em R$ 1.421.
Assim, o público que faz uso do medicamento — que tem uso autorizado para tratar diabetes tipo 2, mas que faz sucesso com o off label para emagrecimento em pouco tempo — fica restrito às classes mais altas atualmente. Com a chegada de genéricos no mercado, esse cenário pode mudar.
Fonte: Valor Econômico