Por Victor Rezende e Gabriel Roca — De São Paulo
13/06/2022 05h02 Atualizado há 4 horas
Com a Selic já em dois dígitos desde o início do ano e em território significativamente contracionista, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central se reúne nesta semana para entregar um novo aumento nos juros. O consenso do mercado aponta para uma alta de 0,5 ponto percentual, o que levaria a taxa básica para 13,25%. A decisão, contudo, ganhou contornos ainda mais incertos. A desancoragem das expectativas de inflação de 2023 se intensificou desde a última decisão e, além disso, a deterioração no balanço de risco fiscal deu apoio adicional à possibilidade de uma alta adicional da Selic em agosto – cenário que já foi capturado na pesquisa conduzida pelo Valor.
O levantamento foi realizado entre quinta e sexta-feira, após a divulgação do IPCA de maio, e contou com 91 instituições financeiras e consultorias. O ponto médio das projeções coletadas pelo Valor indica que a Selic deve ser elevada em 0,5 ponto nesta quarta-feira e em mais 0,25 ponto em agosto, quando chegaria a 13,5%, no fim do atual ciclo de aperto monetário. Na pesquisa divulgada em 30 de maio, o consenso apontava uma Selic em 13,25% no fim do ciclo.
O aumento nas expectativas para a Selic ocorre na esteira de uma nova deterioração da inflação esperada à frente. Se, no levantamento feito antes da reunião de maio do Copom as expectativas para o IPCA de 2023 estavam em 4%, agora elas estão em 4,6%. Cabe lembrar que o horizonte relevante para a política monetária inclui, no momento, apenas o ano-calendário de 2023 e que a meta de inflação do próximo ano é de 3,25%.
“Nós esperávamos que a inflação já tivesse desacelerado e a verdade é que continua havendo pressão inflacionária ainda muito espalhada e bastante preocupante na composição”, nota a economista-chefe para Brasil do J.P. Morgan, Cassiana Fernandez. Ela diz, ainda, que esse processo tem se refletido no aumento das expectativas inflacionárias, principalmente no horizonte relevante para a atuação do BC.
Na sexta-feira, o J.P. Morgan passou a enxergar, em seu cenário básico, um ciclo ainda mais extenso de aperto monetário, com um aumento final da Selic em agosto. Fernandez observa que o BC promoveu um ciclo bastante agressivo de aperto, ao elevar a Selic em mais de 10 pontos desde março de 2021, o que justifica a sensação de que o ciclo está próximo do fim.
“O ponto é que ainda é difícil calibrar esse fim. E, por isso, espero que o BC não só entregue uma alta de 0,5 ponto sinalizada na última comunicação, mas também deixe a porta aberta para movimentos futuros, reconhecendo que, desde a última reunião, houve uma piora no cenário de inflação”, afirma.
O superintendente de pesquisa econômica do Itaú Unibanco, Fernando Gonçalves, diz ser improvável que o BC interrompa o ciclo de aperto na quarta-feira. “Mesmo com o ‘headline’ [número cheio] um pouco melhor do IPCA de maio, os núcleos continuam extremamente altos e a inflação tem todas as características de ser persistente, bastante disseminada”, argumenta o profissional.
Nesse sentido, o Itaú entende que o Copom pode indicar que antevê uma nova elevação na Selic na reunião de agosto. Para Gonçalves, o comunicado deve ser semelhante ao da decisão de maio, em que o colegiado trouxe sinalizações fortes, mas optou por deixar os próximos passos da política monetária em aberto, a depender dos dados.
Além dos dois aumentos de 0,5 ponto nos juros esperados pelo Itaú, Gonçalves acredita que, para o processo de convergência das expectativas de inflação à meta se materializar, os juros precisarão permanecer em um nível elevado por um período bastante prolongado. “Só conseguimos ver um movimento de corte de juros em meados do ano que vem. Sabemos que períodos longos de relativa estabilidade na Selic não são comuns no Brasil, mas ela vai precisar ficar estacionada para que você comece a exercer uma influência maior dos juros na economia”, argumenta.
Não por acaso, os levantamentos do Valor já têm capturado uma tendência de aumento nas expectativas para a Selic no fim de 2023. Antes do Copom de maio, o ponto médio das projeções apontava para o juro básico em 9% no ano que vem. Agora, a expectativa é de uma Selic a 9,75%, no momento em que as apostas de que a taxa permanecerá acima de 10% têm aumentado.
A desancoragem das expectativas de inflação de médio prazo adiciona cautela a esse cenário, sobretudo no momento em que discussões sobre o aumento dos riscos fiscais têm reaparecido. Se, no Copom de maio, o balanço de riscos para a inflação soava mais simétrico, uma parcela do mercado espera que o colegiado reconheça o aumento das incertezas recentes sobre o futuro do arcabouço fiscal.
O esforço em tentar baratear os preços dos combustíveis via desoneração tributária é um fato que deve aumentar as incertezas para a decisão. “Tem um potencial deflacionário consideravelmente grande, mas os impactos seriam temporários. Além disso, as medidas implicam em piora do quadro fiscal. Como a discussão está em andamento, ela pode entrar lateralmente na política monetária via balanço de riscos”, diz o economista Leonardo Costa, da ASA Investments.
Para ele, as medidas pioram o balanço de riscos para o cumprimento das metas em 2023. “Observando as tentativas de controlar os preços administrados, eu considero como um risco adicional para o balanço no ano que vem. Obviamente que você ganha na inflação no curto prazo ao custo de inflação mais alta no médio prazo”, aponta.
A economista-chefe da ARX Investimentos, Elisa Machado, cuja expectativa é de uma Selic em 13,75% no ciclo, também acredita que o Copom deve deixar os próximos passos em aberto, dado o aumento da incerteza e dos riscos.
“Isso não só por conta dessa visão de que não tem alívio do lado da inflação, mas também por causa dessas novidades de alteração de ICMS, PIS/Cofins… De um lado, isso representa um aumento do risco fiscal e, de outro, há um abatimento da inflação em 2022, mas que voltaria em 2023, o que atrapalha o horizonte relevante e joga para cima as expectativas de inflação de 2023”, enfatiza Machado.
Para ela, o BC deveria se manter atento ao aumento dos riscos fiscais, já que a tramitação da PEC dos Combustíveis no Congresso gera um grau de incerteza ainda maior. “E isso pesa no risco. O balanço de riscos na questão fiscal é claramente pior. Não há dúvida. Por isso, tenho a ideia de que o BC tem de manter um discurso de porta aberta.”
Uma comunicação mais aberta também é defendida pela economista-chefe da Canvas Capital, Camila de Faria Lima, dado o nível de incertezas elevado. “No entanto, entendo que, se o Copom efetivamente já estiver vislumbrando o fim do ciclo de alta, seria melhor explicitar essa visão e, assim, balizar as expectativas do mercado”, diz. Para ela, isso poderia se dar com a indicação de mais uma alta residual ou com a indicação de que a alta a ser implementada nesta semana marca o fim do ciclo.
Em seu cenário básico, a Canvas projeta a Selic em 13,25% no fim do ciclo e em 10% em 2023. A economista lembra que o juro básico já está em nível bastante contracionista e que os efeitos mais contundentes na economia devem aparecer no segundo semestre. “Levando esses aspectos em conta, inclusive, a meu ver é completamente justificável, no cenário em que vivemos, o estabelecimento de um objetivo crível para a inflação do ano que vem, alongando-se a convergência ao centro da meta para 2024.”
O economista-chefe da RPS Capital, Victor Candido, também adota em seu cenário básico um encerramento do ciclo nesta semana, com a Selic em 13,25%, embora aponte riscos de uma nova alta em agosto. Para ele, o BC já cumpriu a parte principal de seu ciclo e, agora, resta apenas um “ajuste fino”. “Acredito que ele vá dar a alta de 0,5 ponto que está precificada na curva e dizer que precisa avaliar o cenário internacional, os novos riscos internos e ver como a própria inflação vai se comportar”, afirma.
Na visão de Candido, o BC até pode falar em uma pausa para avaliar os próximos passos, mas não pode fechar a porta para nenhum cenário. “Ele vai ter que deixar aberto para agosto e se mostrar dependente dos dados. Há uma série de incertezas: o PLP, questões fiscais e um novo movimento de alta de juros no exterior”, observa.
Fonte: Valor Econômico

