Por Gabriel Roca e Victor Rezende — De São Paulo
25/05/2022 05h03 Atualizado há 6 horas
O resultado acima do esperado do IPCA-15 de maio assustou participantes do mercado, ao revelar uma dinâmica bastante negativa da inflação, com aceleração dos núcleos e pressões acentuadas nos serviços e nos bens duráveis. No mercado, os reflexos se mostraram bem definidos desde os primeiros negócios do dia – as taxas futuras de juros exibiram forte alta e a possibilidade de novo aumento da Selic além de junho cresceu, o que mostra pressão adicional do mercado sobre o Banco Central.
A precificação do mercado quanto aos rumos da Selic no curto prazo pouco mudou nos últimos dias e a curva de juros, assim como o consenso dos economistas de mercado, indicava um aumento final de 0,5 ponto na Selic em junho. Ontem, porém, a surpresa inflacionária do IPCA-15 mudou a dinâmica do mercado de juros e os agentes passaram a embutir nos preços cenários mais agressivos de elevação da Selic à frente.
No fim do dia, a curva de juros precificava 72% de possibilidade de elevação de 0,5 ponto percentual no juro básico em junho e 28% de probabilidade de um aumento de 0,75 ponto, quando considerados apenas esses dois cenários. A taxa do DI para janeiro de 2023 avançou de 13,27% para 13,415%; e a do DI para janeiro de 2025 escalou de 12,035% para 12,295%.
“O IPCA-15 de hoje [ontem], com essa abertura tão ruim, torna muito difícil o trabalho do Banco Central de fechar a porta para novas altas de juros. O desafio de comunicação parece imenso”, observa a estrategista-chefe da MAG Investimentos, Patricia Pereira.
Na medida em que o cenário de inflação corrente tem piorado cada vez mais, a profissional acredita que a autoridade monetária deveria se utilizar da incerteza maior que a usual e deixar seus próximos passos em aberto. “Há, no mercado, a discussão sobre subir mais [a Selic] ou ficar mais tempo parado com os juros altos. Não acho que sejam hipóteses excludentes, mas o cenário de corte nas taxas está cada vez mais distante”, diz Pereira.
Não por acaso, a gestora dos fundos macro da Truxt Investimentos, Mariana Dreux, avalia que a curva de juros brasileira está “pouco premiada” por já embutir nos preços um ciclo de cortes à frente. Ela, assim, vê com bons olhos posições “tomadas” [aposta na alta das taxas futuras] em juros de prazo intermediário.
“O [DI para] janeiro de 2025 já opera precificando um ciclo de queda. Parece pouco prêmio”, afirma a profissional. A Truxt, inclusive, é uma das casas que projetam a Selic em 13,75% no fim do ciclo – cenário que foi mantido após a divulgação do IPCA-15 de maio.
Visão semelhante é defendida pelo economista-chefe da Quantitas, Ivo Chermont, cuja expectativa para o juro básico já era de 13,75% antes mesmo da divulgação da “prévia” da inflação de maio. Ele aponta, em especial, que a surpresa inflacionária e a qualidade ruim do IPCA-15 fortificam o cenário defendido pela Quantitas de duas elevações de 0,5 ponto na Selic. A gestora projeta, ainda, o IPCA em 9% neste ano e em 4,8% em 2023.
“O IPCA-15 deixa essa projeção mais confortável, já que a qualidade do número foi especialmente ruim, visto que as pressões em grupos mais resilientes tornam mais difíceis os argumentos de que o choque é passageiro”, afirma.
Em relação à comunicação do BC, Chermont diz esperar que o colegiado não se comprometa a dar nenhum tipo de prescrição sobre os rumos dos juros em prazos mais longos. Para o economista, diante de um cenário de incertezas elevadas à frente, “faria pouco sentido” cravar uma postura para horizontes mais longos. “Acho que o BC vai encerrar o ciclo em agosto e deixar [os próximos passos] em aberto, dizendo que está acompanhando os dados”, avalia Chermont.
A leitura de que o BC deve manter sua comunicação em aberto também é compartilhada pelo economista-chefe do Banco Original, Marco Antonio Caruso. “É justificável manter portas abertas, mas, em algum momento, ele vai ter que parar. As condições correntes não vão estar confortáveis quando ele decidir interromper o ciclo e será muito mais uma leitura de que o BC já fez bastante do que uma leitura de conforto com a situação atual da inflação”, argumenta.
Nesse sentido, a projeção do Original de Selic a 13,25% no fim do ciclo foi mantida inalterada por Caruso, que diz esperar a nova comunicação do Copom para possíveis atualizações de cenário. Mesmo assim, ele reconhece que o dado de hoje “mais abre do que fecha portas” para juros mais altos.
O cenário de inflação mais alta, inclusive, foi colocado nos preços dos ativos ontem, de acordo com a Renascença. A inflação precificada pela NTN-B com vencimento em agosto subiu de 6,44% para 6,93% ontem, enquanto a inflação embutida na NTN-B para maio de 2023 avançou de 6,90% para 7,18%.
A economista para Brasil do BNP Paribas, Laiz Carvalho, se mostra preocupada, em especial, com a dinâmica dos núcleos e com os sinais de persistência maior da inflação diante de uma inércia que pode ser mais alta. Esses apontamentos reforçam a avaliação do banco de que o IPCA deve fechar o ano em 10%.
“E, dado que as pressões da inflação estão para cima, que a inércia continua mais alta e que continuamos vendo os núcleos com performance acima da expectativa do mercado, achamos que não vai ter como o BC parar de subir juros tão rapidamente”, diz Carvalho. O BNP Paribas continua a esperar que a Selic encerre o ciclo em 14,25%.
Fonte: Valor Econômico

