Empresas do varejo e da indústria estão usando ferramentas de IA desenvolvidas por startups brasileiras para gerenciar estoque e administrar descontos
Por Daniela Braun e Natália Flach — De São Paulo
07/02/2024 05h01 Atualizado há 3 horasPresentear matéria
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_63b422c2caee4269b8b34177e8876b93/internal_photos/bs/2024/q/W/vDskebSva3mJlzxith4w/foto07emp-201-iavarejo-b3.jpg)
Algoritmos de inteligência artificial (IA) criados por startups brasileiras ajudam varejistas e fornecedores a elevarem suas vendas, ampliando a variedade de itens em oferta, reduzindo desperdícios e falta de produtos em prateleira.
Em março do ano passado, a rede de supermercados St. Marché iniciou um teste com a ferramenta de aprendizado de máquina (“machine learning) da brasileira Aravita para ajustar o fluxo de pedidos e reduzir as perdas de frutas, legumes e verduras (FLV). A categoria gera 15% do faturamento do grupo Hortus, controlador do St. Marché e do Empório Santa Maria. Segundo a empresa, a receita somou R$ 1,3 bilhão, em 2023, alta de 4,8%, em base anual.
O modelo de previsão de demanda por IA, realizado com 12 itens de 11 do grupo, sendo uma do Empório Santa Maria, ajudou a empresa a reduzir o índice de quebra de fornecimento dos itens analisados entre 50% e 100%, diz Eliane Souza Nascimento, diretora de cadeia de mantimentos do St. Marché, ao Valor. Ela diz que o índice médio de perdas do grupo em FLV é de 13%, atualmente.
“O fato de não conseguirmos prever a demanda de FLV com exatidão, gerava tanto a falta de produtos em loja como o excesso de mercadorias altamente perecíveis, uma situação problemática para todo o varejo, que envolve a cadeia inteira de distribuição desse tipo de produto”, diz Nascimento. “O cenário era de caos”.
Nos próximos seis meses, a St. Marché pretende implantar a ferramenta da Aravita em suas 33 lojas, para toda a seção de frutas, legumes e verduras – são de 800 a 1.000 itens únicos (SKUs), dependendo da loja.
Entre as variáveis analisadas pela IA desenvolvida pela startup estão dados meteorológicos, que afetam as safras dos produtos, histórico de demanda de itens por loja, alterações no trânsito local, incidentes nas lojas e o índice de perdas no transporte dos produtos. “As perdas acontecem desde o produtor, com desperdícios no transporte e até na loja, gerando não só um impacto financeiro como uma questão social do desperdício de alimentos que poderiam estar apropriados para o consumo”, diz a diretora.
Outra métrica importante de resultado para o grupo é elevar a frequência de clientes nas lojas e, consequentemente, as vendas.
A IA generativa também deve embarcar na ferramenta da Arteris, nos próximos seis meses, assim como o reconhecimento de imagens dos produtos nas gôndolas pelos algoritmos. “A IA generativa facilitará a interação do funcionário com o software na realização dos pedidos”, explica Marco Perlman, diretor-presidente e co-fundador da startup.
Em vez de digitar a descrição, o código do produto e o volume do pedido, por exemplo, o coordenador da área de frutas, legumes e verduras da loja pode mandar um áudio para a ferramenta informando que “o tomate está feio” e que precisa “comprar dez quilos de tomate”, ilustra Perlman.
A inovação é poder sugerir um produto que a farmácia nunca havia comprado na vida e o produto vender bem”
— Gustavo Ioschpe
Além do grupo Hortus, donmo do St Marché. a Aravita testa sua IA na gestão da cadeia de alimentos frescos de uma rede de supermercados da região Sul.
A inteligência artificial também tem colaborado para elevar as vendas da indústria farmacêutica e de farmácias no país.
O grupo farmacêutico NC Farma adotou a ferramenta de IA da startup Big Data para aprimorar ofertas e descontos em 300 medicamentos da Germed Pharma junto a 40 mil farmácias.
“Nosso maior desafio é levar um portfólio mais amplo de produtos aos clientes”, diz Cauê Nascimento, diretor executivo da NC Farma, responsável pela unidade de medicamentos genéricos. “A IA sugere um portfólio de itens que faz sentido à farmácia e conseguimos oferecer descontos mais específicos para cada estabelecimento”, observa o executivo. Com a ferramenta, a empresa conseguiu elevar em 50% as vendas de medicamentos da Germed, ele informa.
Até o fim do ano, o grupo pretende inserir cerca de 1.000 itens das linhas EMS, Legrand e Novaquímica na ferramenta, duplicando o alcance para 80 mil farmácias. “A beleza do projeto é levar uma tecnologia como a inteligência artificial ao alcance do pequeno varejo farmacêutico”, comenta o executivo. Outro plano é inserir a IA nos tablets usados pelos representantes de vendas, em campo.
Para a Kimberly-Clark, a ferramenta adotada em fevereiro de 2022 elevou as vendas e a variedade de produtos nos estabelecimentos, reduzindo produtos em falta nas prateleiras das farmácias. “O abastecimento das lojas tem muitas complexidades envolvidas, como a demanda por diferentes tamanhos, segmentos ou formatos das nossas fraldas Huggies, por exemplo, além das oportunidades de atender ao consumidor com itens adicionais que eles estão buscando, mas podem não encontrar”, detalha Marcelo Khan, diretor de excelência comercial da Kimberly-Clark para a América Latina. “Isso gera um melhor abastecimento e mais vendas, trazendo uma melhor distribuição, por exemplo, de tamanhos de fraldas, cremes de assadura, lenços umedecidos e outros itens da linha Huggies”.
Desde o início do projeto, o executivo nota que as farmácias que adotam os pacotes de produtos sugeridos pelo algoritmo chegam a vender cerca de 70% mais do que estabelecimentos que não usam o recurso. “A vantagem da adoção da inteligência artificial é que o algoritmo consegue identificar tendências antes mesmo de podermos explicá-las”, nota Khan.
A ferramenta de aprendizado de máquina da Big Data, usada pela NC Farma e pela Kimberly-Clark, adota 17 mil variáveis de dados para sugerir pacotes de produtos com maior potencial de vendas e descontos calculados de acordo com o perfil do estabelecimento.
“A inovação é poder sugerir um produto que a farmácia nunca havia comprado na vida e o produto vender bem”, afirma Gustavo Ioschpe, diretor-presidente da Big Data.
No ponto de venda, a IA é invisível, mas ao acessar e realizar novos pedidos pelos softwares dos distribuidores de medicamentos e outros produtos, o estabelecimento recebe telas com sugestões de pacotes com diferentes produtos, unidades sugeridas por produto e um desconto específico. “Sempre que uma farmácia aceita a recomendação, isso gera um lucro ao fornecedor, que é revertido em descontos”, explica Ioschpe. Com a nova mecânica, ele ressalta, “a forma de oferecer descontos substitui um padrão antigo, antes aplicado de forma geral, que era ineficiente para a indústria”.
Fonte: Valor Econômico