Há um efeito positivo pelo fato de o crescimento estar surpreendendo para cima em vários lugares do mundo, afirmou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, durante palestra na Associação Comercial de São Paulo nesta segunda-feira (4). “Nos Estados Unidos você teve uma convergência de juros [subindo] com crescimento surpreendendo para cima e no Brasil também. No Brasil a gente está vendo isso, uma surpresa de crescimento para cima e com a inflação convergindo (para a meta).”
Segundo Campos Neto, em quase todos os países há uma expectativa de queda de juros [nas próximas reuniões de política monetária]. “Em grande parte dos países desenvolvidos os juros não caíram ainda, enquanto o mundo emergente começou a cortar antes”, complementou.
Segundo Campos Neto, a projeção de queda de juros já foi mais intensa. “Acho que em parte pela contaminação dos Estados Unidos, onde se chegou a esperar que fosse já começar a cair os juros agora em março, mais isso se dissipou. No mundo emergente, as taxas de juros já vinham caindo e tem uma perspectiva de cair mais. Ao contrário de de crises no passado, dessa vez os países emergentes foram coordenados e conseguiram fazer uma política monetária relativamente antecipada.
“Os paises desenvolvidos mantiveram os juros nas últimas reuniões de política monetária. Em grande parte do mundo, os os juros ainda estão perto do máximo ou no máximo dos últimos anos, ponderou Campos Neto. “Apesar disso, quando a gente olha o mercado futuro, as as curvas estão projetando uma queda de juros à frente. Mas o que a gente vê é que nesse nesse ambiente, mesmo com um adiamento [na expectativa de corte nos EUA], os mercados estão relativamente bem comportados. A bolsa americana está no máximo, a parte de crédito privado também.”
No pós-pandemia, houve não apenas queda de juros em vários países no mundo, mas incentivos fiscais, afirmou Campos Neto. “Os programas de incentivos, coordenandos com grande esforço monetário, fizeram que o que poderia ser uma depressão fosse uma recessão até menor do que se esperava, mas isso teve um efeito colateral de inflação em vários países”, explicou o dirigente.
Após um processo coordenado de subida de juros no mundo, “a inflação vem caindo globalmente”. Segundo Campos Neto, nos núcleos de inflação, que desconsideram preços mais voláteis como de alimentos e energia, “a queda tem sido bem mais lenta e os núcleos ainda estão bastante altos”.
O Brasil, continuou Campos Neto, “foi um dos países onde teve a queda dos núcleos mais acentuada e, apesar de ainda estarem acima da meta, estão em processo de convergência”.
Conforme o presidente do BC, “todos os países tiveram surto inflacionário a partir do meio de 2020 e 2021 e, depois de um primeiro momento de rápida desinflação, a velocidade de queda de preços começou a diminuir”.
Um dos fenômenos do pós-pandemia em grande parte dos países do mundo foi uma geração de emprego muito forte, afirmou Campos Neto, durante a palestra. “Teve uma mudança estrutural, e a gente vê que a taxa de desemprego caiu rapidamente no Brasil e surpreendeu bastante.”
O desemprego também está baixo em outros países, ponderou Campos Neto. “O desemprego está bem baixo nos Estados Unidos, na Austrália e em grande parte da Europa. Então isso faz com que você tenha uma atenção especial para a inflação de serviços, porque [essa inflação] é intensiva em mão de obra. Na inflação mundial, a parte de serviços está bastante alta.”
O governo tem condições de apresentar um número fiscal melhor do que o mercado tem esperado, afirmou Campos Neto.
“Existe uma diferença grande entre a previsão do mercado e a meta do governo. Por exemplo, para 2024 a meta é zero e o mercado acha que vai ser um déficit de 0,8% [do PIB]. Para 2025, governo diz que vai ser [um superávit de] 0,5% e o mercado, acho que será -0,6%. E para 2026, o governo diz que vai ser [superávit de] 1% e o mercado acha que é -0,4%. Eu acho que, como o mercado já tem um número para 2024 bastante ruim, há chance de a surpresa ser para melhor.”
Os problemas estruturais da economia da China estão no radar de riscos dos bancos centrais. Segundo Campos Neto, “tem sido bastante difícil avaliar a China”.
Conforme o dirigente, “a China realmente preocupa bastante e a gente tem tentado olhar no detalhe”.
Na visão de Campos Neto, “ao contrário de grande parte dos países, na China, os imóveis são muito importantes como riqueza das famílias”.
De acordo com o presidente do BC, “73% da riqueza das famílias chinesas são imóveis”. Quando há uma queda no preço de imóveis ocorre um efeito de os chineses sentirem “um diferencial [negativo] grande na riqueza e, geralmente as pessoas respondem parando de consumir”.
Para Campos Neto, “o grande questionamento é, se as vendas estão caindo muito, se novas construções estão caindo muito, por que que o preço de imóveis não caiu?” O dirigente ponderou que “em qualquer país do mundo, onde as vendas caem mais de 30% e os investimentos caem mais de 60%, é difícil que o preço dos imóveis fique mais ou menos parado”. Mas, questionou o chefe do BC, o que que aconteceria se preço de imóveis começasse a cair? “Muito provavelmente você tem uma resposta no consumo, porque se você está vendo o seu patrimônio cair, você responde consumindo menos”, pontuou.
Outro ponto, explicou o presidente da autoridade monetária, “é que a China está fazendo uma mudança no seu modelo de crescimento, deixando um crescimento baseado em construção e infraestrutura para um mais baseado em consumo, na dinâmica interna”. O problema, acrescentou Campos Neto, é que, “se você tem um ajuste de salários ou um ajuste de de patrimônio, obviamente isso coloca muitas dúvidas [sobre a sustentabilidade do ritmo de crescimento na China]”, então é um tema que estamos ohando de perto”.
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Roberto Campos Neto, presidente do BC — Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Fonte: Valor Econômico

