Por Brooke Masters — Financial Times
27/05/2022 05h03 Atualizado há 4 horas
O marketing confuso dos produtos financeiros com alegada preocupação climática ameaça enfraquecer a confiança nos investimentos guiados por fatores ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em inglês), segundo grandes gestores de fundos que defendem a necessidade de padrões de regulamentação mais claros.
Até recentemente, a grande valorização dos ativos que se saíam bem em fatores ESG, como as fontes de energia “verdes” e as empresas de tecnologia com baixa pegada de carbono, tornava fácil para o gestor de ativos prometer aos clientes que eles poderiam salvar o mundo e, ao mesmo tempo, ficar ricos.
Essa dinâmica, porém, foi alterada pela onda de queda das ações de tecnologia e pelo grande salto nas cotações das companhias de combustíveis fósseis, impulsionado pela invasão da Ucrânia pela Rússia. Os investimentos que priorizam atingir a meta do Acordo de Paris sobre o clima, de manter o aquecimento global abaixo de 1,5° C, não são mais um caminho garantido para se conseguir um desempenho imediato superior ao dos referenciais do mercado, se é que alguma vez o foram.
Gestores de ativos experimentados dizem que isso coloca sobre seu setor o ônus de ser muito mais claro sobre como exatamente seus fundos ESG atuam. Enquanto alguns se valem dos fatores ambientais para ajudar a identificar oportunidades de ganhar dinheiro, outros se dedicam a evitar ativamente empresas de alta emissão de carbono ou a investir proativamente para impedir as mudanças climáticas.
“Temos que ser muito honestos com nossos clientes sobre o impacto em seus retornos no curto e médio prazo”, disse Eugenia Unanyants-Jackson, chefe de ESG da PGIM, que administra US$ 1,5 trilhão. “É totalmente plausível que, num horizonte de tempo de 10 ou 15 anos, os fundos ESG tenham um desempenho tão bom ou melhor [do que os fundos padrão], mas você precisa de um horizonte de tempo longo o suficiente e de uma massa crítica de investidores fazendo a mesma coisa.”
Dentro do setor, as três abordagens diferentes são conhecidas como “investimento influenciado por ESG”, “investimento de exclusão” e “investimento de impacto”. E elas podem levar a resultados bastante diferentes ao longo dos períodos normalmente levados em conta para comparar o desempenho, de um, três e cinco anos.
“É realmente importante, enquanto você desenvolve produtos e os comercializa, garantir que os clientes entendam qual é o objetivo e o que você fará para atingir esse objetivo”, diz Carolyn Weinberg, chefe global dos produtos iShares e da área de investimentos em índices na BlackRock. “Alguns clientes vão incorporar [alguns] elementos ESG em sua estratégia de investimento […]. Separadamente, há clientes que desejam alinhar seus investimentos com seus valores.”
Na Pimco, a gigante dos fundos de títulos de dívida, o diretor de investimentos de renda fixa, Andrew Balls, administra tanto um fundo de bônus globais padrão quanto um descrito especificamente como ESG. Ambos os fundos levam em conta fatores ambientais em sua busca por retorno, o chamado “alfa”, mas o ESG também almeja causar um “impacto ambiental e social positivo”, deixando fora de sua carteira de investimentos algumas empresas que se saem particularmente mal em questões ESG ou que não vêm melhorando.
“Aqui, você deve ser modesto quanto ao que promete. Se você se restringe em algo [no que poderia investir], isso afeta os retornos. Se você tem uma maneira de gerar alfa, você a usa em todos os fundos”, disse Balls. O fundo GIS da Pimco de bônus globais ESG está em queda de 7,82% em 2022, desempenho um pouco pior que o do fundo GIS normal de bônus globais da Pimco, que acumula queda de 7,56% no ano.
A mudança das demandas relacionadas às questões ESG também pressiona os gestores de fundos a ser mais explícitos sobre a forma como levam em conta as resoluções dos acionistas relacionadas a ESG. A BlackRock, que tem sido uma forte defensora da inclusão do risco climático nas decisões de investimento, advertiu neste mês que votaria contra a maioria das resoluções dos acionistas sobre questões climáticas neste ano.
A maior firma gestora de recursos do mundo, com cerca de US$ 10 trilhões, foi criticada por ativistas climáticos por informar que não apoiaria resoluções almejando interromper o financiamento a projetos de combustíveis fósseis ou forçar o descomissionamento de ativos de alta emissão de carbono. “Não as consideramos consistentes com os interesses financeiros de longo prazo de nossos clientes”, escreveu a equipe de gerenciamento.
O anúncio, porém, se aplica só aos ETFs (fundos negociados em bolsa como se fossem uma ação) e aos fundos mútuos comuns da BlackRock. Os fundos de impacto, que são encarregados por seus investidores de priorizar as metas climáticas, podem votar e votam separadamente, segundo Weinberg.
Alguns gestores de fundos dizem que mal-entendidos com os investimentos ESG são um problema particularmente maior nos EUA, pois a lei americana exige de forma específica que os assessores atuem no melhor interesse financeiro de seus clientes. Eles temem que clientes aplicando em algum fundo que exclui determinados investimentos possam, depois, ficar insatisfeitos com o desempenho resultante.
“Você precisa fazer a pergunta: ‘Por que você os excluiu?’ Se seu parecer foi que os interesses financeiros do beneficiário ficariam comprometidos por detê-los, então tudo bem. Mas se você os excluiu porque não eram coerentes com a obtenção do carbono zero até 2050 ou algo assim, então você terá um problema se for processado”, disse Chris Donahue, executivo-chefe da Federated Hermes, que tem US$ 631 bilhões sob gestão.
Na Europa, é mais provável que o problema venha de outra frente, segundo executivos de fundos, já que há clientes expressando descontentamento por seus gestores de ativos não estarem fazendo o suficiente para que as metas de Paris sejam alcançadas. Tais receios ganharam mais força recentemente quando o chefe global de investimento responsável do HSBC, Stuart Kirk, argumentou em conferência do “Financial Times” que há um exagero na forma como se veem os riscos financeiros das mudanças climáticas. Ele já foi suspenso pelo banco.
Donahue e vários outros executivos de fundos deram boas-vindas aos planos da Securities and Exchange Commission (SEC, a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA) de intervir nessa área. Nesta semana, a agência fiscalizadora propôs regras que exigirão a divulgação de mais informações sobre a maneira como os fundos incorporam as questões ESG ao investimento e como votam nas assembleias anuais das empresas nas quais investem. A SEC também aplicou pela primeira vez os termos das leis existentes contra um gestor de fundos acusado de distorcer e omitir informações sobre critérios ESG em fundos mútuos que administrava, multando o BNY Mellon em US$ 1,5 milhão.
Alguns no setor, contudo, temem que a SEC imponha regras demasiado simplistas, que não levem em conta a ampla variedade de maneiras pelas quais os investidores querem incorporar em seus portfólios investimentos com preocupação climática.
“Pessoas diferentes levam em conta fatores diferentes, de forma diferente. Não há problemas em ter diferentes opiniões ao mesmo tempo”, disse Weinberg, da BlackRock. “Os padrões não significam que todos devem usar a mesma métrica.”
Fonte: Valor Econômico

