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As mensagens mais conservadoras do diretor de política monetária do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, disseminaram a percepção entre participantes do mercado de que o presidente Lula deu carta branca para uma eventual subida da Selic, contribuindo para queda do dólar, alta da bolsa e retirada de prêmios de risco da curva de juros.
Galípolo vem dando indicações, nos últimos dias, de que a autoridade monetária voltou a ter à disposição os seus dois principais instrumentos de política econômica: os juros, para levar a inflação à meta; e as intervenções cambiais, para garantir o bom funcionamento do mercado. O dólar registrou queda pelo sexto pregão seguido ontem, fechando em R$ 5,45. A bolsa chegou aos 132.430 pontos, maior nível desde de 8 de janeiro.
Mas fontes de mercado ouvidas pelo Valor dizem, de forma reservada, que a consolidação desses ganhos só ocorrerá se o que hoje é apenas uma percepção – de que não há veto do presidente Lula para uso dos juros – se mostrar verdadeira. Ou seja, se de fato o BC cumprir o sinalizado conservadorismo nas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom).
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“O mercado deu uma nova chance ao BC, depois que a divisão no Copom de maio deu a impressão de que havia interferência política”, diz um ex-diretor do BC, que hoje participa da gestão de um grande fundo de investimento.
A disparada do dólar nos últimos meses foi causada, em parte, por receios de interferência política no BC. Em 8 de maio, quando quatro membros indicados por Lula votaram por uma baixa mais forte de juros, o dólar estava em R$ 5,09. Na semana passada, chegou a R$ 5,76, no fechamento.
O recuo veio na terça-feira da semana passada, com a ajuda da ata mais conservadora do Copom. O documento saiu num dia em que melhorou o cenário internacional, com queda do risco de recessão nos EUA e sinais de que o Japão irá mais devagar na normalização de sua política monetária.
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“A queda do dólar mostra que, em muitos aspectos, o problema estava na falta de credibilidade da política monetária”, diz um ex-dirigente do BC, que comandou as mesas de juro e câmbio.
As declarações de Galípolo aprofundaram essa tendência. Primeiro, ele deu indicações de que está na ala com visão mais conservadora no Copom, que colocou a hipótese de aperto de juros. Desde segunda, Galípolo tem dado indicações de que o BC pode intervir no câmbio, se o mercado ficar disfuncional
“Vimos um processo significativo de deterioração das expectativas de inflação devido às questões fiscais e a uma diminuição da credibilidade do BC quanto ao compromisso com a meta de inflação. A questão fiscal não mudou muito, mas acho que o BC tem mudado bastante a linguagem para mostrar um comprometimento maior com a meta”, diz Gustavo Pessoa, sócio da Legacy Capital.
“A sinalização é muito importante para reduzir prêmio”, afirma o gestor. “O descolamento das projeções em relação à meta é alto, mas não tão alto que não possa ser resolvido. Apesar do comunicado não ter sido duro, a ata foi nesse sentido e mostrou que vários diretores enxergam o balanço de riscos assimétrico. E, a partir daí, as falas mais recentes dos dirigentes, principalmente do Galípolo, que é lido como o próximo presidente, reforçam o processo de ganhar credibilidade.”
Pessoa acredita que o porta-voz desse processo ter sido Galípolo foi um acerto do BC. “Dito isso, a nossa interpretação dessa sinalização é a de que o Copom deverá subir os juros na próxima reunião”, afirma o profissional da Legacy, ao dizer que é a expectativa de aperto tem estabilizado o real, além de promover uma queda da inflação “implícita” e fazer as expectativas inflacionárias pararem de piorar no Focus.
“É importante que esse processo de ganho de credibilidade do BC seja liderado pelo Galípolo, justamente porque ele provavelmente será o próximo presidente. Esse processo tem mais legitimidade em termos de expectativa sendo comandado pelo Galípolo. No entanto, não adianta só falar mais duro. Ele terá de agir, ou então [o mercado] volta a piorar. Ele terá de entregar a postura que está prometendo para, de fato, ter credibilidade”, enfatiza Pessoa.
Na visão do gestor de renda fixa da Vinland Capital, Maurício Bernardo, foi importante que Galípolo tenha reforçado o tom conservador da última reunião do Copom. E, diante desse cenário, a visão da casa é que há uma “alta probabilidade de início de um ciclo de subida de juros na reunião de setembro”. Para a Vinland, um ciclo de 1,5 ponto a 2 pontos percentuais de aperto “parece razoável para as projeções convergirem para a meta no horizonte”.
No entendimento de Bernardo, a melhora dos ativos locais nos últimos dias foi bastante impactada pela mensagem conservadora do BC e da anuência de Galípolo a essa comunicação. “Acho que o comitê não pode se deixar levar por esse comportamento recente do mercado, que ele mesmo produziu. Esse ambiente foi gerado em decorrência da fala mais dura. Portanto, é importante esse início de aperto em setembro para ganhar ainda mais credibilidade”, defende.
Caso esse cenário não aconteça, a percepção de Bernardo é que a melhora seria revertida “e, possivelmente, com mais força ainda”. “Há risco de perder toda a credibilidade que foi conquistada. As expectativas, que vêm piorando há alguns meses, e não da última reunião para cá, indicam que cabe o aperto monetário. Restaurar essa credibilidade é muito importante. E isso vai ser possível a partir de um ciclo se iniciando agora, tendo em vista que você já conseguiu embarcar todo o comitê nessa proposta de reancoragem.”
Na avaliação do estrategista-chefe da AZ Quest, André Muller, as falas de Galípolo denotam um ambiente de maior normalidade, o que não era contemplado nos preços. “As expectativas ainda estão desancoradas, mas as atitudes têm sinalizado um ambiente de maior normalidade em relação à política monetária e que é compatível com a tomada de decisões técnicas no futuro.” Para Muller, caso esse movimento de recuperação da credibilidade continue ocorrendo nas próximas semanas, eventualmente uma elevação da Selic poderia ser evitada.
“É um jogo e não dá para saber, ainda, qual vai ser a atitude tomada pelo BC. O que dá para antecipar é que ele vai tomar a decisão que for melhor para recuperar sua credibilidade. Se o Copom entender que a reação das expectativas de inflação ainda não foi como a esperada, pode aumentar os juros como maneira de demonstrar maior comprometimento com a meta de inflação. Ou podemos chegar ao Copom e a alta não ser mesmo necessária. Vai depender de outros fatores, como o comportamento da inflação e de seus condicionantes”, afirma.
Fonte: Valor Econômico

