Por George Steer — Financial Times, de Londres
23/11/2023 05h03 Atualizado há 5 horas
Os fundos hedge que apostaram no declínio dos mercados de ações dos EUA e da Europa sofreram perdas estimadas em US$ 43 bilhões em razão da forte alta das ações nos últimos dias.
Os vendedores a descoberto (“short sellers”), muitos dos quais fizeram apostas contra empresas expostas a custos de captação mais altos ao longo do último ano, foram apanhados por uma recuperação “dolorosa” das ações de “baixa qualidade” neste mês, disse o chefe de estratégia para ações europeias do Barclays, Emmanuel Cau. Isso ocorre num momento em que o mercado ficou mais confiante de que o ciclo de alta de juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) acabou.
A alta das ações, que deixou o índice S&P 500 de Wall Street a caminho do melhor mês desde julho de 2022, foi desencadeada pela recente relutância do presidente do Fed, Jerome Powell, em apertar ainda mais a política monetária, quando manteve as taxas no início do mês.
Dados mais baixos que o esperado sobre a inflação ao consumidor nos EUA, divulgados na semana passada, deram impulso adicional às ações, levando o S&P 500 e o Nasdaq a seus melhores dias desde abril.
Analistas disseram que a alta desencadeou um brutal “short squeeze”, corrida em que alguns fundos hedge recompraram ações para cobrir suas apostas negativas, o que ajudou a impulsionar os preços das ações ainda mais.
“Foi um mercado muito complicado neste ano, mas esse ‘short squeeze’ realmente está destruindo o desempenho de fim de ano para muitos fundos”, disse Cau. “Ninguém conseguiu lucrar com a alta de ações de baixa qualidade”.
“O alívio nas condições financeiras de outubro pode ter causado algumas ondas de alta de vida curta”, disse Barry Norris, diretor de investimentos da Argonaut Capital, referindo-se à alta das ações de menor qualidade.
Os fundos sofreram perdas de US$ 43,2 bilhões em apostas a descoberto nos EUA e na Europa, de 14 a 17 de novembro, segundo cálculos do grupo de dados S3 Partners, que não levam em conta os ganhos que os fundos possam ter obtido em outras ações que possuem.
Apostas contra ações de tecnologia, saúde e consumo foram algumas das mais custosas para os fundos hedge, conforme dados da S3. Uma alta de 14%, desde a semana passada até segunda-feira (20), no preço das ações da empresa de cruzeiros Carnival, por exemplo, custou aos short sellers de fundos hedge US$ 240 milhões.
Índices que acompanham ações alvos de muitas vendas a descoberto se recuperaram rapidamente das mínimas recentes à medida que o sentimento de mercado melhorou rapidamente. O índice “Very Important Short Position” do Goldman Sachs, que acompanha os 50 integrantes do S&P 500 com maior valor total em dólares em posições vendidas, está a caminho de seu melhor mês desde outubro de 2022.
A cesta de ações mais vendidas a descoberto do Barclays na Europa subiu 9,9% nas últimas três semanas, rumo a seu maior ganho mensal em ao menos dez anos, mostraram dados da Bloomberg.
A empresa imobiliária sueca Samhällsbyggnadsbolaget (SBB), com altas vendas a descoberto de suas ações, está entre os grupos que geraram perdas para os fundos hedge nos últimos dias. Embora suas ações tenham despencado cerca de 75% em 2023, proporcionando grandes ganhos aos vendedores a descoberto, ela se recuperou cerca de 35% na semana até segunda. Isso afetou fundos como Samlyn Capital, Balyasny e Arrowstreet Capital, de acordo com divulgações regulatórias e análises do grupo de dados Breakout Point.
Enquanto isso, a Castellum, cujas ações foram vendidas a descoberto pela Two Creeks Capital, Arrowstreet e pela Fosse Capital, subiu 16% neste mês.
A terça-feira (14), quando os dados de inflação dos EUA foram divulgados, foi um “dia de aperto”, disse Brian Heavey, um operador de ações no J.P. Morgan, que escreveu em nota a investidores que fundos hedge macro estavam “maciçamente vendidos a descoberto” em grupos de bens de consumo devido a sua vulnerabilidade a juros mais altos. Como resultado, o setor registrou “ganhos maciços” durante a alta generalizada em novembro, acrescentou Heavey.
Outros setores sensíveis a juros reagiram do mesmo modo. As ações das empresas de energia verde dos EUA Fuelcell Energy e Sunrun – que caíram neste ano e continuam alvo de vendas a descoberto – dispararam 20% na terça.
A rápida reversão nos mercados tem sido particularmente difícil para os fundos hedge especializados em acompanhar tendências, conhecidos como consultores de negociação de commodities (CTAs, na sigla em inglês, que usam algoritmos e métricas rigorosas de gerenciamento de risco para explorar padrões de mercado nos mercados futuros globais.
Muitos têm sofrido diante da mudança de direção dos mercados e começaram a precificar cortes adicionais nas taxas no próximo ano.
“Você tem uma espécie de colapso da inflação […] e todas essas posições vendidas nessas empresas que são realmente suscetíveis a taxas mais altas se veem diante dessa onda de alta”, disse Charlie McElligott, estrategista na Nomura.
Os CTAs estão em baixa de 3,7% em média neste mês, segundo o grupo de dados HFR, o que os deixa com uma baixa de 2,6% no ano. Uma carteira modelo administrada pelo Société Générale, que visa replicar as posições normalmente adotadas pelos seguidores de tendências orientados por computação, mostra perdas em todas as classes de ativos no mês.
No entanto, os modelos do Barclays sugerem que mesmo agora os CTAs permanecem vendidos a descoberto liquidamente, tanto em ações quanto em títulos. “Então, taxas [de juros] para baixo e ações para cima continuam sendo uma operação dolorosa”, disse Cau.
“Estou surpreso que as pessoas não tenham sido muito dinâmicas em reverter parte de suas operações que apostavam em ‘juros altos por mais tempo’”, disse McElligott. Os fundos hedge perderam com os ganhos do mercado de ações de novembro de “maneira brutal”, acrescentou.
Fonte: Valor Econômico

