Os partidos de centro e de esquerda da França corriam contra o tempo nesta segunda-feira (01) para impedir a chegada ao poder do Reunião Nacional (RN), apesar da vitória do partido de extrema direita no primeiro turno das eleições parlamentares.
Os nomes de centro e de esquerda que se opõem ao RN têm até terça-feira (2) para decidir se retiram candidatos de centenas de segundos turnos eleitorais, após terem chegado a um acordo de cooperação eleitoral limitada contra o partido de Marine Le Pen.
Leia mais: Entenda as eleições antecipada na França
O índice Cac 40, referencial das ações da França, subia 1,6% nesta segunda, com os investidores apostando que o segundo turno no próximo fim de semana negaria à extrema direita ou à extrema esquerda uma maioria na Assembleia Nacional. O euro valorizou-se 0,3%, cotado a US$ 1,075
A RN foi a mais votada no primeiro turno das eleições de domingo, com 33,2% dos votos, à frente da Nova Frente Popular (NFP) de esquerda, com 28%, e da aliança Juntos, do presidente Emmanuel Macron, com 22,4%.
O resultado teve o impacto de um terremoto político, e as projeções indicam que o RN ainda ganhará a maioria dos assentos no segundo turno. Por outro lado, sua porcentagem de votos combinada à de seus aliados foi menor do que algumas pesquisas de opinião pública previam na semana passada.
“O resultado é provavelmente melhor do que se temia, mas não tão bom quanto a situação de três semanas atrás, antes das eleições”, disse Mohit Kumar, analista do banco de investimento Jefferies.
A diferença entre os custos de captação dos bônus de dez anos da França e os da Alemanha, considerada um termômetro do risco para os investidores que detêm os títulos franceses, diminuiu na segunda-feira para 0,75 ponto percentual, após ter atingido na semana passada o nível mais alto desde a crise da dívida da região do euro em 2012.
Os candidatos do Juntos e da NFP que terminaram em terceiro lugar em seus distritos estão agora sob intensa pressão para desistirem da disputa para não dividirem o eleitorado contrário ao RN no segundo turno da eleição, em 7 de julho.
O primeiro turno resultou em mais de 300 segundos turnos entre três candidaturas, de acordo com cálculos do “Financial Times”, um número sem precedentes, embora o quadro final dependa de quantos candidatos vão se retirar da disputa.
“A lição desta noite é que a extrema direita está prestes a tomar o poder“, disse em discurso o primeiro-ministro de Macron, Gabriel Attal, que se depara com a possibilidade de ser destituído. “Nosso objetivo é claro: impedir que a RN tenha uma maioria absoluta no segundo turno e governe o país com seu projeto desastroso.”
Segundo cálculos do “FT”, com quase todos os distritos contabilizados, a RN terminou em primeiro lugar em 296 das 577 circunscrições eleitorais, enquanto a NFP liderou em 150 e a Ensemble em 60. Haverá cerca de 65 com a RN e a NFP em segundo turnos com duas candidaturas. Um partido precisa de 289 assentos para uma maioria.
Na noite de domingo (30), todos os partidos da esquerdista NFP — desde a extrema esquerda da França Insubmissa (LFI) até os mais moderados, Socialistas, Verdes e Comunistas — comunicaram que se retirariam das corridas nas quais seu candidato estava em terceiro lugar.
No entanto, os partidos da aliança Juntos, de Macron, divulgaram orientações um pouco diferentes, o que criou confusão.
O partido Renascimento, de Macron, informou que tomaria decisões caso a caso com base na compatibilidade dos candidatos de esquerda “com os valores republicanos”, mas não excluiu especificamente a LFI.
O ex-primeiro-ministro Édouard Philippe disse que seu partido, o Horizontes, instruiria os candidatos a se retirarem apenas em disputas sem representantes da LFI. “Considero que nenhum voto deveria ser dado a candidatos da RN ou da LFI, com as quais diferimos, não apenas nos programas, mas em valores fundamentais”, disse Philippe.
Armin Steinbach, professor de direito e tributação da escola de administração HEC Paris, disse que “o resultado mais provável na próxima semana é uma maioria relativa para a RN, não uma absoluta”.
“Se a França for ameaçada por turbulências de mercado, a RN — diferentemente da extrema esquerda — será capaz de se adaptar muito rápido, pois é menos ideológica em política econômica do que em política de identidade”, disse Steinbach.
Os mercados de ações e títulos da França tiveram fortes quedas depois da convocação de eleições antecipadas por Macron há três semanas, em razão do temor dos investidores quanto a uma possível vitória da extrema direita ou um impasse político em que forças populistas dominariam o Parlamento após o segundo turno da votação em 7 de julho.
Em muitos casos em eleições anteriores de segundo turno, os eleitores franceses se inclinaram para a criação de uma chamada frente “republicana” — para impedir a chegada da RN ao poder, votaram em candidatos que normalmente rejeitariam. Não se sabe, porém, se tais costumes eleitorais ainda se manteriam, dado o grau de ascensão da extrema direita.
O chefe do partido Socialista, Olivier Faure, criticou Macron e lembrou que ele foi ajudado duas vezes pelos eleitores de esquerda para derrotar o RN na disputa pela presidência. “Isso continua confuso, muito confuso, de um presidente que se beneficiou dos seus votos em 2017 e 2022”, disse Faure, em um comício da NFP.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_63b422c2caee4269b8b34177e8876b93/internal_photos/bs/2024/Y/G/YcUlZbSFa7aNBPL6LcEg/ap24180500946139-1-.jpg)
Num sinal de que o campo de Macron tenta atrair novos aliados, Attal anunciou a suspensão da reforma do sistema de desemprego que entraria em vigor na segunda-feira. A esquerda se opôs à mudança porque reduziria o tempo em que os requerentes recebem os benefícios.
No domingo (30), Le Pen disse que os resultados do primeiro turno “praticamente apagaram” o bloco de centro de Macron. “Os franceses expressaram seu desejo de virar a página dos sete anos de um governo que os tratou com desdém”, disse a apoiadores em sua região eleitoral, em Hénin-Beaumont, no Norte da França.
Se a RN ganhar a maioria, Macron seria forçado a governar com um incômodo arranjo de compartilhamento do poder, no qual Jordan Bardella, de 28 anos, um protegido de Le Pen, seria o primeiro-ministro.
Desde 1958, houve três casos de “coabitação” na França, mas nunca entre partidos e líderes com visões tão contrastantes.
De acordo com Mathieu Gallard, do instituto de pesquisas Ipsos, a obtenção de uma maioria absoluta pelo RN dependerá em grande medida da força da frente republicana e de qual será o número de eleitores de esquerda e de centro cuja prioridade será impedir a vitória do partido de Le Pen.
Steeve Briois, um alto funcionário da RN, descartou a ideia de que manobras táticas ou os serviços de orientação de voto os impediriam de vencer.
“[Que] os outros partidos precisem convocar uma frente anti-RN — isso, na verdade, apenas enerva as pessoas e as motiva a votar em nós”, disse Briois ao “FT” em Hénin-Beaumont. “O teto de vidro, a ideia de uma frente republicana — isso não funciona mais.”
Fonte: Valor Econômico

