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A reação imediata muito positiva dos mercados aos números mais fracos da inflação ao consumidor americano em abril, divulgados na semana passada, deu lugar a uma postura mais cautelosa em Wall Street nos últimos dias de negócios. Embora o dado tenha sido um alívio após três meses de preços surpreendentemente altos, a comunicação conservadora de dirigentes do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) desde então impediu que os investidores embarcassem em uma expectativa mais otimista para o caminho dos juros nos Estados Unidos.
Assim, os ativos em Nova York já não refletem o rali que se desenhava, à medida que tanto o mercado quanto os banqueiros centrais esperam mais sinais de que a política monetária está em um patamar suficientemente restritivo para que a inflação caia à meta de 2% com o tempo.
Logo após a divulgação do índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) na semana passada, os Treasuries – títulos do Tesouro americano – exibiram um forte alívio, que levou a taxa da T-note de 10 anos ao patamar de 4,34%, menor nível desde o começo de abril. Porém, a trégua durou pouco e os rendimentos subiram nas três sessões seguintes para a casa de 4,45%, mesmo nível exibido antes da divulgação do CPI.
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Ao mesmo tempo, o mercado passou a precificar maior chance de apenas um corte de 0,25 ponto percentual nas taxas de juros neste ano em vez de três. O consenso, no entanto, permanece sendo o de que o Fed vai reduzir os juros duas vezes até a reunião de dezembro do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês).
Para Bernardo Dutra, economista para Estados Unidos do Itaú BBA, a postura cautelosa do Fed é adequada mesmo depois do alívio com a inflação em abril. “Não está claro que a aceleração da inflação no primeiro trimestre é temporária. O Fed não pode comprar esse risco. Seria irresponsável relaxar o discurso agora”, diz ele, que espera o primeiro corte apenas em dezembro. O consenso do mercado é que o ciclo de flexibilização começará em setembro.
Desde a divulgação do CPI, até dirigentes que costumam ter orientação mais neutra quanto à política monetária, como o vice-presidente Philip Jefferson e o chefe da distrital de Nova York, John Williams, têm indicado que ainda não há espaço para pensar em cortes de juros. “Não vejo nenhum indicador que me diga, agora, que há uma razão para mudar a postura da política monetária”, afirmou Williams.
“O quanto do dano foi desfeito em abril é uma questão de perspectiva”, diz Jan Hatzius, economista-chefe do Goldman Sachs, ao comparar a inflação forte do primeiro trimestre com os dados do mês passado. Em relatório nesta semana, ele mantém a expectativa de um primeiro corte já em julho, mas com o segundo apenas na reunião de dezembro.
Segundo Dutra, um corte antes do quarto trimestre não é provável. Um único dado ruim de inflação no decorrer do ano, diz, já seria suficiente para impedir o Fed de reduzir a taxa básica. Além disso, Dutra argumenta que o CPI de abril não foi tão bom, já que indica um núcleo do índice de preços de gastos com consumo (PCE, na sigla em inglês) acima de 0,2% ao mês. O PCE é a medida de inflação preferida do Fed, e seu núcleo precisaria rodar abaixo de 0,2% por alguns meses para que os cortes comecem, na visão do economista.
Dutra afirma que as casas que esperam mais cortes do Fed neste ano projetam uma atividade mais fraca ou uma desaceleração mais rápida da inflação americana. É o caso do ING, que prevê cortes de 0,25 ponto nas três últimas reuniões do Fomc em 2024, em setembro, novembro e dezembro.
Para o economista-chefe internacional do banco holandês, James Knightley, uma inflação mensal consistentemente ao redor de 0,2%, números mais fracos de gastos com consumo e uma taxa de desemprego acima de 4% devem ser suficientes para o Fed cortar um pouco mais do que os mercados esperam. Porém, ele admite que o cenário é bastante incerto.
“Este tem sido um ano incrivelmente difícil para as expectativas sobre a taxa de juros”, afirma. Segundo Knightley, a mensagem dependente de dados do Fed tem sido “bastante consistente”, o que não deixa nada garantido para o futuro da política monetária.
O economista, contudo, argumenta que há “um claro risco” à postura conservadora do Fed – e, por consequência, à expectativa de corte mais contida do mercado – na possibilidade de uma desaceleração mais brusca da economia dos Estados Unidos, em especial do consumo. Ele cita, por exemplo, o esgotamento das poupanças que puxaram a força do consumo até o ano passado e taxas maiores de dívida com cartão de crédito diante do alto custo de empréstimos.
“Há uma pressão significativa se construindo. Há mais estresse surgindo no setor doméstico. Prevemos uma desaceleração nos gastos de consumidores”, diz Knightley. Ao mesmo tempo, embora não seja seu cenário base, ele admite a possibilidade de que o Fed sequer corte juros neste ano caso o consumo continue forte.
Em abril, as vendas no varejo americano surpreenderam o mercado ao ficaram estáveis em comparação com março, ante expectativa de alta de 0,4%. Boa parte dos analistas pondera que isso reflete principalmente fatores sazonais que impulsionaram artificialmente os números de março.
Dutra, do Itaú, não vê sinal de enfraquecimento brusco da economia americana no curto prazo. Ainda assim, desde que a inflação caia a um nível que o Fed considere consistente com o cumprimento da meta, é possível que os cortes venham mesmo com uma atividade forte. “O Fed quer evitar que a economia enfraqueça. Desde que não sobreaqueça, uma atividade forte não seria impeditivo. Mas [inflação fraca e atividade forte] são duas coisas que normalmente não andam muito juntas”, pondera.
Já Hatzius, do Goldman Sachs, diz que o menor aperto do mercado de trabalho americano é um direcionador mais importante para a política monetária do que o crescimento econômico. Uma desaceleração mais brusca do mercado de trabalho “provavelmente resultaria em uma flexibilização mais agressiva do Fed do que os dois cortes que projetamos”, diz.
Fonte: Valor Econômico

