Em sua última pesquisa sobre o tema, divulgada no começo de setembro, o BCE mostrou que as expectativas dos consumidores em relação à inflação aumentaram – para os próximos três anos, subiram para 2,4% em julho, ante 2,3% em junho, acima da meta de 2% -, elevando a perspectiva de que ainda há necessidade de mais altas nas taxas de juros.
Os “yields” (rendimentos) de títulos públicos da zona do euro deram um salto em resposta à divulgação dos números. O mercado monitora com atenção essas medidas, uma vez que elas são um item importante nos modelos de política monetária dos bancos centrais globais.
Levantamento do ING realizado com consumidores europeus em agosto concluiu que a maioria dos entrevistados em oito países da Europa não só espera que a inflação se mantenha elevada durante pelo menos mais três anos, mas também acredita que os bens continuem a ficar mais caros. Segundo o relatório, as famílias em toda a Europa estão preocupadas com o fato de a chamada “crise do custo de vida” ter vindo para ficar. A pesquisa foi feita com consumidores na Alemanha, Bélgica, Países Baixos, Espanha, Luxemburgo, Polônia, Romênia e Turquia.
“A nossa pesquisa sugere que três quartos das pessoas cujos hábitos de poupança foram afetados pela inflação dizem que estão poupando menos porque não têm dinheiro para isso ou estão economizando mais se preparando para futuros aumentos de preços. Portanto, isto deverá ter um impacto negativo nos gastos discricionários. Apenas um em cada oito afirma que está poupando menos para gastar o seu dinheiro agora”, diz o relatório.
Sebastian Franke, economista do ING e líder da pesquisa, afirmou ao Valor que essas expectativas de inflação mais altas podem influenciar o trabalho que vem sendo feito pelos bancos centrais. “As elevadas expectativas de inflação podem certamente se traduzir em efeitos de segunda ordem, tais como através de negociações salariais. O BCE quer sublinhar a sua credibilidade como combatente da inflação e precisa ter sucesso para que os consumidores ajustem suas expectativas em baixa”, diz ele.
Em entrevista ao Valor, Robert Sockin, economista global do Citi, explica que há muitas formas de se medir as expectativas de inflação, tendo como base os consumidores, profissionais especialistas em projeções, empresas ou os participantes do mercado.
Embora existam essas várias formas de se medir as expectativas de inflação, os bancos centrais são particularmente sensíveis ao que os consumidores estão dizendo ou pensando, avalia Sockin. “Se os consumidores estão pensando que a inflação vai estar alta por mais um tempo, isso influencia na negociação de salários, o que pode levar a um ciclo de inflação mais alta antes de se chegar à meta, influenciando o trabalho dos bancos centrais.”
Ele cita como exemplo que, no último ano, com a alta nos dados da Universidade de Michigan sobre as expectativas de inflação, o Fed foi obrigado a fazer mais uma alta agressiva. “Eles ficaram assustados, pois são super sensíveis a isso, principalmente as expectativas de médio prazo”, diz.
Os últimos dados da Universidade de Michigan, fechamento de setembro, mostraram na última sexta-feira que a expectativa para o período de 12 meses caiu de 3,5% a 3,2%, enquanto a inflação esperada para cinco anos recuou de 3,0% para 2,8%.
Diante desses números, embora possa parecer que as expectativas de inflação de consumidores estejam mais persistentes na Europa, os analistas fazem ponderações ao explicar que, por enquanto, é mais uma impressão.
Segundo Franke, a inflação nos EUA está alta, mas não excepcionalmente elevada para os padrões históricos do país. Já a inflação na zona euro está bem acima de tudo o que foi visto desde o início da união monetária. “Na Alemanha, a maior economia da Europa, a inflação é mais elevada do que em qualquer momento durante a reunificação alemã. As expectativas de inflação dos consumidores são sempre influenciadas pela inflação atual, por isso, não é de se admirar que os europeus ainda não estejam convencidos de que a inflação regressará ao normal tão cedo”, avalia o especialista.
Sockin acrescenta que, na zona do euro, as expectativas de inflação estão bem mais elevadas do que na época pré-pandemia, e essa é a divergência com relação aos EUA, onde não há tanta diferença em relação ao que era antes. “Quando olho para os dados não vejo uma grande diferença entre EUA e Europa. Dependendo da medida, cerca de 2,5% e 3% para ambas as regiões. Se olharmos a situação pré-covid, a zona euro estava bem abaixo dos EUA, mas subiram significativamente, rapidamente se igualando aos EUA, e antes da covid estavam bem abaixo, por isso gera esse choque aparente de diferença.”
Em sua última decisão, no dia 14 de setembro, o BCE elevou os juros em 0,25 ponto percentual para sua máxima histórica, a 4% ao ano. No entanto, a instituição sinalizou que pode ter aumentado as taxas o suficiente para devolver a inflação à meta de 2%, embora não tenha descartado novos aumentos, em linha com o Federal Reserve.
Fonte: Valor Econômico

