Por Victor Rezende e Gabriel Roca — De São Paulo
18/09/2023 05h03 · Atualizado há 9 horas
Surtiu efeito no mercado a estratégia adotada pelo Banco Central (BC) de indicar como apropriado o ritmo de 0,5 ponto percentual no processo de redução da taxa básica de juros. Assim, os agentes iniciam a semana totalmente “ancorados” e com a expectativa de que, na quarta-feira, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC reduza a Selic de 13,25% para 12,75%.
Se, no início de agosto, a curva de juros (taxa ao longo de vários vencimentos) chegou a indicar apostas numa aceleração do ritmo, essa possibilidade saiu do radar diante da comunicação dos diretores nos últimos 45 dias e de uma evolução menos favorável do cenário doméstico e externo. Das 140 instituições financeiras e consultorias ouvidas pelo Valor, 139 esperam um corte de 0,5 ponto na Selic nesta semana.
Desde o último Copom, as expectativas de inflação interromperam o processo de queda; o câmbio se desvalorizou; a atividade econômica continuou a surpreender positivamente; e o cenário externo se mostrou mais desafiador, com a disparada dos rendimentos dos Treasuries. Por outro lado, a inflação corrente continuou a mostrar uma dinâmica benigna, com desaceleração da inflação de serviços.
Com a melhora da inflação e a expectativa de uma desaceleração da economia mais evidente no segundo semestre, aumentou a aposta em torno de uma aceleração no ritmo de cortes da Selic a partir de novembro ou de dezembro. Ainda assim, 76% das casas veem o ritmo de 0,5 ponto de corte sendo adotado até o fim do ano.
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Com as projeções de ritmo de cortes pacificadas, os agentes estarão atentos, em especial, às projeções de inflação da autoridade monetária. Em agosto, o Copom estimava a inflação deste ano em 4,9% e a de 2024 em 3,4%. Há, entre os agentes, algum temor de que as projeções do colegiado possam aumentar.
A discussão ganhou relevância após comentários da diretora de assuntos internacionais e gestão de riscos corporativos do BC, Fernanda Guardado, em “live” promovida pela Bradesco Asset Management. De acordo com ela, as surpresas positivas no crescimento terão impacto na mensuração do hiato do produto (medida de ociosidade da economia) pela autoridade monetária.
Além da possível indicação de uma ociosidade menor, outros fatores podem conferir algum viés de alta às projeções do BC, como a elevação dos preços do petróleo ao longo da curva futura e a leve depreciação do câmbio desde o Copom de agosto, além da continuidade da desancoragem das expectativas de inflação.
“Os nossos modelos sugerem uma alta das projeções de inflação do Copom, em um movimento que pode ser um pouco mais visível na estimativa de 2024. Mais do que a comunicação, as projeções podem falar mais alto nesta decisão. É onde vamos estar mais atentos”, afirma o economista-chefe para Brasil do BTG Pactual, Claudio Ferraz. E, nesse contexto, ele avalia que o Copom deve continuar a julgar como pouco provável uma aceleração do ritmo de ajuste monetário.
Em relação à comunicação, Ferraz não vê grandes alterações e espera que o cenário básico do BTG é a expectativa de que o Copom repita os apontamentos da reunião de agosto. O economista observa, porém, que declarações do presidente do BC, Roberto Campos Neto, quanto a uma maior atenção aos riscos fiscais nos países desenvolvidos agora está no radar dos agentes de mercado, o que pode ter reflexos também na avaliação local sobre a condução da política fiscal.
“Apesar de não incluir os riscos fiscais no balanço de riscos, o BC não deixou de prestar atenção. O fato de eventualmente a política fiscal não estar incluída no balanço de riscos não significa que o BC não esteja acompanhando”, diz Ferraz. Para ele, o BC pode começar a adotar uma abordagem mais factual em relação ao tema. “Mais do que especificamente vermos temas como desempenho da economia, hiato, questões fiscais no comunicado e na ata, devemos estar mais atentos aos números.”
O economista-chefe da Western Asset no Brasil, Adauto Lima, diz que as percepções da autoridade monetária podem ser avaliadas pelas projeções de inflação e pelos parágrafos que descrevem o desempenho da atividade. “O Copom pode fazer comentários sobre os riscos do mercado de trabalho ficar ainda mais apertado e que ele está observando uma trajetória além do que se imaginava para o momento do ciclo”, afirma.
“O BC também pode iniciar uma discussão sobre a pressão recente de demanda, se ela é apenas um efeito do aumento da renda disponível porque a inflação de alimentos caiu rápido, ou se ele vê efeitos de transmissão da política fiscal. É provável que alguns desses temas fiquem para o Relatório de Inflação, mas eles precisarão ser discutidos, porque a surpresa no crescimento e as revisões foram grandes”, afirma o economista, ao lembrar que a surpresa no crescimento do segundo trimestre esteve ligada à demanda. “É preciso entender como isso afeta as trajetórias.”
Lima, assim, acredita que a visão do BC sobre as surpresas na atividade será importante. “Se houver a percepção de que a produtividade aumentou e trabalhamos com um PIB potencial mais alto, isso não necessariamente se transformaria em um hiato do produto mais positivo”, diz. O economista, contudo, pontua que, se o BC entender que o movimento foi mais ligado à demanda, como é o cenário da Western, “ele precisaria avaliar a trajetória daqui em diante para entender se a convergência que se imaginava para a inflação será mantida”.
A Western Asset espera que a Selic encerre o ciclo em 9%, em linha com o consenso, e não vê espaço para que o juro básico chegue ao território expansionista, ao apontar que a política fiscal deve continuar a pressionar a demanda.
Já o economista-chefe do UBS BB, Alexandre de Ázara, vê espaço para um ciclo de flexibilização maior e, assim, espera que, em 2024, o juro chegue a 8%. “Com uma inflação de 3,5% e o juro neutro por volta de 4,5% em termos reais, que é o número com que o BC trabalha, uma Selic de 8% me parece uma taxa razoável”, diz.
Ázara, no entanto, não espera que, neste ano, o BC opte por acelerar o ritmo dos cortes na Selic. Para ele, uma flexibilização mais célere só deve se materializar no primeiro trimestre de 2024, quando o horizonte relevante abarcar, principalmente, o ano-calendário de 2025. “Temos uma projeção de inflação mais otimista que o consenso do mercado para 2024, de 3,3%. Além disso, quando o BC começar a olhar mais para o ano de 2025 ele estará mais perto da meta”, enfatiza.
O economista do UBS BB nota que as sinalizações recentes dos dirigentes do BC foram “bastante contundentes” e, diante da falta de surpresas desde a última reunião, o Copom não deve promover alterações importantes na comunicação. Assim, para ele, o ritmo de 0,5 ponto percentual também deve ser mantido em novembro e em dezembro caso o cenário se desenvolva conforme o esperado. “Se as coisas melhorarem muito, pode haver um corte de 0,75 ponto em dezembro, mas não é o cenário-base”, diz.
Uma aceleração no ritmo de cortes na Selic neste ano também não está no cenário da economista-chefe da ARX Investimentos, Elisa Machado, que projeta os juros em 9,5% no fim do ciclo. “Não vemos nenhum motivo, no momento, para o BC acelerar essa queda dos juros. Nem mesmo para sinalizar. Não tivemos mudanças significativas dos fatores importantes para a política monetária; o nível de atividade continua forte; o mercado de trabalho é pujante; e a incerteza com as questões fiscais permanecem.”
Machado, inclusive, observa que, na comunicação dos diretores após a decisão de agosto do Copom, a preocupação com as contas públicas foi algo bastante citado. “Isso significa que, mesmo se não estiver no comunicado, o fiscal continua na cabeça do BC, até porque é uma parte muito importante da conjuntura”, afirma.
O economista Darwin Dib, da Gauss Capital, acredita que a questão fiscal não será reinserida no balanço de riscos, que deve se manter equilibrado. “Não vejo motivos para alterar essa parte da comunicação e também não espero que, nesta reunião, a retórica vá no sentido de indicar ou sinalizar uma aceleração do ritmo. Não vão fazer isso agora, talvez mais para o fim do ano”, avalia.
Esse, inclusive, é o cenário básico projetado pela Gauss, que espera uma redução de 0,75 ponto percentual na Selic em dezembro. “O juro real brasileiro está, evidentemente, acima do nível de equilíbrio. O cenário externo, evidentemente, tem importância, mas não muda o fato de que é preciso produzir uma convergência para o juro neutro”, aponta Dib.
No cenário da Gauss, a Selic deve chegar a 9% no próximo ano. Além disso, Dib espera uma segunda rodada de afrouxamento monetário em 2025, onde o BC deve colocar o juro básico em 6%, ou seja, no campo expansionista.
Fonte: Valor Econômico

