O Citigroup informou de forma imprecisa às autoridades reguladoras detalhes de dezenas de bilhões de dólares em empréstimos. São erros que poderão complicar sua capacidade de pagar dividendos e de recomprar ações.
As falhas nas informações sobre os empréstimos foram o principal motivo de as autoridades reguladoras terem multado o banco de Wall Street em US$ 136 milhões este mês, segundo cinco fontes com conhecimento direto do assunto. Os erros, não relatados anteriormente, também motivaram discordâncias no relacionamento até então próximo entre o Citigroup e a McKinsey, a firma de consultoria que o banco contratou para ajudar a corrigir as falhas identificadas em um comunicado do Federal Reserve (Fed, banco central americano) de 2020, segundo três fontes.
Os responsáveis pela supervisão bancária do Fed descobriram as falhas na apresentação anual dos testes de estresse do Citigroup e deram ao banco 30 dias para ele apresentar um plano para corrigir os erros nos empréstimos e outros problemas com dados. Se as autoridades reguladoras não aprovarem o plano, o grupo enfrentará novas restrições na distribuição de lucros aos acionistas.
A multa recente ressalta os problemas crônicos de tecnologia e regulatórios que atormentam o Citigroup há anos e mostra como a presidente-executiva Jane Fraser está tendo dificuldades para resolver problemas que ela disse que estariam entre as suas prioridades quando assumiu o comando em 2021.
Ex-executivos do Citigroup afirmam que Fraser não conseguiu mudar uma cultura em que muitos funcionários buscam soluções de curto prazo e de menor custo para problemas profundamente enraizados, ou tentam evitar abordá-los de forma incisiva. “No Citi, há muitas comissões e grupos de trabalho criados para que as pessoas possam se sentar e conversar sobre os problemas”, diz um ex-executivo.
Em sua mais recente teleconferência de resultados, Fraser reconheceu que o Citigroup está atrasado na resolução de seus problemas com dados, mas disse que está direcionando recursos e especialistas para resolver o problema.
Na quarta-feira o Citigroup disse: “Continuamos empenhados em resolver isso e estamos confiantes de que levaremos esse trabalho até onde se espera”.
Ex-funcionários do Citigroup disseram que era amplamente conhecido que seus documentos sobre empréstimos continham erros, como dados incorretos de vencimento, bem como informações sobre garantias e até mesmo sobre o tamanho dos empréstimos – questões que afetaram diretamente a capacidade dos supervisores de avaliar a solidez do banco.
Mas no ano passado, quando o Citigroup se aproximava de um novo prazo para mostrar às autoridades reguladoras que havia resolvido problemas com dados, funcionários disseram que foram instruídos a ignorar as lacunas remanescentes nos controles ou ocultá-las das autoridades reguladoras.
Kathleen Martin, uma ex-executiva do Citigroup que no ano passado atuou como chefe interina dos esforços de correção de dados e está processando o banco por rescisão injusta de contrato, alega no processo que foi demitida por não seguir instruções de seu chefe, o diretor de operações Anand Selva, para enganar as autoridades reguladoras sobre os progressos do grupo no enquadramento às exigências das autoridades.
O Citigroup, que está contestando o processo, disse que Martin foi demitida legitimamente por questões relacionadas a desempenho.
Atuais e ex-funcionários do Citigroup culpam o uso intenso de consultores de fora pelo banco – em especial a McKinsey – pela incapacidade de resolver problemas relacionados a dados e compliance. O Citigroup contratou a McKinsey, consultoria da qual Fraser foi sócia antes de ingressar no banco, quando recebeu o comunicado do Fed sobre dados em 2020.
Mas as autoridades reguladoras rejeitaram vários dos planos de ação elaborados pela McKinsey para o Citigroup e houve uma insatisfação interna generalizada com o trabalho da consultoria em relação ao comunicado do Fed, disse um ex-executivo do banco. Três fontes a par do assunto afirmaram que a equipe da McKinsey trabalhou para corrigir os problemas que levaram ao encaminhando de documentos incorretos sobre empréstimos.
O Citigroup parou de trabalhar com a McKinsey no projeto no ano passado, pouco antes de o Fed descobrir erros em seus documentos de empréstimos, segundo fontes próximas das duas companhias.
A McKinsey disse: “Continuamos atendendo o Citigroup e temos orgulho de trabalhar em uma variedade de tópicos, assim como temos feito há muitos anos”.
Outros disseram que o Citigroup está fadado ao fracasso, observando que vários desses problemas se acumularam ao longo de muitos anos e aquisições, descrevendo também o prazo dado pelas autoridades reguladoras para a resolução desses problemas.
Pelo menos 10 executivos importantes das áreas de tecnologia, controles e conformidade deixaram o banco no último ano. Eles teriam sido responsáveis pelo trabalho que as autoridades reguladoras agora pressionam o Citigroup a concluir. A saída mais importante foi a de Mike Whitaker, que era o chefe de tecnologia e operações.
Em abril, após contratempos e demissões recentes, Whitaker realizou uma reunião geral para motivar suas equipes no escritório do Citigroup em Tampa, na Flórida, onde muitos dos trabalhadores de tecnologia e operações estão sediados. Ele entrou no palco ao som do tema do filme “Gladiador”.
Um mês depois, Whitaker havia partido. Enquanto isso, o banco ainda enfrenta a difícil tarefa de corrigir erros nos dados. Segundo um ex-executivo, “será uma dança entre as autoridades reguladoras e o Citi pelos próximos anos”.
Fonte: Valor Econômico

