O Brasil aumentou ligeiramente seu estoque de títulos do Tesouro dos EUA desde janeiro, coincindindo com o retorno de Donald Trump à Casa Branca, enquanto a China diminuiu seu volume em março.
A situação de detentores de títulos do Tesouro americano é acompanhada com interesse maior ultimamente. A dívida americana é vista como uma potencial arma de negociação com Donald Trump, nas novas condições comerciais que ele procura impor agora unilateralmente.
A maior atenção está nos movimentos da China. E dados mais recentes do Departamento do Tesouro dos EUA mostram que Pequim diminuiu seu volume de títulos do Tesouro americano pouco antes da nova guerra comercial deflagrada por Trump. A China deixou assim de ser o segundo maior detentor de títulos da dívida americana no exterior, sendo superado pelo Canadá em março.
O estoque da China de papeis do Tesouro americano ficou em US$ 765,4 bilhões, ou menos US$ 18,9 bilhões em março ante o mês anterior. Também Hong Kong diminuiu seu volume de títulos americanos.
A China já foi o maior detentor da dívida americana. Mas desde 2013 reduziu em 40% seu portfolio de papeis do Tesouro americano, segundo diferentes fontes. Vários bancos centrais asiáticos fizeram o mesmo.
Vários outros países do Brics, no momento, estão em outra direção. O Departamento do Tesouro dos EUA mostra que o Brasil é o 15. maior detentor estrangeiro de títulos do Tesouro americano, com US$ 208,4 bilhões em março, comparado a US$ 207,3 bilhões em fevereiro (+0,5%) e US$ 199,4 bilhões em janeiro (+4,5%).
No entanto, o Brasil reduziu em 8,2% seu estoque de títulos do Tesouro americano comparado a março de 2024, quando o volume tinha alcançado US$ 227,1 bilhões.
O Brasil detem US$ 202,9 bilhões em papeis de longo prazo e US$ 5,423 bilhões em títulos de curto prazo.
A India, 14. maior detentor de títulos do Tesouro, também aumentou seu estoque em março para US$ 239,9 bilhões comparado a US$ 225,7 bilhões em janeiro, quando Trump 2.0 tomou posse.
A África do Sul igualmente aumentou o volume de títulos do Tesouro americano desde janeiro. O mesmo aconteceu com a Arábia Saudita. No caso de Emirados Árabes Unidos, houve ligeira queda em março, mas um grande salto no estoque comparado ao mesmo mês de 2024.
Por sua vez, a Indonésia, o membro mais recente do Brics, diminuiu o estoque neste ano, mas o volume de papeis americanos é bem maior em março comparado ao mesmo mês de 2024.
A Rússia ainda tinha em março US$ 35 milhões em títulos do Tesouro americano comparado a US$ 213 milhões em março do ano passado. Não há informações sobre Egito, Etiópia e Irã, outros membros do Brics.
Já o Canadá, país que passa por fortes turbulências nas relações com o governo Trump, o estoque de títulos americano aumentou para US$ 779,3 bilhões em março ante US$ 740,2 bilhões em janeiro.
Mas a relação bilateral sofre evidente abalo com Trump. Recentemente, o primeiro-ministro Mark Carney disse que “está claro que os EUA não são mais um parceiro confiável’. Acha possível que, com negociações abrangentes, possam restabelecer ‘um elemento de confiança’, mas não uma volta ao passado.
O Japão é atualmente o país estrangeiro que mais detem títulos do Tesouro americano, com US$ 1,130 trilhão. E o melhor aliado dos EUA na Ásia justamente foi o primeiro a levantar abertamente a questão do uso da dívida americana como arma de negociação.
Katsunobu Kato, ministro de finanças japonês, admitiu que essa é ‘uma carta que existe, mas a decisão de utilizá-la ou não é outra coisa’’. Diante da agitação nos mercados com essa declaração, o ministro correu para esclarecer que o Japão não planejava fazer isso.
O secretário do Tesouro americano, Scott Bessent, reagiu mais tarde, avisando que ‘se a Reserva Federal pensar que um rival estrangeiro faz do mercado da dívida americana uma arma, ou que procura desestabilizá-lo por razões políticas, estou seguro que faremos qualquer coisa, mas, pelo momento, não vemos isso’.
A possibilidade de liquidação rápida de papeis do Tesouro americano tem sido mencionada como uma opção ‘nuclear’ da China, principalmente. Mas nem os chineses nem os japoneses tem realmente interesse nesse cenário, concordam diferentes analistas. Se Tóquio e Pequim venderem rapidamente parte de seus papeis americanos, derrubam o preço e sofrem uma perda importante.
Além disso, esse tipo de operação não é simples a realizar, observa Cyril Regnat, do banco Natixis, no jornal Le Monde. ‘Onde realocar o dinheiro? ‘Não existe hoje mercado equivalente (ao do mercado de títulos do Tesouro americano)’, afirmou.
Na sexta-feira, os EUA perderam seu ‘triplo A’. A agencia de classificação de riscos Moody’s, a última que ainda dava a nota máxima aos EUA, rebaixou o rating do governo dos Estados Unidos. Para a agência, a expansão dos déficits orçamentários significa que os empréstimos do governo dos EUA aumentarão em um ritmo acelerado, elevando as taxas de juros no longo prazo.
Fonte: Valor Econômico

