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Diante de um posicionamento técnico mais equilibrado após as altas recentes da bolsa, a gestora Legacy aguarda mais detalhes sobre a sinalização fiscal do governo para determinar se o rali poderá continuar no curto prazo, afirma Patrick Pereira, gestor de ações da casa, ao Valor. Mesmo assim, ele ainda vê potencial para recuperação considerável de alguns papéis e prioriza ações de shoppings, consumo e varejo, transportes e utilidade pública.
“Se o investidor tem possibilidade de ficar comprado por um, dois anos, vai encontrar empresas excelentes negociando a 10 vezes o lucro, que já estariam baratas com preço/lucro de 15 vezes. Ou seja, temos hoje ações na bolsa que, para ficarem baratas, precisam subir 50%”, diz.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista do gestor:
Valor: A recuperação da bolsa foi justificada? Estavam posicionados?
Patrick Pereira: Olhamos para três coisas na análise de ativos: preço, fundamento e posicionamento técnico. A bolsa estava com os melhores preços dos últimos 15 anos e o mercado estava leve, já que o investidor estrangeiro estava vendendo e o local não comprava. Em termos de fundamento, as empresas estavam, em linha geral, bem, enquanto o cenário macro local era incerto. Entendemos, no fim de maio, que essa era uma combinação de fatores muito forte, que indicava comprar bolsa. O mercado balançou bastante em junho, mas o investidor estrangeiro voltou a comprar e a bolsa começou a subir, mesmo quando o dólar tocou no patamar de R$ 5,70. Ou seja, estava muito leve mesmo. Agora o posicionamento técnico é um pouco mais equilibrado, mas o saldo do estrangeiro ainda é amplamente negativo em 2024, então podem continuar recomprando. Ainda estamos com posição direcional comprada, priorizando shoppings, consumo e varejo, transportes e utilidade pública, mas distantes do nível máximo de exposição à classe. Até reduzimos um pouco nas últimas semanas, aguardando mais definições sobre o macro local.
Valor: Quais definições?
Pereira: No curto prazo, existe incerteza no Brasil sobre as políticas fiscal e monetária. Temos o Poder Executivo de um lado, querendo gastar mais, e o Banco Central do outro, tendo que domar a inflação e as expectativas de inflação do mercado. O canal de comunicação que todo mundo entende é o câmbio. Se o câmbio dispara, a gente tem uma alta da inflação, tem que subir os juros e é ruim para todo mundo. Quanto mais organizado o país estiver, menos o câmbio será afetado, mais estabilidade haverá nas expectativas de inflação e os juros acalmam. Foi exatamente isso que aconteceu no início de julho e é isso que vai definir se vamos ter uma sustentabilidade do rali que vimos nos últimos dias. No médio prazo, o foco tende a ser em teses domésticas, que estão muito descontadas. Se o investidor tem possibilidade de aguentar um, dois anos, vai encontrar empresas excelentes negociando a 10 vezes lucro, que já estariam baratas com preço/lucro de 15 vezes. Temos hoje ações na bolsa brasileira que, para ficarem baratas, precisam subir 50%.
Valor: A bolsa brasileira está tão barata assim?
Pereira: Não é difícil encontrar na bolsa empresas excelentes com os múltiplos mais baixos dos últimos 15 anos. Cada ativo tem sua história, claro, mas até cases mais simples, como o setor de shoppings, em que não há incerteza tão grande sobre o lucro das empresas, os preços estão bem deprimidos. Estamos bem alocados nessa parte da bolsa, de empresas domésticas de alta qualidade e com múltiplo baixo. Acredito, por outro lado, que alguns papéis sensíveis ao câmbio exageraram nos ganhos recentes, como o setor de frigoríficos. Nesse caso, eu não gosto de estar posicionado. Mesmo que o câmbio volte a andar, a assimetria não parece boa. Mas há outras, nos setores de papel e celulose, siderurgia e energia que gostamos. São casos em que o micro é atrativo e o preço está ok, e consequentemente equilibram o portfólio na questão cambial. Também gostamos de alguns setores defensivos, como shoppings e utilidade pública, a depender da empresa. E estamos neutros em bancos.
Valor: Esperam mudanças relevantes nos lucros das empresas em relação às expectativas do início deste ano?
Pereira: Algumas empresas são expostas ao câmbio, nessas a perspectiva de lucro melhorou bastante. Outras são mais alavancadas, sofrem com uma queda menor dos juros. Olhando para o Ibovespa como um todo, não sentimos revisão negativa até aqui. Trabalhando com um cenário de Selic parada em 10,5%, que não é necessariamente o que acreditamos que vai acontecer, as empresas aguentam. Também é importante mencionar, por outro lado, que estamos com taxa de desemprego baixa e consumo ainda resiliente, especialmente o consumo de alta renda, o que pode se refletir nos balanços.
Valor: O mercado americano está tirando liquidez de países emergentes e do Brasil?
Pereira: A gente conversa com investidores estrangeiros e um dos riscos atuais para mercados emergentes, inclusive o brasileiro, é ficar irrelevante no contexto global. Mesmo com ativos descontados, tem uma chance de o estrangeiro nem olhar mais, ainda mais em um cenário em que empresas de tecnologia estão indo muito bem, sugando liquidez. Acreditamos que o movimento já foi exagerado, mas ainda é cedo para dizer que acabou, apesar da correção recente. O fundamento das empresas americanas ainda está muito bom. O lucro é crescente, a demanda é crescente, não é um trem que a gente vê descarrilando. O preço é alto mesmo e o técnico é pesado, mas o fundamento é muito forte. É o contrário do Brasil nesse sentido. Temos uma exposição à bolsa americana, com equipe e carteira próprias, e gostamos muito também dos setores de tecnologia e biotecnologia.
Valor: A baixa liquidez do mercado tem afetado suas decisões de investimento?
Pereira: Houve uma mudança focada na questão de preço. Gostamos de algumas empresas para o longuíssimo prazo e carregamos essas empresas há bastante tempo. Quando o preço de uma empresa muito líquida, muito boa, testada na bolsa há 20 anos, vai para 10 vezes lucro, e eu tenho essa outra empresa testada há menos tempo, também a 10 vezes lucro, eu naturalmente vou fazer a minha alocação maior na empresa mais consolidada e com maior liquidez. Não vendemos as posições em empresas menores, mas, no momento, não é preciso ir para as empresas de menor capitalização para conseguir excelentes retornos.
Fonte: Valor Econômico

