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A arrecadação da Seguridade Social, em especial da Previdência, tem se mostrado insuficiente para custear as despesas do sistema ao longo dos anos, o que tende a exigir alíquotas de contribuição mais altas da população, mesmo com as mudanças feitas na reforma de 2019. É o que mostra estudo inédito do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) feito pelos pesquisadores Rogério Nagamine e Graziela Ansiliero e ao qual o Valor teve acesso.
No ano passado, a Seguridade Social teve déficit de R$ 429 bilhões, fruto de uma despesa de cerca de R$ 1,6 trilhão e receita de R$ 1,179 trilhão. Ou seja, as receitas cobriram apenas 73,7% das despesas. Em 2008, por exemplo, a arrecadação representava 111,8% da despesa, mais do que suficiente para custeio dos gastos, que incluem os regimes previdenciários, assistência social e saúde.
A perspectiva, diz o estudo, é que essa insuficiência cresça ao longo do tempo, tendo em vista a esperada continuidade do crescimento das despesas, em especial da Previdência, ao mesmo tempo que as receitas tendem a ter incremento mais modesto.
Em 2000, a receita do Regime Geral de Previdência Social – que atende aos trabalhadores da iniciativa privada, via INSS – cobriu 84,7% de sua despesa total. Ou seja, já era insuficiente, mas o cenário foi piorando ao longo do tempo. No ano passado, a receita do regime foi suficiente para custear apenas 65,9% dos gastos, uma redução de quase 20 pontos percentuais em pouco mais de duas décadas.
Em proporção do PIB, a receita do RGPS em 2023 estava estimada em 5,5% do PIB, mesmo patamar observado em 2009. Já a despesa cresceu de 6,7% para 8,3% do PIB no mesmo período, alta de 1,6 ponto percentual.
São vários os fatores que explicam esse cenário: ampliação das renúncias, ausência de reformas ao longo do tempo e ampliação do público que recebe benefícios previdenciários e assistencial, mas que pouco contribuem ou que não contribuem, como os microempreendedores individuais (MEIs), os aposentados rurais, as pessoas que recebem o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e os segurados dos demais regimes especiais.
Ainda de acordo com o Ipea, em vários cenários estudados, a alíquota necessária para manter o RGPS equilibrado seria elevada. Com base em dados de registros administrativos, considerando o salário dos segurados, a alíquota média necessária para custear integralmente o RGPS no período 2009-2022 seria de 35,7%.
Usando como base a Pnad Contínua Anual, o custeio integral das aposentadorias e pensões exigiria uma alíquota de 30,4% de 2022. Incluindo o BPC nessa conta, a alíquota de equilíbrio seria de 32,2%
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Os pesquisadores também calculam que, mesmo no cenário hipotético de inclusão de contribuição do setor informal, a alíquota estimada para financiamento de aposentadorias, pensões e BPC seria de 25,6%. Atualmente, a alíquota do RGPS para o trabalhador varia de 7,5% a 14%, incidindo de forma progressiva sobre os salários.
O estudo é divulgado num momento em que a equipe econômica do governo vem defendendo reforçar as fontes de financiamento da Previdência e combater as fraudes para conter o déficit do regime. Uma nova reforma, contudo, já foi descartada por vários integrantes do governo, apesar de pontas soltas deixadas na emenda constitucional de 2019. No estudo, Nagamine e Ansiliero alertam que as mudanças relacionadas ao financiamento do RGPS na reforma de 2019 são insuficientes para resolver o déficit.
O professor associado da Faculdade de Economia e Administração da USP Luís Eduardo Afonso afirma que o estudo do Ipea mostra como a relação receita versus despesa está piorando progressivamente. “Num regime de repartição [em que as contribuições atuais financiam os benefícios previdenciários], o esperado era que receita fosse igual despesa. Não é o que acontece há anos – e mais greve do que isso é que vem piorando”, diz o especialista em Previdência.
Ele avalia que o único caminho para resolver a questão do financiamento será olhando para as receitas e despesas. “O regime é muito desequilibrado para tentar fazer equilíbrio só de um dos lados.” Em especial, ele defende uma revisão dos regimes especiais de contribuição, como o MEI – algo que é também apontado no estudo do Ipea. “O MEI é uma política pública que precisa ser reavaliada fortemente, porque não deu resultado, atraiu trabalhadores que não têm perfil e aumentou o déficit da Previdência, porque a contribuição é muito pequena”, argumenta o professor da USP.
O economista Arnaldo Lima, ex-secretário no antigo Ministério do Planejamento e diretor da Relações Institucionais da Polo Capital, diz que a tendência, no futuro, é que o regime de repartição público pague apenas o piso previdenciário, pois a necessidade de financiamento será crescente com o tempo.
Fonte: Valor Econômico
