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Até 2040, o mundo verá um crescimento exponencial de 18 atividades econômicas, que vão gerar receitas de US$ 29 trilhões a US$ 48 trilhões. São setores ligados ao mundo digital, à transição energética e à saúde. A previsão está em um longo relatório produzido pela consultoria americana McKinsey intitulado “The next big arenas of competition”.
Arenas, define o estudo, são setores econômicos altamente dinâmicos, com crescimento acelerado e que respondem por uma fatia substancial do crescimento da economia dos países. Algumas das novas arenas dos próximos 25 anos serão das áreas de softwares e serviços de Inteligência Artificial, carros elétricos, semicondutores, nova mobilidade aérea, cibersegurança, tecnologia espacial e medicamentos para emagrecer (veja arte nesta página).
O relatório, lançado em outubro, estima que a fatia no PIB global dessas 18 áreas poderá sair dos atuais 4% para até 16% em 2040.
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Em entrevista ao Valor, Bob Sternfels, managing global partner da McKinsey e presidente do conselho de administração da empresa, e Tracy Francis, senior partner e managing partner para a América Latina, falaram sobre a corrida global entre empresas para avançarem nas 18 áreas do futuro e sobre o perfil dos profissionais que serão mais demandados.
A McKinsey, que é uma das principais consultorias de negócios do mundo, olha para 2040 comparando com o que aconteceu entre 2005 e 2020. Nesse período, 12 áreas foram classificadas como arenas: e-commerce, serviços de nuvem, biofármacos, entre outras. Algumas dessas áreas crescerão ainda mais até 2040.
Sternfels vive perto de San Francisco, na Califórnia, mas tem uma rotina de constantes viagens. Somente para a América Latina fez 22 viagens nos últimos três anos. Ele esteve em São Paulo em fins de outubro para participar do B20, fórum de empresas representativas dos países do G20 e que ajudam a endereçar a discussão de temas globais. Tracy Francis é australiana e está radicada no Brasil há cerca de duas décadas. A seguir alguns dos principais trechos da entrevista:
Valor: Ao analisar as áreas da economia que poderão crescer mais até 2040, os senhores veem negócios mais concentrados em apenas algumas grandes empresas? Ou o cenário é de uma grande variedade de companhias disputando esses novos mercados?
Bob Sternfels: Há uma boa notícia que é esta: não nos faltam ideias que possam impulsionar um crescimento econômico substancial nos próximos 20 anos. Há cerca de US$ 40 trilhões de valores que podemos ver no horizonte. Um ponto imperativo é o do crescimento sustentável e inclusivo. Só conseguimos sustentabilidade e inclusão se tivermos crescimento econômico. E acho que uma das partes interessantes deste relatório é que não é impossível ver um caminho para o crescimento econômico. Estamos identificando as áreas onde esse crescimento pode ocorrer. O importante é como criar um ambiente para o investimento necessário para impulsionar a inovação nessas áreas. Porque isso exigirá uma enorme quantidade de capital. E isso nos leva à pergunta: estamos criando os incentivos certos para que os fluxos de capital do setor privado invistam a longo prazo nessas áreas?
Em relação a “quem ganhará mais”, eu entendo que uma das coisas que podem ser diferentes nos próximos 20 anos é que, se olharmos para os últimos 20 anos, houve uma parcela desproporcional do crescimento que foi para, principalmente, o setor de tecnologia. E vimos uma concentração da criação de valor [em áreas relacionadas à tecnologia]. Nesse relatório, fizemos um trabalho específico sobre IA generativa e analisamos um subconjunto de onde a IA generativa é útil e, mesmo com a versão atual, há uma oportunidade substancial. Nosso trabalho aponta para um valor anual de cerca de US$ 4 trilhões que podem ser obtidos com a versão atual da IA generativa. Então, perguntamos: quem se beneficia? Todos os setores da indústria: ciências biológicas, P&D, instituições financeiras, mobilidade, infraestrutura inteligente para poder alimentar as necessidades energéticas de todos de uma forma muito mais sustentável. A questão é: será que cada um desses setores se moverá rápido o suficiente para que possa acumular valor, ou será que se moverá mais lentamente do que empresas de tecnologia?
Valor: Levando em conta esse mapa de atividades do futuro, como as empresas devem agir?
Bob Sternfels: O que temos aconselhado aos nossos clientes é: esse jogo está aberto, e você poderá ver uma criação de valor muito mais democratizada entre os setores. Se as empresas de mineração se movimentarem rapidamente, se os bancos se movimentarem rapidamente, se as empresas de ciências biológicas se movimentarem rapidamente. A questão é: quem vai se movimentar mais rápido? E essa tem sido uma das principais questões que temos trabalhado com nossos clientes: esta é uma corrida, certo? E você tem que se mover o quanto antes.
Valor: É uma corrida entre empresas ou entre países, principalmente entre países EUA e China?
Sternfels: Acho que é uma corrida global. E uma das coisas que me entusiasmam é que isso não está predeterminado a ter o valor desproporcional vindo das maiores economias. Estamos vendo as pessoas inovarem em todos os cantos. Se você observar os avanços de algumas das empresas de cobre no Chile em termos de uso da IA generativa, eles têm um trabalho de ponta. Veja a aplicação em instituições financeiras na Indonésia. Na Índia, a IA é de ponta e nas ciências da vida. E se observarmos a transformação que alguns dos players históricos de genéricos estão fazendo agora na descoberta de medicamentos puros, é também um trabalho de ponta. Acho que a parte empolgante disso é que o campo de jogo pode ser mais amplo.
Tracy Francis: Temos uma parte das nossas atividades que se concentra na criação de novos negócios. É uma atividade presente em todo o mundo. Criamos unicórnios com esse tipo de conteúdo. E uma das áreas mais vibrantes é o Caribe. Guatemala, Panamá, República Dominicana, entre outros. O que temos são players com capital, que veem o que está acontecendo em todo o mundo e dizem: “Quero ser um dos investidores inovadores.” A tecnologia dá a oportunidade de que o jogo tenha um palco maior.
Valor: Quais diferenças poderíamos ter se a China ou se os EUA liderar o desenvolvimento das tecnologias de muitas dessas 18 áreas que tendem a crescer mais até 2040?
Sternfels: O que precisamos é de um período de mais inovação, e o que temos visto é que mais investimento em P&D global gera mais inovação e crescimento econômico. Portanto, você enquadrou a questão como um modelo “versus”, eu enquadro como um modelo “e”. Você falou de EUA e China. Mas podemos democratizar a inovação para que possamos falar sobre São Paulo como uma fonte de inovação, assim como falamos sobre o Vale do Silício, como falamos sobre Dubai, sobre Mumbai. Esses também precisam ser polos de inovação.
Francis: Estamos prestes a abrir um centro de tecnologia. Estamos planejando um centro tecnológico em São Paulo que atenda ao resto do mundo para a McKinsey? Por quê? Porque há um talento fantástico, uma inovação fantástica, e podemos atender ao resto do mundo.
Valor: E quanto à força de trabalho que será mais demandada por essas áreas até 2040? Profissionais formados em ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM na sigla em inglês) serão praticamente os únicos a se integrarem a essa nova economia?
Sternfels: Isso é interessante. Na verdade, penso o contrário. Temos feito um trabalho por meio de nosso estudo longitudinal do Global Institute nos últimos 50 anos. É um estudo da McKinsey muito profundo e amplo. Analisa dezenas de países, todos os setores, todos os tipos de trabalho. Uma das perguntas é: para um empregador privado, qual é o retorno do investimento em uma habilidade de um trabalhador? O retorno é de quantos anos? Na década de 1980, esse retorno era de pouco mais de sete anos. Você tem sete anos de retorno por ter adquirido uma habilidade. Em 2020, o retorno é de menos de quatro anos.
Por quê? Porque a tecnologia está mudando rapidamente. Portanto, a necessidade de requalificar os trabalhadores está se tornando cada vez mais importante. O que isso significa é que as credenciais formais que você tem quando entra no mercado de trabalho estão se tornando cada vez menos relevantes. O que se torna mais relevante é a sua capacidade de continuar a aprender.
Valor: Essa abordagem mudará o perfil dos profissionais nessas atividades de alto crescimento?
Sternfels: Uma das coisas que estamos analisando é: como a McKinsey repensa a atração de talentos? Recebemos, em todo o mundo, um pouco mais de um milhão de candidaturas todos os anos. Um milhão de pessoas se candidatam para trabalhar na McKinsey, e contratamos entre 7.000 e 9.000 pessoas. Isso é bom. Mas há três anos eu perguntei: “De onde essas pessoas vêm? E a resposta foi menos de 500 lugares. Portanto, se você não estudou em uma determinada escola, se não tem um determinado diploma, está sendo excluído do processo. E isso não condizia com o que estávamos vendo, que na verdade são mais os aspectos intrínsecos e o potencial de alguém do que seu diploma.
Então, começamos a aplicar nossa análise para saber quais são os aspectos que realmente importam. E o que apareceu foram coisas como: não é tanto a escola em que você estudou ou o diploma, mas, sim, resiliência. Você é resiliente? Você já teve de lidar com reveses e se levantou? Se sim, esse é um bom indicador de que você será bem-sucedido. Já trabalhou em equipes antes? E você tem a capacidade de aprender coisas novas?
O interessante é que todos os pais dizem aos filhos: “Escolham um curso, continuem com ele, não mudem”. Eu mesmo digo ao meu filho. Mas, nossas análises dizem que, na verdade, se alguém muda de curso e depois se sai bem com o que mudou, isso é um sinal de que sabe como continuar aprendendo. Então, mudamos. Assim, o que eram 500 lugares agora são cerca de 2.000 e, no último ciclo, elegemos nosso primeiro sócio da McKinsey que nunca frequentou a universidade, sem diploma universitário. Ele se alistou no Exército dos EUA depois de terminar o ensino médio. Depois de alguns anos, ele entrou para a McKinsey e sete anos depois, [se tornou] sócio.
Valor: O que essa experiência diz para os empregadores?
Sternfels: Que é importante olhar para os aspectos intrínsecos brutos, as capacidades brutas, não as credenciais formais. E se você começar a fazer isso, poderá realmente abrir o banco de talentos. E eu me pergunto se esse é um corolário interessante diante de toda essa nova tecnologia que está mudando. Na verdade, trata-se do intrínseco, porque o STEM vai ficar desatualizado. Vamos lhe ensinar coisas novas à medida que você for chegando.
Francis: É importante o governo e o setor privado trabalharem juntos. E é absolutamente fundamental nos mercados emergentes que o setor privado perceba a importância de criar todas essas novas habilidades.
Sternfels: Acho que se conseguíssemos avançar nisso, seria uma virada de jogo, porque basicamente isso diz que não importa onde você estudou, não importa seu histórico econômico. Se você tiver fome suficiente, terá uma chance.
Fonte: Valor Econômico