Nos últimos 10 anos, conhecemos a realidade de centenas de empresas e contribuímos para o avanço da cultura organizacional de muitas delas. Nessas vivências de norte a sul do Brasil, observamos tendências e movimentos positivos na agenda de equidade e inclusão. Centenas de empresas e governos se comprometeram com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU. Mas os indicadores mostram que quase 40% dos países estão retrocedendo ou estagnados em relação à igualdade de gênero. Apesar de ter avançado, o Brasil está em 64° lugar entre os 139 países analisados pela Equal Measures 2030.
Para que as empresas recalculem a rota já em 2025 e ajudem a mudar o cenário, reunimos algumas lições para que os caminhos pela equidade de gênero sejam mais eficazes. Como uma consultoria que trabalha com profundidade e mudanças estruturais, não acreditamos em fórmulas prontas. E esse é um erro comum: buscar por um treinamento mágico que resolva questões complexas ou uma metodologia padrão para necessidades específicas. Empresas que desejam construir um mundo mais inclusivo precisam abraçar suas diversidades na inteireza, conhecendo cada potência e desafio de sua cultura. Para isso, é preciso fazer um mergulho profundo, com análises quantitativas e qualidades de contexto e comunidades, garantindo um espaço seguro de fala e escuta. Na Think Eva, nós fazemos um diagnóstico que ajuda a conhecer a comunidade feminina em todas as suas dimensões — da carreira às responsabilidades de cuidado. Ter um olhar 360° para as pessoas da sua equipe e como elas respondem aquela estrutura é essencial para uma imersão verdadeira e completa.
Outro passo importante é reconhecer, de partida, que todos temos vieses e preconceitos, mesmo que inconscientes. Atuamos em empresas de setores predominantemente masculinos e vemos na prática quando “cai a ficha” de um homem que uma fala ou comportamento podem ser caracterizados como importunação ou assédio. Muitas vezes, as mulheres também carregam vieses machistas e normalizam atitudes que não deveriam ser toleradas. É complexo e delicado, mas é essencial promover esse tipo de conversa em espaços de conscientização e acolhimento. Ao trazer nossos vieses para a consciência e entender suas consequências, temos a escolha de como agir sobre eles.
Também aprendemos que nada acontece sem as lideranças. Governança é crucial e não à toa é uma das letras da sigla ESG. Para que a sua empresa de fato seja comprometida com os avanços de diversidade e inclusão, todos os níveis hierárquicos precisam estar engajados e trabalhando ativamente por uma cultura corporativa mais positiva e justa. Engajar os aliados, como os homens — quando falamos de equidade de gênero, ou as pessoas brancas — quando falamos de equidade racial, faz toda a diferença quando o objetivo é ampliar a retenção dos funcionários. Na Think Eva, ajudamos a criar esses processos de engajamento para que a organização conte com aliados pela equidade e lideranças inclusivas.
Por fim, o aprendizado principal desses últimos anos que levamos como lembrete e alerta em todos os lugares que passamos é: a sua empresa não é um organismo isolado do mundo, ela faz parte da sociedade que somos e pode — ou não — contribuir para a que desejamos construir. Nesse sentido, todo esforço que é feito da porta pra dentro da empresa também precisa ser refletido da porta pra fora, cuidando das cadeias produtivas e da externalidade dos produtos e serviços que são colocados no mundo.
Maíra Liguori é jornalista formada pela PUC-SP, com pós-graduação em comunicação estratégica e em ciências da religião, em Barcelona. Também é mãe e diretora na consultoria Think Eva e na ONG Think Olga. Ambas as organizações promovem soluções para as questões de gênero e intersecções tendo como ferramenta a comunicação. Por seu trabalho nas organizações Think Olga e na Think Eva foi bi-campeã do prêmio WEPs, da ONU Mulheres, indicada ao Prêmio Caboré (2021) e finalista do Troféu Mulher Imprensa (2023). Em 2017, foi eleita uma das 100 mulheres mais inovadoras do mundo pela BBC de Londres e em 2022 foi escolhida pelo Meio & Mensagem como uma das pessoas que estão mudando o jogo no mercado de comunicação.
Nana Lima é mãe, empreendedora social e co-fundadora da Think Eva, consultoria de inovação social que cria soluções para ampliar a equidade de gênero e a inclusão dentro das empresas. É também diretora da Think Olga, organização sem fins lucrativos que utiliza a comunicação como ferramenta para a mobilização social. Seu trabalho foi premiado com o selo de Direitos Humanos da Prefeitura de São Paulo, bi-campeã do prêmio WEPs, da ONU Mulheres e finalista do Prêmio Caboré em 2021. Obteve um MBA pela ESADE Business School em Barcelona, onde atuou como Head of Area em Marketing para o mercado Latino Americano em multinacionais como Desigual e Mango (MNG). Em 2016, foi eleita Top Voices Brasil pelo Linkedin Brasil.
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Fonte: Valor Econômico