O ex-presidente Donald Trump está conseguindo se livrar dos principais riscos à sua candidatura presidencial nos EUA. Três dos quatro processos criminais nos quais ele é réu não devem mais ser julgados antes das eleições de novembro. Nos três casos, a estratégia da defesa de Trump de tentar adiar os julgamentos está funcionando. O único julgamento que deve ser finalizado ainda neste ano é o que está atualmente em andamento em Nova York.
Trump é o primeiro ex-presidente a ser processado criminalmente nos EUA. Esses processos poderiam abalar a sua imagem e prejudicá-lo eleitoralmente. Pesquisas indicam que uma parcela importante dos eleitores independentes, isto é, aqueles que não se identificam nem como democratas nem como republicanos, poderiam não votar em Trump caso ele fosse condenado nesses processos.
Esse tipo de dano à imagem está possivelmente ocorrendo no julgamento em Nova York. Nele, Trump é acusado de fraude eleitoral por pagamentos feitos à atriz Stormy Daniels, para que ela não revelasse um caso amoroso entre eles durante a campanha eleitoral de 2016. Segundo a acusação, Trump teria disfarçado esses pagamentos, que teriam de ser declarados como gasto de campanha. A defesa do ex-presidente alega que o objetivo não era eleitoral, mas sim esconder o affair da esposa de Trump e que o ex-presidente estaria sendo chantageado pela ex-amante.
Ainda que ele não seja condenado, o processo está expondo detalhes da infidelidade conjugal de Trump. Em outras eleições, casos de traição destruíram candidaturas nos EUA. Em 1988, o democrata Gary Hart teve de desistir da sua pré-candidatura presidencial após ter um caso extraconjugal revelado.
Além disso, pesa contra Trump o fato de seu ex-advogado pessoal, Michael Cohen, estar depondo contra ele. Nos demais processos também há aliados próximos ou autoridades do Partido Republicano entre as testemunhas de acusação. Se até amigos e aliados se voltam contra ele, isso ajuda a corroborar uma imagem tóxica associada ao ex-presidente. Nem o ex-vice de Trump, Mike Pence, o apoia nesta campanha eleitoral.
Para evitar esse desgaste na reta final da corrida presidencial, a estratégia da defesa de Trump sempre foi tentar adiar os julgamentos para depois das eleições. E parece estar dando resultado nos demais três processos.
Nesta semana, a juíza encarregada do caso na Flórida adiou o início do julgamento do processo no qual Trump é acusado de levar para a sua casa, ilegalmente, dezenas de documentos confidenciais do governo americano, depois de ter deixado a Presidência. O julgamento estava marcado para 20 de maio. Já havia a expectativa de adiamento, pois a equipe legal de Trump está empenhada no processo em Nova York. Uma nova audiência será realizada em 22 de julho. Parece improvável que o julgamento ocorra antes das eleições.
Ontem, a defesa de Trump conseguiu uma decisão favorável que deve adiar o julgamento do processo no qual o ex-presidente é acusado de interferir ilegalmente na apuração eleitoral no Estado da Geórgia, para tentar reverter sua derrota nas eleições de 2020. Meses atrás foi revelado que a promotora do caso, Fani Willis, tem um relacionamento amoroso com outro promotor envolvido nas investigações. Para a defesa de Trump, isso configura conflito de interesse. A Corte de Apelação da Geórgia aceitou o recurso da defesa e vai decidir se Willis pode continuar à frente do caso. Com isso, o julgamento de Trump deve ocorrer apenas no ano que vem.
Por fim, a Suprema Corte dos EUA aceitou julgar o argumento de Trump de imunidade relacionada ao cargo de presidente no processo em que ele é acusado de tentar subverter o resultado das eleições de 2020 e de estimular a invasão do prédio do Congresso americano em 6 de janeiro de 2021. Esse processo corre na Justiça da capital, Washington. Segundo a mídia americana, a Suprema Corte deve aceitar apenas parcialmente o recurso de Trump, o que permitiria que ele fosse a julgamento. Mas, como não há prazo para a decisão da Suprema Corte, o mais provável é que o julgamento só ocorra após as eleições de novembro.
Essa série de vitórias da defesa de Trump constitui um dilema para a Justiça dos EUA, que normalmente é veloz. Expor eventuais comportamentos ilegais do ex-presidente (se houver) seria importante para que o eleitor americano pudesse decidir seu voto conhecendo mais profundamente o candidato republicano. Afinal, uma coisa é votar numa pessoa sem ficha criminal. Outra coisa é votar em alguém condenado em um, dois, talvez até quatro processo criminais. Trump ainda poderá recorrer de eventuais condenações, mas elas pesariam contra ele nas eleições.
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Donald Trump durante julgamento em Nova York — Foto: Win McNamee/AP
A Justiça americana, no entanto, acabou permitindo a estratégia protelatória de Trump, talvez para não ser acusada de interferência na política. Trump vem constantemente alegando que os processos contra ele têm motivação política e visam influenciar as eleições de novembro. Ele argumenta que os promotores dos casos têm ligação com o Partido Democrata (nos EUA, promotores estaduais são eleitos em voto popular e suas candidaturas costumam ter apoio dos partidos políticos). Mas a inação judicial também pode ser uma interferência política.
O adiamento desses três julgamentos é possivelmente a melhor notícia para Trump nesta fase da campanha, a menos de seis meses das eleições, pois aumenta as suas chances de derrotar o presidente Joe Biden em novembro. Essa perspectiva traz uma série de benefícios colaterais. Trump deve ter agora mais facilidade de arrecadar fundos para sua campanha e deve enfrentar menos resistência de republicanos que torcem o nariz para ele.
fonte: valor econômico

