A proposta, que já foi discutida com a bancada amazonense no Congresso e defendida no Comitê Nacional dos Secretários Estaduais de Fazenda (Comsefaz), é criticada por economistas, que veem uma crescente desfiguração da ideia original de uma reforma dos impostos que representasse uma simplificação do sistema.
Segundo o governador do Estado, Wilson Lima (União Brasil), a Zona Franca de Manaus significa 60% da atividade econômica do Amazonas. “Enfraquecer a Zona Franca é transformar o Estado em terra arrasada”, afirmou.
A ZFM representa uma renúncia em tributos federais de R$ 55 bilhões por ano, segundo o anexo da lei orçamentária anual deste ano. Trata-se da segunda maior renúncia em nível federal, atrás apenas do Simples. A renúncia fiscal estadual também é muito relevante: o Amazonas dá incentivos equivalentes a 52,3 % de sua receita de ICMS, o maior percentual estadual em 2021.
Lima disse que ainda está inseguro sobre qual diferencial tributário existirá no texto a ser apresentado pelo relator da reforma, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), e como ele funcionará. O parecer de Ribeiro deve propor a unificação dos impostos federais e estaduais em um IVA dual, com poucas alíquotas diferenciadas por setor. “Não adianta ele dizer que a Zona Franca será protegida sem dizer como proteger”, afirma.
A proposta amazonense explicita tratamento tributário diferenciado para a Zona Franca até 2073, criando uma exceção à regra que proíbe incentivos fiscais. Segundo o texto apresentado, haverá crédito presumido “e outros benefícios necessários à manutenção da vantagem competitiva existente”, tanto para o IBS, quanto para o CBS. O crédito presumido ficará integralmente com o comprador de bens fabricados na Zona Franca.
O texto ainda impõe a incidência do futuro Imposto Seletivo (IS) sobre a fabricação em outros Estados de produtos também feitos na Zona Franca, como forma de manter uma espécie de cláusula de barreira. Segundo o secretário estadual de Fazenda, Alex Giglio, este IS majorado para os outros Estados compensaria o fim do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
A proposta vai além: determina que o Amazonas manterá a sua fatia atual no IBS, mesmo com a transferência da cobrança da origem para o destino, para garantir a sua receita própria. E se esses recursos não forem suficientes para manter o atual patamar de receita, a diferença seria coberta pelo fundo de desenvolvimento regional que está sendo concebido para a compensação dos Estados e municípios. “O Amazonas é o maior perdedor da reforma tributária, se não for compensado. Porque exporta para outros Estados praticamente tudo o que produz”, diz Giglio. Ele estima que a redução da receita própria do Amazonas seria de 50% com a conversão do ICMS da origem para o destino.
A proposta ainda amplia as vantagens para o Amazonas com a criação de um outro fundo, com o nome sugerido de “Fundo de Diversificação Econômica”, para a criação de novas matrizes produtivas no Estado. Esse fundo, exclusivo para o Estado, seria bancado com recursos federais e serviria, segundo Giglio, para o Estado deixar de ser tão dependente da Zona Franca.
A sugestão amazonense é muito criticada por economistas especializados, que acreditam que a proposta não apenas preserva os benefícios atuais da Zona Franca como abre caminho para a criação de novos, enquanto fecha a porta para os demais Estados. Esse casuísmo, caso avance, poderia ser aproveitado para outros governadores também pedirem tratamento diferenciado.
“Trata-se da criação de um regime especial para o Amazonas, eu diria especialíssimo, que amplia as vantagens com a criação de mais um fundo específico”, comentou Gabriel Leal de Barros, economista do fundo Ryo Asset, ex-diretor do IFI. Segundo Barros, a proposta tem viés protecionista, com a oneração do IS a outras regiões.
O economista vê o risco de se estabelecer compensações regionais que podem tirar o caráter neutro da reforma. “O fundo regional que está em discussão atualmente já está estimado em R$ 100 bilhões ao ano. O governo federal teria que destinar a ele portanto 1% do PIB, não existe esse recurso”.
Para ele, propostas como essas reforçam a tendência da reforma tributária em discussão no Congresso criar uma série de regimes próprios que devem alongar a transição e elevar muito a alíquota básica do futuro IVA. “É importante lembrar que 25% é apenas uma estimativa. O resultado final mais realista para manter o equilíbrio pode jogar esta alíquota para 35%, o que tornará o Brasil com o IVA mais alto do mundo”. Barros também vê o risco do sistema tributária ganhar mais complexidade jurídica em relação à situação atual, com a multiplicidade de regime.
Na opinião de Felipe Salto, economista da corretora Warren Rena e ex-secretário da Fazenda em São Paulo, há o risco de uma desvirtuação da reforma. “Mantidas todas as exceções que estão sendo propostas já não sei se a reforma tributária será positiva mesmo para o setor industrial”, disse.
Fonte: Valor Econômico

