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O volume de vendas do varejo no país cresceu aquém do esperado em setembro, como reflexo da desaceleração de atividade no segundo semestre. Mesmo assim, o desempenho do comércio não alterou as projeções de PIB para o terceiro trimestre. A preocupação fica mais à frente, quando a alta de juros em curso e o efeito do câmbio podem pesar no comércio.
O volume de vendas no varejo restrito cresceu 0,5% em setembro, ante agosto, com ajuste sazonal, segundo a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC), divulgada ontem pelo IBGE. Em agosto, frente a julho, o comércio restrito havia caído 0,2% (dado revisado após divulgação de queda de 0,3%). No conceito ampliado, que inclui vendas de veículos e motos, partes e peças, material de construção e atacarejo, o volume de vendas subiu 1,8%.
O resultado da PMC de setembro veio abaixo do esperado tanto no varejo restrito quanto no ampliado. A mediana do Valor Data indicava alta de 1,3% e de 2,2%, respectivamente. “Tivemos um ano muito bom. O varejo restrito ficou com 4,8% de alta no acumulado do ano. Há uma puxada de não duráveis, ligada à recomposição da renda. Mas no segundo semestre as taxas ficaram mais brandas, com certa oscilação”, diz Rodolpho Tobler, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre). A tendência, segundo ele, é o varejo perder força até o fim do ano, como reflexo da desaceleração econômica.
“O dado da PMC veio mais fraco que o esperado, mas tem que ser visto como resultado positivo”, diz o economista João Savignon, da Kínitro Capital. “O dado mais fraco em agosto foi revisado para cima, ainda que negativo. O novo crescimento do varejo em setembro retoma níveis de volume de vendas recordes tanto no restrito quanto no ampliado. No restrito tínhamos atingido o recorde em maio de 2024 e agora retomamos esse nível. No ampliado, o recorde anterior foi em agosto de 2012.”
Segundo Cristiano Santos, gerente da PMC, uma combinação de fatores contribuiu para o quadro, como o desempenho do mercado de trabalho, com ocupação em alta e massa salarial ainda expressiva, além da forte concessão de crédito a pessoas físicas.
Os dados mostram, porém, comportamento heterogêneo entre os setores. As vendas do varejo restrito avançaram em quatro das oito atividades em setembro contra agosto, segundo o IBGE, com destaques positivos para “outros artigos de uso pessoal e doméstico” (3,5%), combustíveis e lubrificantes (2,3%), artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos, e de perfumaria (1,6%) e hiper, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo (0,3%). Na mesma comparação, houve quedas em móveis e eletrodomésticos (-2,9%), equipamentos e material para escritório, informática e comunicação (-1,8%) e tecidos, vestuário e calçados (-1,7%). No varejo ampliado, que inclui automóveis e peças, material de construção e atacarejo, houve alta de 6,6% em veículos, motos e peças e alta de 1,1% no material de construção.
Ao longo do ano de 2024, diz Santos, o desempenho dos setores de hiper e supermercados e artigos farmacêuticos sustentou o varejo, o que também aconteceu em setembro, refletindo certa concentração do consumo em itens prioritários, como alimentos e medicamentos. Em setembro, observa, a inflação dos alimentos não estava tão pressionada quanto agora.
“Na comparação trimestral o varejo ampliado, que é o que mais importa para o PIB, cresceu 1% [contra os três meses anteriores, com ajuste sazonal”, diz Luis Otavio Leal, economista-chefe da G5 Partners. “O resultado não muda, por enquanto, a expectativa de PIB com alta de 0,6% [no terceiro trimestre ante os três meses anteriores, com ajuste]. A menos que venha alguma surpresa na PMS”, diz, referindo-se à Pesquisa Mensal de Serviços que o IBGE divulga hoje.
Com base nos dados disponíveis, Savignon também calcula crescimento de 0,6% do PIB no terceiro trimestre. Uma projeção oficial deve vir após a divulgação da PMS. Para 2024, a estimativa é de alta de PIB de 3%.
O varejo ampliado mostrou resiliência até o terceiro trimestre, diz Claudia Moreno, economista do C6 Bank. A projeção do banco é que o PIB cresça 0,6% no terceiro trimestre ante o anterior. Para 2024, a estimativa é de alta de 3,2% do PIB em 2024 e de 1,5% em 2025.
Leal, da G5, destaca que as vendas do varejo ampliado cresceram 4,5% no acumulado até setembro. “Mas notamos que não é no mesmo ritmo que tínhamos no primeiro semestre, quando ele era forte.” Para o último trimestre do ano, Leal não estima resultado negativo para o varejo ampliado, mas algo “muito mais próximo de zero” frente aos três meses anteriores, na série com ajuste sazonal. “O resultado forte no primeiro semestre se deveu a fatores que não vão se repetir. No início do ano houve aumento grande do gasto fiscal e o período era de redução de juros. Agora o governo precisa ajustar gastos e há aumento de juros.” Para 2024, Leal estima que o varejo ampliado cresça em torno de 4%.
Para Leal, a alta de juros pode ter efeitos no varejo nos últimos meses do ano porque as taxas de mercado subiram muito em outubro e no início de novembro e “anteciparam o aumento da Selic”.
Leal lembra que há ainda otimismo em relação à Black Friday e às vendas do Natal. “Pode ser que não haja uma queda das vendas como estamos esperando, mas isso pode resultar em um aumento forte em endividamento que vai capotar lá na frente”, diz, referindo-se ao início de 2025. Tobler, do Ibre, também acredita que o maior desafio ao comércio acontecerá na virada do ano, quando, além dos juros mais altos, o efeito do real desvalorizado ficará mais claro.
Fonte: Valor Econômico