Durante a J. Safra Brazil Conference 2023, analistas do banco conduziram pesquisa com investidores para entender o sentimento atual em relação à bolsa. As respostas mostraram cautela, indicando potencial de valorização limitado para o Ibovespa, baixa propensão a aumentar riscos e preferência por setores menos dependentes da economia local e/ou defensivos, como commodities.
Nessa linha, 33,9% (a resposta mais citada) disseram que o setor de exportadoras terá a melhor performance do índice entre o fim de 2023 e o início de 2024, um resultado que não faria jus à visão da indústria há poucos meses. Isso porque, com o início do ciclo de corte de juros no Brasil, investidores olhavam com mais entusiasmo para setores mais sensíveis às taxas. Agora, com a piora no sentimento externo e a possibilidade de os juros ficarem mais altos por mais tempo, o apetite diminuiu.
Ao mesmo tempo, o petróleo tipo Brent saltou do patamar de US$ 70 o barril para US$ 90, refletindo a resiliência da atividade americana e o aperto sincronizado de oferta da commodity; e o minério de ferro passou a ser negociado a cerca de US$ 120 a tonelada, na medida em que a China passou a divulgar uma série de pequenos estímulos e a atividade do país asiático dá sinais de estabilização. Isso para não falar nos problemas na oferta de açúcar, de uma possível alta nos preços da celulose e do avanço das teses de eletrificação.
“A exposição às commodities caiu ao longo do ano porque os gestores estavam em busca de boas teses domésticas para surfar a dinâmica de queda dos juros longos, ao mesmo tempo em que a economia chinesa demandava cautela. Desde agosto, houve uma piora no cenário para papéis sensíveis às taxas e bons pontos de entrada em ações de commodities”, diz Antonio Heluany, sócio e analista de commodities da Taruá Capital, que tem visão estruturalmente positiva para petroleiras e está taticamente exposta à Vale.
Em relação à mineradora, ele afirma que o mercado tem ganhado mais confiança em relação aos estímulos anunciados pela China e que a diferença entre o preço do minério e das ações do setor está maior que o normal (investidores estavam leves ou até vendidos na tese; as ações da Vale recuam 19% no ano), o que indica possibilidade de valorização no curto prazo.
“Analistas estão pessimistas com o setor de construção, mas os números estão menos piores na margem e a Vale disse a investidores que empreendimentos sociais têm crescido por lá, algo que não está refletido nos números. Além disso, a exportação de aço pela China, direta e indireta, está muito forte e os estoques ainda estão em baixa, o que pode suportar a demanda por minério. Isso é ruim para as siderúrgicas, pela pressão de margens provocada em todo o mundo. Mas, mesmo que os países produtores de aço reforcem restrições de importação, a inversão dessa dinâmica leva um tempo.”
Daniel Delabio, sócio e gestor da Exploritas, diz que o cenário de China é pouco transparente e de difícil entendimento, mas afirma que existe hoje uma forte demanda para que a economia do país seja estimulada. Ele espera que os setores de infraestrutura e manufatura continuem andando, o que pode compensar em parte a fraqueza da construção. E reforça que o país está exportando muito aço.
“Tem muita gordura entre os patamares atuais de preço do minério e das ações da Vale, um dos dois tem que estar errado. Como a Vale é o produtor mais barato de minério do mundo e, na pior das hipóteses, vai gerar muito caixa, é uma aposta de baixo risco e com menos ‘intrinsecabilidade’ com questões domésticas. Os grandes riscos são o juro americano continuar subindo e a cotação do minério recuar com mais força, mas mesmo assim tem um ‘colchão’ em relação ao patamar atual da Vale”, afirma.
A China decepcionou em relação às expectativas, o que provocou uma dinâmica de desalocação no setor, diz Gustavo Salomão, sócio e diretor de investimentos da Norte Asset Management. “Mas Pequim tem vindo com uma série de pequenos estímulos, para não deixar a economia derrapar de vez, e a demanda por minério segue firme. E, como a fuga recente de recursos do país asiático gerou pressão na moeda, também se vê algum esforço geopolítico. Entendo que tudo isso afasta um cenário pior e, como o minério andou e as ações da Vale, não, ficamos mais otimistas.”
Mais pessimista com a tese de minério, Tiago Cunha, gestor de ações da ACE Capital, diz que existe um problema estrutural em construção na China, porque a população utilizava a compra de imóveis como poupança e isso criou uma bolha, o que fez com que o governo até acabasse com alguns incentivos. Então, diz, parece um contrassenso pensar que Pequim irá reverter essas medidas.
“Ademais, em momentos de tensão geopolítica, os investimentos em infraestrutura fora da China podem perder força; a exportação de aço, que vem crescendo nos últimos meses, deve entrar na mira de outros mercados produtores; e mesmo o descasamento entre o patamar de preços do minério e das ações das exportadoras pode estar mais ligado ao fato de que os contratos da matéria-prima são utilizados para especulação, mesmo entre pessoas físicas, o que causa distorção nos preços. Por isso não tenho viés positivo”, diz.
O setor de energia, por outro lado, é diferente, diz. O executivo nota que não existe concentração de demanda na China e, na medida em que o gás russo segue sob sanções, o inverno no Hemisfério Norte e a oferta coordenada da commodity podem fazer com que os preços do petróleo avancem mais. A resiliência da atividade americana também importa, diz. “E seguimos otimistas com a tese de eletrificação. Exportadoras de lítio, cobalto e níquel podem ter anos consideráveis de crescimento à frente.”
Fonte: Valor Econômico

