Informações da coluna Zeina Latif Economista A saúde pede ajuda Entre os emergentes, o Brasil se destaca pelo grande peso do Estado no financiamento da saúde RESUMO Sem tempo? Ferramenta de IA resume para você GERADO EM: 29/07/2025 – 21:18 Desafios Crescentes na Saúde Pública do Brasil e o Papel do SUS O Brasil enfrenta desafios na saúde pública, apesar do avanço do SUS desde 1988. O país, com um grande peso estatal no financiamento, gasta menos per capita do que a média da OCDE. Problemas como envelhecimento populacional, obesidade e saúde mental são crescentes. A inflação médica e a concessão de benefícios como o BPC pressionam o sistema, exigindo eficiência e parcerias privadas para melhorias. A saúde pública deu um grande salto com a Constituição de 1988. Enquanto o SUS prevê o acesso universal ao sistema, o modelo anterior era restrito a pessoas com vínculo formal de trabalho. Apesar do grande avanço na cobertura e nos indicadores, há demanda reprimida, refletida inclusive nas diferenças regionais. Na comparação mundial, o Brasil ainda apresenta taxas elevadas de mortes por causas evitáveis. Ajustes são necessários, inclusive para adequar o sistema aos novos tempos. Leia a coluna anterior de Zeina Latif: Ataques de Trump testam maturidade do país O contexto de crise fiscal e os limites para o aumento da carga tributária indicam que a saída passa essencialmente pela busca de eficiência e de parcerias com o setor privado. Argumenta-se que o país gasta pouco com saúde em termos per capita — o valor é 32% da média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Mas essa não é uma boa métrica, já que países ricos naturalmente conseguem gastar mais. Dentre os emergentes, o Brasil se destaca pelo grande peso do Estado no financiamento da saúde, representando cerca de 40% do gasto total de 9,8% do PIB, cifras comparáveis às da OCDE. No Chile, por exemplo, o gasto per capita é 71% superior ao do Brasil, mas devido ao regime contributivo compulsório, e não à participação estatal. A sociedade envelhece rapidamente e mostra-se mais vulnerável a doenças. Há aumento da obesidade (68% das pessoas têm sobrepeso) e de diagnósticos relativos à saúde mental, bem como sequelas da Covid-19. Adicionam-se ainda as doenças ligadas à falta de saneamento. Enquanto isso, a “inflação da saúde” tem sido sistematicamente mais elevada do que a inflação média de outros setores, refletindo em boa medida as novas tecnologias — a inflação médica hospitalar foi de 16,9% em 2024, segundo a Abramge, ante 6,9% do IPA industrial (índice setorial de preços no atacado). Cabe ainda citar o piso da enfermagem, criado em 2022, e a tramitação ativa no Congresso de propostas para ampliar os pisos salariais para outros profissionais de saúde, como médicos e auxiliares. Os problemas de saúde pesam também nas políticas sociais. Assiste-se ao crescimento do auxílio-saúde e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) para Pessoas com Deficiência (PcD), inclusive com inclusão de mais patologias, de forma desordenada e sem fonte de receita. Exemplo disso foi a decisão recente de considerar a fibromialgia uma deficiência para fins de acesso ao programa. O número de concessões do BPC para PcD cresce em ritmo acelerado, com aumento de 33% desde 2022, ultrapassando 6,3 milhões de pessoas ao final de 2024. Possivelmente reflete a mudança da legislação, em 2020, que passou a permitir a concessão de mais de um benefício a membros da mesma família, bem como a ampliação do rol de deficiências elegíveis, notadamente o Transtorno do Espectro Autista (TEA). Tem havido também mudanças no entendimento da Justiça sobre o tema, com flexibilização dos critérios formais. Quantas patologias mais poderão ser acrescentadas no futuro próximo, lembrando que pessoas portadoras de deficiências leves são também elegíveis? Importante não confundir problemas de saúde, que são assuntos do SUS, com incapacidade laboral. No caso do auxílio-doença, tem acelerado a concessão, após o recuo entre 2017-2021, que foi fruto de pente-fino e de critérios mais rigorosos do INSS na sua concessão, bem como às dificuldades impostas na pandemia. O número de benefícios saltou para 1,4 milhão ao final de 2024, ante 876 mil em 2021. Especialistas atribuem o crescimento dos últimos anos à criação do Atestmed, em 2022, uma ferramenta que permite a concessão de benefícios sem perícia médica presencial. Abriu-se espaço para fraudes e concessões inadequadas, sem levar ao encolhimento da fila. Para além da necessidade de coibir fraudes, é essencial que os benefícios sejam bem focalizados em quem realmente precisa da assistência social, pelas reais condições de saúde e pela baixa renda familiar, não cabendo ao Judiciário atuar além de suas competências. A máquina estatal, nas três esferas, precisa estar mais bem preparada para aumentar o atendimento da saúde, ainda na atenção primária, e para identificar quem realmente precisa de assistência social, o que passa pelo compartilhamento de informações e pelo aprimoramento do Cadastro Único (autodeclaratório de baixa renda). E decisões legislativas e judiciárias precisam atender às reais necessidades da sociedade, em meio às restrições fiscais.
Fonte: O Globo