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O Ibovespa deve passar por um cenário incomum a partir de hoje, se as projeções em torno das decisões de política monetária no Brasil e nos Estados Unidos se cumprirem. À medida que a economia americana dá sinais de desaceleração suave e a inflação por lá parece convergir à meta, possibilitando um início do ciclo de cortes pelo Federal Reserve (Fed), o Brasil se prepara para um aperto monetário. Nesse ambiente de incerteza, parcela dos gestores ouvidos pelo Valor mostra mais cautela e pessimismo com o desempenho do Ibovespa, enquanto outros ainda veem oportunidades, mas reforçam a necessidade de “stock picking”, uma seleção criteriosa de ações.
Na sessão de ontem, às vésperas das decisões de juros no Brasil e nos EUA, o Ibovespa anotou queda de 0,12%, aos 134.960 pontos.
O gestor Bruno Cordeiro, do fundo K10, da Kapitalo Investimentos, diz ter montado recentemente uma posição comprada em real contra o dólar (alocação que se beneficia de uma valorização da divisa brasileira), ao mesmo tempo em que tem posições vendidas em Ibovespa (aposta no recuo do índice).
“Do ponto de vista mais macro, vamos entrar num ambiente de puxada de juros [brasileiros], o que deveria melhorar o carrego do real e piorar o da bolsa”, diz Cordeiro. O profissional ressalta que há um posicionamento técnico mais neutro de gestores em bolsa local hoje e que houve uma pausa no fluxo de capital de estrangeiros para o mercado acionário local em setembro – ainda que seja cedo para dizer se haverá uma reversão.
Após saldos positivos em julho e em agosto, o mês de setembro tem sido de saques pelos estrangeiros, com déficit de R$ 1,82 bilhão até o dia 13, de acordo com dados da B3Cotação de B3.
As posições vendidas dentro do K10 também abarcam alguns nomes específicos, como os papéis da Petrobras e de petroleiras estrangeiras, como a americana Exxon Mobil. “Estamos com um cenário mais baixista para petróleo”, diz. Cordeiro argumenta que o balanço de oferta e demanda de petróleo está menor em razão de um crescimento global mais fraco, especialmente vindo da China, e de um avanço acima do esperado em produtividade e em produção do óleo de xisto nos EUA.
Já Rodrigo Mello, gestor de renda variável na Tenax Capital, avalia que a bolsa já teve um grande movimento e diz que a casa está mais neutra agora nessa classe nos mandatos mais ativos. Ele ressalta que as empresas estão bem e que a atividade econômica segue robusta, mas que as condições “macro” estão piores, diante de um fiscal mais “solto” e do cenário de início de um processo de aperto monetário. “Se continuar essa deterioração, isso pode ter uma assimetria pior para o mercado acionário local.”
O executivo também se mostra preocupado com uma eventual queda mais agressiva dos juros pelo Fed – o que passou a ser a aposta majoritária dos investidores desde ontem. “Se virmos que o motivo de o Fed acelerar os cortes é porque ele está ‘atrás da curva’, isso pode não ser tão positivo para mercados emergentes, como o Brasil”, resume o gestor da Tenax.
Em carta referente a agosto, a Verde Asset Management também aproveitou para destacar que o fundo Verde está liquidamente zerado em bolsa local. No documento, a casa disse que o fluxo mais favorável de estrangeiros para emergentes, apoiado por um corte de juros pelo Fed, não deve superar fatores locais, como os “fundamentos preocupantes” do Brasil e o ciclo de alta da Selic.
Outras casas, porém, defendem que há oportunidades no principal índice da bolsa, mas que agora é preciso olhar com lupa. “Ainda enxergamos oportunidades em alguns setores, mas o Ibovespa não é mais uma ‘barganha’ como era dois meses atrás”, avalia Naio Ino, gestor de renda variável da Western Asset no Brasil.
A Western gosta, em especial, de nomes ligados à economia doméstica, como consumo e setores cíclicos, por estarem um pouco mais “descontados” em termos de “valuation”.
A gestora de renda variável da Fator Capital, Isabel Lemos, destaca, ainda, os efeitos indiretos provocados pela retomada do fluxo estrangeiro no Ibovespa, além da perspectiva de lucro das empresas nos próximos meses, cujos resultados do segundo trimestre surpreenderam positivamente, e a queda dos juros de longo prazo como fatores que podem apoiar a bolsa.
Lemos também acredita que o fato de o investidor estrangeiro analisar múltiplos de empresas similares em mercados internacionais pode “tornar as empresas brasileiras ainda mais atraentes”. “Pode haver fluxo de investidores estrangeiros, seja para a bolsa ou para a renda fixa, o que vai levar à valorização do real”, afirma. A entrada do fluxo desse tipo de investidor pode elevar o grau de liquidez das operações. “Não vai acontecer de um dia para o outro, é um processo que ocorre ao longo do tempo.”
A Mantaro Capital também vê oportunidades em empresas com receita em reais, ao mesmo tempo em que projeta um cenário mais desafiador para exportadoras. O sócio e gestor da casa, Paulo Abreu, diz que um corte agressivo nos juros americanos, de 0,5 ponto, combinado a uma alta de 0,25 ponto da Selic, criaria um diferencial de juros que voltaria a beneficiar o real.
No entanto, Abreu pondera que as empresas que seriam as mais beneficiadas por um câmbio mais apreciado não representam os maiores componentes do índice. Por isso, ele defende que “o cenário é bom para a bolsa aqui, mas não necessariamente bom para o Ibovespa, porque ele não é o mecanismo mais importante para capturar eventos de risco por causa da forte presença de ações de commodities”.
“Preferimos serviços financeiros, setor de saúde e imobiliário, de média e alta renda. São segmentos que se beneficiam da redução de prêmio de risco Brasil apesar do aperto monetário”, avalia o gestor da Mantaro.
Lemos, da Fator, considera que o Ibovespa tem espaço para valorização por ver várias empresas atrativas, mesmo entre as mais ligadas a commodities. “Pode haver uma troca, pois continuam sendo grandes geradoras de caixa, e há potencial de resiliência dos ‘earnings’ do índice”, afirma. A gestora, porém, enfatiza a necessidade de analisar a empresa em si, já que ações de setores atrativos podem não ter desempenho tão bom.
Fonte: Valor Econômico

